Clima faz vegetação da Amazônia subir os Andes, diz estudo
As mudanças climáticas parecem estar levando árvores típicas da Floresta Amazônica e doenças antes limitadas a regiões mais baixas a subir as encostas dos Andes, no sudeste do Peru.
As plantas sobem a uma taxa média de 25 metros por década de acordo com uma pesquisa da universidade britânica de Oxford, coordenada pelo professor Yadvinder Malhi, diretor do Centro de Florestas Tropicais.
Ao mesmo tempo, algumas autoridades sanitárias peruanas afirmam ter constatado um aumento no número de casos de malária, dengue e bartonellose em altitudes em que as doenças não eram comuns, e a taxa de mortalidade das doenças nestas "novas" áreas é de 30%.
Entre as plantas, 37 das 115 espécies de vegetação amazônica identificadas na região estão subindo ainda mais rapidamente, a uma taxa de 3,78 metros por ano.
"A Amazônia está se aquecendo rapidamente, e para garantir a sua sobrevivência, algumas espécies já começaram a migrar para cima", disse Malhi à BBC.
Na altitude
A área estudada fica entre a floresta amazônica próxima a Puerto Maldonado, no Peru, e os bosques a cerca de 3,45 mil metros de altitude, nos arredores da reserva biológica de Wayquecha.
Os estudiosos realizaram um levantamento inicial em 2003, repetindo-o em 2007.
"A Cyathea, uma árvore de samambaia, é o gênero que mais migrou, mas outros também migraram, como o Hedyosmum, Clethra, Clusia, Schlefflera, Miconia e Virola", disse a pesquisadora Natividad Rauran Quisiyupanqui, que integra a equipe no Peru.
A migração também teria afetado mosquitos portadores de doenças. O médico Manuel Montoya, chefe do Serviço de Doenças Infecciosas do Hospital Regional de Cuzco, a mais de 3,3 mil metros de altitude no Peru, não tem dúvidas de que há uma relação com a mudança climática.
"Começamos a notar essas mudanças com mais força a partir de 98, com o fenômeno do El Niño. A partir de então, começamos a ver uma espécie de ruptura e uma mudança ecológica nas enfermidades", afirmou.
No entanto, há também vários estudos que questionam uma relação direta entre mudança climática e distribuição geográfica de doenças.
Para a especialista em Epidemiologia Ambiental da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, Sari Kovats, faltam provam científicas que indiquem uma maior incidência de doenças tropicais nos Andes provocadas por um aumento de temperaturas.
Escalada lenta
No caso das plantas, a relação parece ser direta, mas os cientistas descobriram que a velocidade de migração das plantas não acompanha as estimativas de aquecimento, que variam entre conservadores 2ºC nos próximos cem anos a até 4ºC ou 5ºC.
"As árvores estão avançando em média 25 metros por década. É um passo largo, mas se fosse manter o ritmo das mudanças climáticas, a velocidade deveria dobrar", afirmou Malhi.
Além disso, a estratégia de migração não é tão eficiente para todos os gêneros e espécies. Ela depende de como as sementes são dispersadas. Aquelas dispersadas por aves ou pelo vento podem chegar mais longe, mas as que dependem de animais podem correr mais riscos.
Para os cientistas, no entanto, um dos principais obstáculos é o fator humano. Para que as plantas possam, seria necessário um corredor natural para que elas se dispersassem.
De acordo com o estudioso Timothy J. Killeen, entretanto, aos pés dos Andes "há petróleo, biocombustíveis, pessoas com fome em busca de terras para cultivar, além de homens ambiciosos que querem se encher de dinheiro com o ouro depositado durante milhões de anos nos sedimentos aluviais da Amazônia".
'Fim de espécies'
Killeen é o autor do livro A Perfect Storm in the Amazon Wilderness (Uma Tempestade Perfeita na Amazônia Selvagem, em tradução livre), que debate as mudanças que ameaçam a biodiversidade na região amazônica.
Mas, na opinião dos cientistas, mesmo que se possa "auxiliar" na migração das espécies Andes acima, existem limites naturais para tal migração.
Ou seja, independentemente do que possa ser feito "as comunidades de plantas como as conhecemos hoje não existirão no futuro. Serão destruídas e veremos novas comunidades como resultado da adaptação de cada espécie", afirmou Malhi.
Enquanto plantas, mosquitos e doenças parecem estar subindo os Andes, todo ano, milhares de pessoas descem na estação seca rumo à Amazônia peruana.
O destino final de diversas delas é o garimpo. A atividade muitas vezes visa garantir o sustento de famílias acuadas pela falta de oportunidades em cidades mais altas, como Puno, Cuzco e Arequipa, mas é uma das principais causa dos desmatamento na região.
O desmatamento na Amazônia é tido como uma das principais causas do aquecimento global, que, por sua vez, estaria levando a vegetação e as doenças Andes acima.
Garimpo
Para explorar o ouro, os garimpeiros dragam trechos de lagos e rios, revolvendo e destruindo o solo de praias e florestas.
No passo seguinte, ao separar o ouro da areia, eles usam mercúrio, que por sua vez contamina o solo, a água e a atmosfera.
"O problema está crescendo de forma exponencial, porque não tem havido controle do Estado", afirmou Carlos Nieto, chefe da Reserva Nacional de Tambopata, um parque nacional próximo as áreas de garimpo.
Organizações não-governamentais que trabalham em Puerto Maldonado, a capital da região, afirmam que cerca de 30mil pessoas trabalham informalmente no garimpo.
O Ministério do Meio Ambiente admite que das 2,8 mil concessões de exploração existentes na região, apenas 16 apresentaram estudos de impacto ambiental.
Na tentativa de brecar este crescimento desordenado, os ministérios do Meio Ambiente e das Minas e Energia suspenderam a concessão de licenças por dois anos.
O próprio ministro do Meio Ambiente, Antonio Brack, classificou a atividade mineradora informal de "câncer" reconheceu que "é um dos maiores problemas ambientais do país".
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