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Politica Brasil
Segunda - 12 de Abril de 2010 às 09:00

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O vereador de Belo Horizonte e ex-deputado federal Cabo Júlio (PMDB), que em agosto de 2009 foi condenado em primeira instância por envolvimento com os Sanguessugas da Máfia das Ambulâncias, em 2002, escreveu uma carta de desabafo em seu blog pessoal na qual confessa envolvimento com o esquema e questiona por que até hoje foi o único dos 84 parlamentares indiciados a ser punido.

No texto, Júlio pede perdão à família, a Deus, aos amigos e também aos companheiros de trabalho pelos atos de corrupção em 2002, quando uma quadrilha teria superfaturado o preço de ambulâncias que eram repassadas a prefeituras do interior do País. Por conta do escândalo, o parlamentar, que havia cumprido dois mandatos como deputado federal, não conseguiu se reeleger em 2006. Em 2008 ele foi eleito vereador em BH.

Recentemente Cabo Júlio esteve internado no Hospital Santa Rita, na região do Barreiro, em Belo Horizonte, para onde foi levado por policiais militares depois de ser encontrado desacordado no meio da rua. Ele havia acabado de passar mal ao volante e bater o carro num poste. Durante outras duas vezes, pelo menos, o parlamentar passou mal e teve que ser socorrido após tomar, segundo ele, medicamentos para fortes dores abdominais.

"Eu jamais esperaria que aquelas pessoas que me ajudaram na campanha de 2002 viessem a ser presos e acusados de tanta coisas erradas. Mas,quem com porco se mistura, farelo come. Eu não fui e não sou inocente. Deus sabe que não sou. Mas também não errei o tanto que me acusaram de errar", escreveu.

Ao final da carta, que está abaixo na íntegra, Cabo Júlio pede aos assessores de gabinete que o documento seja publicado na íntegra, de acordo com a vontade dele.

Leia:

"EU PENSEI QUE FOSSE MORRER DE TANTA DOR" São 23:03 hs do dia 07/04/10, é a primeira vez que entro em meu blog desde a sexta feira passada quando cheguei ao Hospital Santa Rita pela penúltima vez.

Eu fiquei aproximadamente uma semana internado no Hospital Santa Rita, depois HPM e por último fazendo exames no Hospital Vila da Serra.

Quando a gente passa por momentos como este, vê que a vida vale tão pouco. Nos fazem refletir sobre tanta coisa, sobre tantos erros e acertos.

Na sexta-feira eu senti tanta dor no abdômen que acabei desmaiando no volante. O carro bateu em um poste e fui para o Hospital Santa Rita ser medicado.

Era a segunda vez. Na primeira desmaiei na via do minério. Nossa, a globo me filmou em pleno domingo no barreiro.

Infelizmente,a gente tem colegas que bateram muito pesado. ( talvez eu já tenha feito muito isso e esteja colhendo o que semeei). Alguns comentários no globo.com diziam: bem feito, tomara que morra, ta drogado, bêbado, é a depressão por causa da máfia dos sanguessugas. Mas muitos também foram de solidariedade.

As vezes não sabemos diferenciar vida pessoal, de vida profissional, de vida política. As vezes misturamos adversários a inimigos.

Voltando a esta semana, no outro dia pela manhã, resolvi sair a esquina para comprar umas fitas e passar o fim de semana em casa descansando da noite anterior no Pronto Socorro do Hospital.

Na Avenida Sinfrônio Brochado, próximo do Comercial as dores foram tão forte, tão intensas que eu tentei chegar no Corpo de Bombeiros e não consegui. A sorte foi que um colega policial desceu do ônibus e eu pedi que corresse no PA dos Bombeiros e pedisse ajuda.

Naquele momento eu pensei que fosse morrer ali na rua, eu suava e tinha diarréia de tanta dor. Logo, uma viatura da PM ( infelizmente não sei sequer quem eram os policiais para agradecer) apareceu e me socorreu mais uma vez. Meu primeiro agradecimento a esta guarnição que me socorreu. Que Deus abençoe vocês.

Depois de uma tarde de atendimento no Santa Rita começaram os exames após a internação: ultrasonografia abdominal, sangue, urina, fezes, raio x, e infelizmente não descobriram a causa da dor.

A dor era tanta que buscopan na veia não amenizava as dores. O médico decidiu então aplicar morfina para aliviar a dor. Naquela hora, aos gritos de dor, eu pedi socorro a todo mundo que eu conhecia. Eu preferia a morte a sentir tamanha dor.

Liguei para um ex-chefe da época em que fui transferido para a antiga DST (em 97) que acabará de reformar no HPM e ele me ajudou a ser removido as pressas para o Hospital Militar.

Meu segundo agradecimento é ao Ten Cel Ezequiel que atendeu a ligação telefônica desesperada da minha mãe e me ajudou a ser transferido de um hospital ao outro. Deus abençoe ao Senhor e sua família.

Chegando no HPM, o próximo exame foi uma tomografia computadorizada do abdômem. Mais uma vez nada foi detectado. O que mais me angustia não é propriamente a dor, mas não descobrir sua causa.

A cada noite eu continuava, apesar do medicamentos, a urrar de dor. Ao meu lado na enfermaria 227, o SD Bruno de Itatiauçu, que havia sofrido um acidente automobilístico e iria passar por uma cirurgia no fêmur, e o Sgt Aldair de Caratinga que passou por uma cirurgia no pulso. A eles,o meu agradecimento pelo consolo nas noites de dor, e de tristeza. Tristeza por estar a quase seis meses sofrendo de uma dor em que apesar de tantos exames e tantos remédios, internações e desmaios, ninguém conseguir descobrir a causa da dor.

Nessas horas a gente pensa em cada dia vivido. Em cada pessoa que deixamos de valorizar, a cada pessoa que nos decepcionou,ou que decepcionei. A cada erro, a cada acerto.

Eu prometi a Deus que se ele me permitisse não morrer no meio daquelas dores terríveis que iria tentar ser melhor (ou menos pior), iria tentar ser diferente.

Pensei na minha mãe, ali desesperada no telefone ligando para um e para outro tentando conseguir uma vaga para me transferir. Sabe, quando a gente tem um mandato de vereador ou de Deputado a gente acha que é tanta coisa, mas nessa hora vê que não é nada.

A gente vê que os amigos de verdade são poucos. Muitos são amigos do que você é, e não de quem você é. Confesso que na hora que cheguei a esta conclusão, tive vontade de pedir a Deus para me deixar morrer. Tudo perde a graça, tudo perde a motivação.

A PIOR SOLIDÃO É AQUELA EM QUE A GENTE OLHA PARA O LADO E VÊ TANTA GENTE, MAS SE SENTE SOZINHO. O PIOR MOMENTO DA VIDA É QUANDO NO MEIO DE TANTOS SONHOS A GENTE TEM VONTADE DE DESISTIR DE TUDO. MEU DEUS, COMO EU GRITEI PEDINDO PARA MORRER, PARA NAO SENTIR MAIS DOR. COMO EU RECLAMEI DA VIDA.

Aos oficiais e praças do HPM e aos médicos civis que me atenderam, meu muito obrigado. Deus abençoe a vocês.

Um agradecimento especial também ao Major Clenis, Diretor Clinico do HPM, que foi quem me recebeu no primeiro dia e ficou procurando uma vaga para me alojar. Me perdoe pelas injustiças cometidas contra o Hospital Militar. Internado ali eu vi como é difícil socorrer todo mundo que precisa. Me desculpe.

Sabe gente, a vida vale tão pouco quando a gente sente que a está perdendo. Como seria bom se pudéssemos voltar no tempo e fazer as coisas tão diferentes, tão certas. Como seria bom se pudéssemos apertar a tecla de REW e deixar de magoar as pessoas que amamos. Deixar de desapontar as pessoas que confiaram em nós.

A política foi bom pra minha vida (nunca fui hipócrita), mas é um preço tão alto. Foi muita responsabilidade para um jovem de 29 anos de idade chegar no Congresso Nacional e representar uma classe tão abandonada, tão sofrida.

Fiz como Davi, amei quem me feriu e feri quem me amou. Sei que essa carta será um "prato cheio" para os meus adversários. Dirão: Eu nao disse, eu nao falei, etc. Mas não to nem aí, quero aliviar o peso da minha alma. Tem uma coisa que muita gente nao entenderá, que é uma coisa que meu pai dizia: "quando o fardo estiver pesado, volte ao primeiro amor". Nossa, como é dificil.

Aos meus colegas, meu pedido de perdão.

A pior tristeza de um homem é quando ele não sabe se vai durar mais 100 anos, ou apenas mais 100 minutos. Dá vontade de fazer em 100 minutos, o que não conseguimos fazer em 100 anos. Mas, o tempo não permite. Uma das piores dores é a dor da frustração.

Não to nem aí se essa carta vai ser bem entendida ou não,se vai me trazer prejuízo ou não,é um desabafo de quem acabou de sair de um hospital. São 23:40 hs agora.

Não preciso de sensacionalismo. Fui eleito e, 1998. Depois quando deixe a candidatura de prefeito de Belo Horizonte, todo mundo dizia que eu estava acabado politicamente e tive quase 120 mil votos em 2002. Em 2006 depois de 10 meses de pancada todo dia tive quase 60 mil votos. Em 2008 me elegi vereador em BH, quebrando mais um tabu. Nunca tivemos um praça eleito em BH. É a eleição mais difícil de todas a de vereador.

Pelo amor de Deus, não é isso. Isso não traz lucro, traz reflexão. Talvez alivie a alma.

Ao Deputado Sargento Rodrigues. Lembrei naquele leito, as vezes que nos reunimos na sua ou na minha casa juntando moedinhas para pagar a nossa conta de luz depois da exclusão. Da sua esposa fazendo um mexidão para as pessoas que estavam ao nosso lado em uma campanha até então impossível.

Das vezes em que a gente viajava, e chegava nas cidades e não tinha dinheiro para comer, para dormir, para abastecer o carro emprestado. A gente vivia de rifas.

Como as coisas tomaram outros rumos depois da eleição. Talvez pela nossa vontade de, separadamente ,mostrar a nossa classe quem era o mais grato,o mais desejoso de mostrar serviço, o mais competente, ou talvez o menos incompetente.

A você, Rodrigues o meu pedido maior ainda de perdão, por ter permitido que a nossa amizade, forjada na dor, fosse embora.

Continue, você é competente e importante para a nossa classe.

Sabe gente, quando a gente chega lá, a gente chega cheio de vontade de mudar o mundo, de fazer e acontecer. Mas a realidade é dura. É difícil mudar culturas, mudar coisas moldadas ( certas ou erradas ) com o tempo.

A máfia das ambulâncias, foi um dos piores momentos da minha vida política; um momento de muita crueldade com a minha família. Não culpo ninguém, a culpa foi exclusivamente minha. Mas me negaram o direito de mostrar o meu lado da história.

EU ERREI, EU PERMITI QUE A CORRUPÇÃO E O ERRO INVADISSE MINHA ALMA.

Eu jamais esperaria que aquelas pessoas que me ajudaram na campanha de 2002 viessem a ser presos e acusados de tanta coisas erradas. Mas,quem com porco se mistura, farelo come.

Eu não fui e não sou inocente. Deus sabe que não sou. Mas também não errei o tanto que me acusaram de errar.

Perdão aos meus filhos, a minha mãe, a meu irmão. Aos meu colegas, que confiaram em mim. São tantos que é dificil pedir perdão e nomear a todos. A Noeme de Juiz de Fora, ao Araujo de Teofilo Otoni, ao Zé de Uberaba ( meu paizão), ao Alair de Bom Despacho, a Adriana de Pouso Alegre, ao Laubi de TO, ao Cb Prates de Moc, ao Sgt Barbosa de BH, ao Melo de Neves, ao Lucio de Leopoldina, ao Abi-Ali de Valadares, ao Cb Fernando de Contagem, ao Cel Mendonça, ao meu herói na area juridica, o Dr. Cabo Ricardo de BH, ao Sgt Mendes guerreiro de 97, aos anistiados, enfim, é tanta gente que o sono me trai. Me desculpe quem eu esqueci.

Aos meus fiéis mosqueteiros, Lobão, Jacinto ( e a marlene) e maurição. Vocês são a minha família. Obrigado por nunca terem me abandonado. Amo vocês.

A Renata da Aspra que pediu oração pra mim eu seu blog. Brigadão. A nossa renatinha e a Dra Liliane, obrigado pela força.

Paguei e continuarei pagando um preço muito caro pelo meu erro imperdoável. Mesmo tendo 84 deputados investigados, fui o único a ser condenado em primeira instancia. Apesar de recorrer, será que eu sou pior do que todos os outros 83? Eu colhi o que plantei. Deixei de confiar em Deus na hora do aperto. Esqueci que o mesmo Deus que me tirou da barraca de camelo, que se eu fosse fiel, ele me permitiria continuar. Mas a ambição falou mais alto que a fé.

A depressão é uma doença da alma. A alma segundo a psicologia são os sentimentos, as emoções. Segundo a teologia,é o que nos aflige e nos distancia de Deus. É o que dói, o que faz os problemas pequenos se tornarem grandes. O que faz os problemas grandes se tornarem impossíveis aos olhos humanos.

Sabe, são tantas pessoas que magoei, que decepcionei, que essa carta se tornaria imensa.

Ao Coronel Renato, meu pedido de perdão também. È fácil demais fazer a política da critica, do quanto pior melhor. Mas fazer,é tão difícil.

Vou lembrar um fato que talvez você não se lembre. Em 1997, no auge da crise, você me chamou no gabinete do sub-comando e me disse: vai em frente. Confesso que não entendi até hoje esta frase. Mas eu fui em frente.

A mão que aplaude cada critica,é a mesma mão que desdenha.

Creio que tem muita coisa ruim que existe ainda na PM, muitas injustiças. Colegas trabalhando como burro de carga, injustiças. Mas as criticas não são de todo justas.

Desejo sucesso no seu comando. Olhe com mais sensibilidade aqueles que sofrem.

São 23:58, nem sei como terminar. Afinal são quase 10 anos,em que sai do anonimato de uma viatura Rotam e uma barraca de camelo e passei a ter tantas responsabilidades que hoje vejo que não estava preparado.

É um mundo cão. Onde o mais forte engole o mais fraco.

Ao Cabo Alexandre, Presidente da ASCOBOM. Obrigado pelo conforto, pelo socorro, por acreditar em mim em momentos em que muitos me viraram as costas. Sua ousadia manteve o Projeto Restaurando Vidas de pé quando todos achavam que o sonho se acabaria.Na luta eu tive um colega, na dor eu ganhei um irmão. Você foi um dos poucos ombros que eu tive para chorar. Obrigado Alexandre.

Enfim, essa carta é um desabafo.

Ao apostolo Freitas, que um dia me disse: a igreja é lutar de restauração. Estamos juntos até o ultimo minuto. Obrigado.

Não sei o que eu tenho, se é grave, ou apenas uma bobeira emocional. Mas eu peço a Deus que me perdoe e não em deixe passar mais tanta dor como aquela que senti naquele hospital.

Eu tô com medo. Deus sabe que estou falando a verdade. To me sentindo meio impotente diante da possibilidade de ter pouco tempo para fazer tanta coisa que sonhei.

Prefiro que Deus me leve, a sentir tamanha dor. Dói no corpo e dói muito mais na alma quando a gente se sente inútil diante da impossibilidade de lutar contra ela.

Obrigado a todos. São 02:25.

(AOS MEUS ASSESSORES QUE CONTROLAM ESTE BLOG, POR FAVOR, RESPEITEM A MINHA VONTADE E DEIXEM ESTA MENSAGEM NA INTEGRA COMO POSTEI)





Fonte: Terra

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