STF pode anular proposta de terceiro mandato para Lula
Reforçada nos bastidores do Congresso por conta da doença da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e pela possibilidade de altos e baixos no tratamento a que ela está se submetendo, a tese do terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode acabar sendo anulada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A justificativa entre o meio jurídico é que a aprovação de uma emenda à Constituição que permitiria um novo mandato ao político petista poderia afrontar diretamente as chamadas normas originárias da Carta Magna, ou seja, aqueles princípios fundamentais delimitados em 1988, quando a Constituição foi promulgada.
Um dos pontos que devem ser contestados na Suprema Corte, caso a base aliada realmente consiga aprovar a proposta de emenda à Constituição (PEC) que permite o terceiro mandato, é o princípio da alternância de poder. Foi com base neste argumento que PT, PDT, PCdoB e o então PL (hoje PR) impetraram ação direta de inconstitucionalidade (ADI) em março de 1998 questionando a abertura de possibilidade de um segundo mandato para FHC.
Pouco mais de um ano após ter sido nomeado pelo próprio Fernando Henrique para o Supremo, o atual presidente da Corte e advogado-geral da União na gestão tucana, Gilmar Mendes, foi designado relator do caso. Onze anos e dois meses depois de ter entrado no STF, o processo não tem perspectiva de ser julgado em definitivo pelo Plenário.
Em tese, se um dia apreciasse o caso de forma cabal e aceitasse o pedido dos partidos de oposição na época, o STF poderia desconstituir todo o segundo mandato de FHC e anular em massa as decisões tomadas pelo Executivo federal entre 1998 e 2002. "A constitucionalidade de uma reeleição não foi decidida em definitivo pelo STF", relembram fontes do STF.
Na atual composição do Supremo, poucos são os ministros que estavam na Corte na época da aprovação do projeto de reeleição de Fernando Henrique. Dos onze magistrados de hoje, apenas Celso de Mello e Marco Aurélio Mello compunham o STF em 1998. A nomeação de nove diferentes ministros nesses últimos anos pode significar, segundo juristas ouvidos pelo Terra, a possibilidade de o STF barrar um terceiro mandato para o presidente Lula.
Quando o Supremo analisou a liminar naquele ano, Marco Aurélio disse ser inconstitucional a alteração na Constituição permitindo a reeleição, mas Celso de Mello não acatou o pedido dos partidos. Para a eventual anulação de um terceiro mandato do presidente Lula, o STF teria de receber e julgar uma ação de inconstitucionalidade movida por entidades ou legendas de oposição.
Atualmente, além de Marco Aurélio, apresentam ressalvas à perspectiva de mais de uma reeleição para o Executivo os ministros Gilmar Mendes, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Cezar Peluso.
Crítico ferrenho da possibilidade de uma nova reeleição para Lula, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, chega a comparar uma terceira gestão seguida do petista a um "golpe de Estado", ainda que exista a possibilidade de se conseguir atingir um terceiro mandato legalmente.
"Por melhor que seja o governante, não se pode partir do pressuposto que ele é único. O sucessor pode ser melhor que ele. As democracias não podem sobreviver apenas com nomes, e sim com idéias e propostas", avalia o jurista.
A aprovação de uma PEC, instrumento que permite alterar a Carta Magna e tornar o terceiro mandato legal, depende de duas votações, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, em dois turnos, além do aval de pelo menos três quintos dos deputados, ou 308 de 513 votos.
"O terceiro mandato não está previsto na Constituição Federal e acredito que não está previsto de forma correta. A alternância de poder é um dos pilares da democracia. A hipótese de se prorrogar mandatos não é compatível com o princípio democrático. O presidente Lula não iria afrontar sua biografia", comenta Cezar Britto.
"Mesmo com a aprovação de uma PEC, a democracia pressupõe a alternância de poder. Já houve um erro grave quando se aprovou a reeleição. Quem pode três mandatos pode quatro, pode cinco, pode seis. Perde-se o controle e se torna uma perpetuação (no poder)", prevê o presidente da OAB.
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