A caixa preta que faltava
Leio com pesar e com contentamento as notícias sobre a representação ingressada pelo promotor Mauro Zaque contra o procurador Paulo Prado. O pesar reside no motivo da ação: improbidade administrativa de quem, a rigor e por princípio, deveria zelar pela boa aplicação da lei. E o contentamento está no fato de que, segundo as mesmas notícias, pela primeira vez na história deste Estado, finalmente, o Ministério Público Estadual vai investigar o Ministério Público Estadual, à luz do dia e das câmeras de TV, e não apenas na escuridão das corregedorias.
O Brasil vive um processo profundo de amadurecimento democrático. Com o fortalecimento do que tenho tratado de nova sociedade civil – entre elas o chamado terceiro setor -, as instituições tradicionais do Estado e o próprio Estado também estão sendo moldados por esse amadurecimento. O fenômeno, em certa medida, é universal, e deriva da chamada nova ordem mundial, da globalização, da nova organização do trabalho (em constante evolução), da integração dos mercados, etc... Alguns mais apressados chegaram a vaticinar o fim do Estado, das nações, dos exércitos nacionais. Na verdade, nada disso, em regra, acabou ou acabará. Mas, com certeza, tudo isso passou, passa e continuará passando por modificações profundas.
Hoje, por exemplo, testemunhamos crises institucionais e políticas muito sérias que vão da Câmara de Cuiabá – a base da pirâmide da nossa organização política – ao Senado - o topo dessa estrutura. Embora haja muitas diferenças entre Luthero Ponce e Ralf Leite e José Sarney, há em comum entre eles o exercício da política pelo modelo feudal de se colocar acima do povo e da ética coletiva. Logo, achando-se acima dos interesses coletivos, sua ética privada e individual é elevada à ética universal. E daí ocorrem essas atrocidades todas que conhecemos.
Há mais Sarneys, Lutheros e Ralfs nos legislativos brasileiros, mas também os há nos executivos e nos judiciários. Quem não se assusta, por exemplo, com essa briga fratricida em curso no Tribunal de Justiça de Mato Grosso? Quem não se recorda da CPI do Judiciário, criada no Congresso Nacional há uma década, que também contou com alguns personagens mato-grossenses? As do executivo então nem se fala, de tão fartas que são.
Mas, faltava o Ministério Público. Pelo menos em Mato Grosso não falta mais. Creio que a sociedade tem a melhor expectativa possível sobre essa representação proposta pelo promotor Mauro Zaque. Nós outros, que não pertencemos a nenhuma carreira jurídica, ficamos com a impressão esses anos todos em que Paulo Prado chefiou o Ministério Público Estadual de que o MPE havia se transformado numa empreiteira ou num departamento de RH. As grandes preocupações do ex-chefe do MP, ao que parece, estavam relacionadas a reivindicações de aumento de duodécimo, sede própria ou eventos sociais para tirar retrato ao lado dos demais chefes de poder. Dava até saudade de Guiomar Teodoro Borges e Luiz Vidal da Fonseca.
Navegando no site do Ministério Público Estadual (www.mp.mt.gov.br) não encontrei nenhuma notícia sobre a ação movida por Zaque contra Prado nesta terça (21.07), embora o assunto tenha merecido manchetes da imprensa. O que é altamente lamentável, porque o MPE deveria tratar esse caso com o mesmo critério dos demais, expondo ao máximo seus réus. Seria como experimentar do próprio remédio.
Entretanto, achei no site um poema do Procurador de Justiça Miguel Moacyr Alves de Lima, com o sugestivo título de ‘Profissão de Fé do Promotor de Justiça’, que transcrevo abaixo, em homenagem todos os membros do MPE/MT, nas pessoas de Mauro Zaque e Paulo Prado:
“Viver em cada gesto a liberdade / E ser o mundo exemplo de esperança. / Fazer da vida fruto da verdade, / Dessas verdades em que a luz descansa / É esta, companheiro, a sua estrada. / Lutar, a recompensa não importa. / É esta, companheiro, a sua estrada”.
(*) KLEBER LIMA é jornalista e consultor de marketing em Mato Grosso. E-mail: kleberlima@terra.com.br.
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