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Copa do Mundo 2010
Sábado - 03 de Julho de 2010 às 05:37
Por: Fábio de Mello Castanho

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Reuters
Maradona durante entrevista coletiva
Maradona durante entrevista coletiva

Há mais de um mês vivendo na África do Sul, o técnico da seleção argentina, Maradona, mostrou diferentes faces de sua personalidade. Algumas, como a polêmica, esperadas. Outras, como a leveza com que comanda seus jogadores e a forma como se diverte no cargo, fazem parte de um novo Maradona.

Convivendo diariamente com a figura que já se transformou em personagem da Copa do Mundo, o Terra traça um mosaico de reações, atitudes e formas de comportamento do treinador em treinos, entrevistas e partidas. Tudo para tentar decifrar a excêntrica e complexa personalidade de Maradona, que está mais leve e bem-humorado do que no passado. Pelo menos até agora.

Polêmico

Maradona não foge de perguntas durante entrevistas. Em busca de manchetes, repórteres levantam a bola e o ex-jogador atende às expectativas. Maradona, o Platini e o Pelé criticaram você como treinador. O que você tem a dizer? "O Pelé que volte ao museu. Agora você sabe como são os franceses. Platini é francês. Eles se acham superiores".

Um dia depois, leu uma carta e pediu desculpas a Platini. "Mas a Pelé não", disse, sem perder a chance de nova cutucada.

Contra o México, o alvo foi o treinador argentino Ricardo Lavolpi, que manifestou torcida contra o seu país de nascimento nas oitavas de final. "É um traidor da pátria", disse.

Mas Maradona busca polêmicas mesmo quando não é instigado. "Um senhor morocho (moreno) disse que a Copa do Mundo não poderia ser realizada aqui", disse logo em sua segunda entrevista na África do Sul. O "morocho" a que se referia o treinador é Pelé, seu eterno rival.

Durante toda a carreira, Maradona se colocou como um personagem oprimido, perseguido por "poderosos". Nunca teve boa relação com a Fifa, como outros ex-jogadores históricos. Por isso, coloca-se em inferioridade política em relação a Pelé, Franz Beckenbauer, Platini entre outros.

Crítico da bola, viu nova oportunidade de atacar seus "inimigos". "O Pelé, o Platini, o Beckenbauer, um monte de jogadores que têm na Fifa deviam ajudar a fazer uma bola que fosse boa para os jogadores".

Crianção

Muito pouco se viu dos treinos "de verdade" de Maradona na África do Sul. Nos tradicionais 20 minutos de portas abertas, a parte tática já foi afiada e o treinador faz do campo da Universidade de Pretória seu palco.

Ele se comporta como uma criança em sua primeira festa de aniversário. Comanda rachões com muitos gritos, brincadeiras e risadas. Se joga no chão, entra no gol, tira sarro dos jogadores e ainda mostra que está com o futebol na ponta dos cascos.

Tem dia que bate faltas ao grito de palavrões para enfatizar cada cobrança perfeita. Em outro, prefere servir de garçom e ajeita bolas quadradas mandadas de propósito para testar sua habilidade. Semanalmente, disputa peladas com outros membros da comissão técnica, mesmo mancando por conta de um problema na perna direita.

Mas nada se compara ao seu divertimento no castigo dos rachões. Os perdedores são enfileirados no gol e recebem boladas dos vencedores. No último paredão, o treinador fez toda a comissão técnica se juntar aos derrotados e levou uma bolada na cabeça.

Já no gol de Palermo, contra a Grécia, uma comemoração única de um técnico na história dos Mundiais. Peixinho, com terno e tudo, como se ainda estivesse em campo. "Tenho vontade de entrar em campo", confessou mais tarde.

Supersticioso

Rituais são outro traço da personalidade maradoniana. Em todo jogo, o mesmo terno e a mesma gravata que recebeu de presente das filhas antes do Mundial. O treinador também está sempre com o mesmo terço na mão e escolhe o terceiro banco da direita para a esquerda, apesar de quase não se sentar.

O ônibus da seleção tem lugares demarcados e até ordem de saída dos jogadores. Os beijos em cada um dos jogadores escalados também fazem parte do ritual de antes de cada jogo, que inclui também telefonemas às filhas.

Na preparação, mais manias. Quando participa dos treinos com seus chutes, escolhe sempre o mesmo número de bolas. E não entra e sai do campo sem se benzer. Todas as suas entrevistas pré-jogo até o momento foram na mesma sala de imprensa, no Estádio Loftus Versfeld, em Pretória. Sequência quebrada a contragosto nas quartas por conta do fechamento do local.

Protetor

Maradona funciona como um escudo de seus jogadores. Mede cada palavra, evita críticas e se desdobra para proteger seus jogadores de pontapés adversários. Principalmente Messi, a quem trata como um herdeiro.

Antes mesmo da estreia, o treinador já começou a sua campanha de proteção ao melhor do mundo. Pediu que o fair-play fosse respeitado contra a Nigéria e punisse com cartões entradas mais violentas dos adversários.

Contra a Coreia do Sul, Messi recebeu apenas duas faltas. Mas Maradona foi à loucura à beira do campo mesmo assim. Entrou no gramado por diversas vezes e discutiu com o técnico Huh Jung-Moo, pedindo para os sul-coreanos baterem menos.

Depois do jogo da Grécia, se irritou com a marcação em Messi e disse que não existia fair-play no futebol. Repetiu a reclamação na partida contra o México, em que Torrado fez oito faltas e não recebeu cartão amarelo.

Outra forma de proteção é vista em seu afeto com os jogadores. Distribuiu abraços e beijos durante treinos e partidas, o que gerou até uma pergunta maliciosa de um repórter. "Mas eu gosto de mulher", respondeu com bom-humor. No dia seguinte, Samuel complementou. "Ele é sempre assim. Na frente e longe das câmeras".

Familiar

Maradona tem em sua companhia na África do Sul grande parte de sua família. Suas duas filhas, Dalma e Giannina, estão no Mundial e são, respectivamente, namorada do assessor de imprensa da seleção Fernando Molina e mulher do atacante Sergio Agüero.

Durante dois treinos na Universidade de Pretória, Maradona entrou em campo com o seu sobrinho Tiago, oito anos, filho de seu irmão Raul "Lalo", que também está no país.

Seu amuleto de sorte é um retrato do neto Benjamin, filho de Agüero com Giannina, que apresentou logo em sua primeira entrevista na África do Sul.

Nos momentos de folga da concentração, Maradona passa a maior parte do tempo em companhia da família. Agüero já teve até de se explicar quando foi titular contra a Grécia. "Minha relação com o Maradona é apenas profissional", disse.

Durante uma entrevista coletiva, posterior ao Dia dos Pais na Argentina, foi com um óculos escuro novo e, orgulhoso, disse que recebeu de presente de suas filhas.

Político

Logo em sua primeira entrevista, Maradona citou um de seus ícones, o revolucionário argentino Ernesto Che Guevara, personagem que virou símbolo do comunismo ao ser um dos líderes da Revolução Cubana. "Esta será a Copa de Maradona, Messi e Che", disse, em mais uma declaração patriótica.

O treinador também manifestou apoio ao movimento "Abuelas da Plaza de Mayo", que concorre ao Prêmio Nobel da Paz. Maradona recebeu a presidente da entidade, Estela de Carloto, e trocou presentes.

As "Avós da Praça de Maio" é uma organização não-governamental que tem como propósito localizar as crianças supostamente sequestradas durante a era da ditadura na Argentina, entre 1976 e 1983. O objetivo é devolver essas crianças, que nasceram em cativeiros, às suas legítimas famílias e evitar que situações como essa ocorram no futuro.

Showmen

Acostumado com os holofotes desde a sua adolescência, quando apareceu como fenômeno do futebol argentina, Maradona se sente bem e tira proveito de sua exposição.

Na parte aberta dos treinos, grita de uma forma que só a sua voz é capturada pelos microfones. Não tem jeito. Vira manchete quase todo dia, já que ainda dá cambalhotas, brinca com seus jogadores, bate faltas, dá passes, promove castigos, responde a jornalistas que se penduram no parapeito entre o campo e a arquibancada...

Nas entrevistas, brilha sozinho. Faz caretas e se transforma em piadistas. Arranca risos frequentes dos jornalistas com tiradas espirituosas e palavrões. Até já cantou parabéns para jornalista.

Ao entrar na sala de conferência e ver seu ex-companheiro de Napoli, Salvatore Bagni, na plateia, esqueceu protocolos, pulou a cerca que o separava dos jornalistas deu abraço caloroso no atual comentarista da rede italiana Rai. A cena virou foto de jornais e sites.

Irritado

Maradona relembrou os velhos tempos de confronto com a imprensa, marca registrada de sua carreira como treinador e de seu início como técnico da seleção argentina, apenas em dois momentos durante a Copa do Mundo.

No primeiro, depois de vencer a Grécia, desabafou e pediu para os jornalistas pedirem desculpas aos jogadores pelas críticas recebidas durante a sofrida classificação para as Eliminatórias.

No segundo, após vitória sobre o México nas oitavas, estava visivelmente tenso após uma atuação irregular de sua equipe. Distribuiu patadas, classificou uma pergunta como tonta, interrompeu outra e foi irônico: "Escreve o que você quiser. Te dou carta branca".

As reações são um indício do que pode ocorrer com Maradona em caso de eliminação na Copa do Mundo. A Argentina joga as quartas de final neste sábado, às 11h (de Brasília), na Cidade do Cabo, contra a Alemanha.






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