Cultura da sujeira
Este foi o titulo de um livro que escrevi em 1996, resultado de um trabalho iniciado em 1987 sobre a questão da limpeza das cidades brasileiras, com o foco no hábito do brasileiro jogar tudo nas ruas. Passados mais de vinte anos, o problema continua em alguns bairros e em quase todas as cidades, como se nada tivesse sido feito. Trata-se de uma luta inglória. As soluções apresentadas são café requentado, porque os problemas se repetem.
Todos criticam os "outros" pelo problema. Este argumento é utilizado para quase todos os problemas nacionais. Se "todo mundo" colaborasse, é a frase mais falada. Quem fala exclui-se do "todo mundo". Como "todo mundo" é o cada um, o problema fica insolúvel, porque cada um cobra do "todo mundo", mas não faz a sua parte. E as cidades brasileiras continuam sujas e sem árvores. Se as autoridades fizessem corretamente sua parte, este texto não teria sentido. As medidas são mais discursivas do que reais. Por isso, as ações devem partir dos cidadãos, que, dentre as ações, estaria a de cobrar de todos os prefeitos e dos vereadores a conservação das cidades.
Ninguém precisa ser engajado em nada. Basta cumprir seu papel de cidadão, regra válida para a manutenção das cidades. Porém, algumas medidas são práticas e fáceis, e ajudariam muito pela relevância da posição social, como jogadores de futebol, apresentadores de televisão, artistas em geral; ou pela função estratégica, como comerciantes, donos de barracas, quaisquer, e banqueiros, que deveriam apenas conservar limpas as calçadas e o meio-fio junto a elas, apenas na extensão de seus imóveis. Colocar uma lixeira, simples, mesmo um caixote, seria salutar, e a limpeza periódica, enquanto as pessoas atingem um padrão de civilidade que não jogue de tudo nas ruas.
Já as escolas, especialmente de ensino básico deveriam implementar a discussão constante, mesmo que não faça parte da grade curricular. Mas elas têm sido o primeiro péssimo exemplo aos jovens e às crianças. As paredes são rabiscadas e perfuradas, as carteiras são rabiscadas e quebradas; os arredores são verdadeiros lixões a céu aberto.
Algumas indústrias precisariam fabricar cinzeiros portáteis. Os fumantes foram proibidos de tudo, menos de que a rua, o espaço público, principalmente os canteiros e jardins podem ser seus cinzeiros. Neste aspecto da sujeira há unanimidade. È comum pessoas baterem seus papos em suas casas e atirarem as pontas de cigarro na frente com um chute de dedo.
Minhas palestras em escolas eram iniciadas com a abertura de um doce, com o papel jogado no chão, fora de uma demarcação com fita adesiva. Começava a falar de que não se deveria jogar papel no chão, na rua... Nunca passou de cinco minutos para uma criança interromper e me condenar pela máxima do faça o que mando e não o que faço. Explicava que aquela demarcação seria a casa deles e, para quem não respeitava o próprio lar, a do amigo. Elas não jogariam aquele papel na sua casa, mas se achavam no direito de jogar na casa de todos, que seria a rua, a cidade, representada ali pelo espaço após a fita.
Inúmeras ações são possíveis para evitar o problema. Mas uma se destaca. É só não jogar objetos nas ruas. A partir daí, viriam a reciclagem, a limpeza, o reaproveitamento de material, a utilização correta deles e tantas outras.
Sem medo de errar, São Paulo melhorou bastante, mas se ainda melhorar 2000% (dois mil por cento) ainda não seria uma cidade limpa como se deve ou se pode ser. A regra vale para quase todas as cidades brasileiras.
"Todo mundo" só vai aparecer quando cada um se der conta de que é o "todo mundo". Pode haver o argumento de que um palito de fósforo e uma ponta de cigarro não seriam "nada", se não fossem 19 milhões de pessoas em São Paulo e outros milhões em outras capitais. Sem resultados aparentes, enquanto um só brasileiro jogar uma ponta de cigarro na rua, minha campanha continuará.
Pedro Cardoso da Costa - Interlagos/SP
Bel. Direito
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