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Politica Brasil
Segunda - 26 de Outubro de 2009 às 07:19
Por: Mariane de Oliveira

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Estudos feitos por um grupo de voluntários de diferentes classes sociais, os Guardiões da Cidadania de Cuiabá, mostram que a crise institucional pela qual passa a Câmara Municipal não é resultado apenas dos escândalos referentes às contas da ex-presidente Chica Nunes (DEM), acusada de um rombo de R$ 6,3 milhões; do ex-presidente Lutero Ponce (PMDB), suposto responsável pelo desvio de R$ 7, 5 milhões; do ex-vereador Ralf Leite (PRTB), cassado após ser preso por exploração sexual de um travesti adolescente e novamente preso sexta-feira (23) por violência contra a mulher. O estudo revela que os vereadores, pagos com dinheiro do contribuinte para cuidar dos interesses coletivos, gastam o mandato cuidando, apenas e tão somente, da intensa busca por votos e dos interesses político-partidários.

Formado por um porteiro de escola, contador, economista, advogado, pequenos empresários e servidores públicos, o grupo vai a todas todas as sessões, e costuma visitar a Câmara de manhã e durante a tarde, para acompanhar os trabalhos do Legislativo. E as conclusões são desanimadoras.

De acordo com o coordenador do grupo, Edson Marim, a maioria dos vereadores só comparece à Câmara nas terças e quintas, dias em que são realizadas as sessões. Muitas vezes, nos dias de sessão, os vereadores costumam apenas registrar a presença e deixar o plenário para cuidar de assuntos particulares, nos gabinetes. É nessas horas que conversam com cabos eleitorais e presidentes de bairros que dão sustentação ao seu mandato. "Se você liga para um assessor para marcar com um vereador, ele marca para terça ou quinta de manhã, dias que tem sessão. Funciona assim: o vereador está na sessão, aí ele olha para o espaço reservado ao público e vê que lá tem um cabo eleitoral, que foi falar com ele. Aí ele deixa a sessão e vai para o gabinete atender a pessoa. Volta depois que acaba a sessão. Mas na ata tá lá registrada a presença dele".

O fato é constantemente presenciado pelos membros do grupo Guardiões da Cidadania, que costumam percorrer os gabinetes quando a sessão está vazia, e encontrar lá vários parlamentares, tratando de interesses próprios ou de seus partidos. Os que ficam nas sessões, mantém a atenção no computador (notebook) ligado à sua frente, ou conversam com outros colegas, enquanto outro parlamentar faz uso da palavra. "Antes era pior, quando o uso do telefone celular era permitido", comenta.

O uso do celular foi proibido nas sessões depois que os Guardiões da Cidadania, que começaram a atuar em Cuiabá em 2005, protestaram.

As sessões destinadas à prestação de contas do Executivo também foram criticadas. Quando a Câmara convoca um secretário municipal para prestar contas, a mesa diretora permite que ele gaste metade do tempo, às vezes mais, para agradecer um a um os vereadores presentes, ressaltar a importância dos trabalhos da Câmara e discorrer sobre assuntos alheios à convocação. "E ainda tem outro problema, a explicação é em linguagem complicada, que um cidadão simples não entende", relatou Marim.

Ele também ressaltou a falta de transparência na Câmara em relação aos gastos públicos. Os vereadores passaram a divulgar os gastos com a verba indenizatória, mas a presidência ainda não cumpriu a promessa de divulgar todos os gastos da Casa, principalmente aqueles sob sua responsabilidade.

Durante as sessões, as votações acontecem de forma tão rápida que não são raros os casos em que o vereador não percebe o que votou.

O estudo sobre o desempenho da Câmara no primeiro semestre deste ano foi enviado para todos os vereadores, no endereço eletrônico disponibilizado na página do Poder Legislativo Municipal. Em seguida, os membros do grupo Guardiões da Cidadania foram de gabinete em gabinete para conversar com os parlamentares. E tiveram outra surpresa: nem os vereadores, nem assessores, abrem os e-mails que eles mesmos disponibilizam no site da Câmara para supostamente receber críticas e sugestões.

Ainda assim, eles insistiram com os assessores, para que procurassem os e-mails que enviaram. Foram solenemente ignorados. "Só recebemos atenção no gabinete do Lúdio, que uma assessora fez questão de saber quem éramos, o que dizia o relatório e o que queríamos".

Mas, de acordo com o coordenador do grupo, o problema é maior. Isso porque grande parte dos vereadores opta por concentrar sua atuação nas indicações ao Poder Executivo, quando, na verdade, ela deveria também se estender às tarefas de legislar e fiscalizar as ações do Poder Executivo.

"A indicação é uma petição em que o vereador sugere ao Executivo medidas de interesse público como asfaltar determinada rua, colocar semáforo, cortar árvore etc", descreveu Marim, para em seguida explicar seu desapontamento com os vereadores. "Estas indicações poderiam ser feitas diretamente na prefeitura, o que agilizaria a resposta do Executivo. A prefeitura geralmente atende os pedidos dos vereadores, e se não passar pela burocracia da Câmara, o resultado para a população é muito mais rápido. Mas o vereador prefere fazer pela Câmara, porque assim ele usa a palavra na tribuna e consegue mais votos".

Análise - O relatório dos Guardiões da Cidadania conta com planilhas (ver quadros) elaboradas a partir de cálculos sobre o número de proposituras de cada parlamentar. A análise qualitativa sobre a qualidade dos serviços prestados pelos vereadores não pôde ser feita porque a presidência da Casa não forneceu os dados solicitados pelo grupo. Para que a análise qualitativa seja realizada, eles precisam conhecer o conteúdo de todas as proposituras apresentadas de janeiro a julho.

O presidente Deucimar Silva (PP) ofereceu apenas números. "Mesmo assim ele não entregou direto para nós. Nós pedimos e, em julho, ele convocou a imprensa e entregou para os jornalistas".

Marins, até hoje não foi recebido por nenhum dos presidentes da Câmara de Cuiabá, apesar dos constantes pedidos de audiência. "A assessoria do Deucimar falou que vai marcar, mas que neste momento ele está muito ocupado com o processo de cassação do Lutero".

O estudo resultou em quatro planilhas, que mostram o número de proposituras, classificam os vereadores pelo total de iniciativas e pelo percentual apresentado por cada vereador.

Para eleger os mais atuantes, o grupo considerou tanto critérios de observação durante as sessões quanto o fato de não ter apresentado apenas indicações, mas outras proposituras. Para chegar a esses números, o grupo pegou o número de proposituras de cada vereador (projetos de Lei, Lei Complementar, Resolução, Decreto, Requerimento, Indicações, Moção) e calculou o percentual em relação ao total apresentado pela Câmara. Em seguida, somou os percentuais obtidos pelos parlamentares.

Esse cálculo permitiu ver que vereadores campeões em indicações, como o vereador Chico 2000 (PR), que apresentou 840 indicações, caem de colocação quando o critério é a qualidade do serviço prestado (ranking atuação).

O primeiro colocado no ranking, em atuação, é o vereador Lúdio Cabral (PT), responsável por 190,1% das proposituras apresentadas de janeiro a julho. Contudo, para Marins, Lúdio peca ao se limitar às críticas, sem apresentar sugestões para mudar o quadro e melhorar a vida da população. "Na Saúde, que é a área dele, ele poderia apresentar sugestões ao invés de ficar só criticando".

O relatório mostra que vereadores estreantes tiveram uma participação regular. Questionado sobre quem são, na opinião do grupo Guardiões da Cidadania, os vereadores com mais baixo desempenho, Edson Marins afirma que são parlamentares já têm bastante experiência no Legislativo municipal e, portanto, deveriam realizar um trabalho de melhor qualidade, em defesa dos interesses da população. O vereador Edivá Alves, que aparece em último lugar no quesito qualidade dos serviços prestados, não pôde ser avaliado neste relatório pois deixou a Câmara no início do ano para assumir a Secretaria de Trânsito e Transportes Urbanos do município.

Na opinião do coordenador, o presidente da Câmara, Deucimar Silva, poderia prestar melhor serviço à sociedade se abrisse os gastos da Câmara. "Nós nem sabemos o valor exato do orçamento da Câmara. Vamos cobrar isso dele e queremos saber como esse dinheiro é gasto".

Convite - Que tiver interesse pode mandar sugestões para o grupo pelo e-mail edson.marim@globo.com ou pelo telefone celular do coordenador (65) 9245-1006.

O relatório produzido pelo grupo apresenta os problemas existentes na Câmara, mas também aponta inúmeras sugestões de melhora, dirigidas ao presidente Deucimar Silva e à mesa diretora.




Fonte: A Gazeta

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