Empresas superestimam captura de CO2, diz estudo
Novos dados de campo contabilizados por uma equipe do IF (Instituto Florestal) de São Paulo lançam mais peso sobre a desequilibrada balança dos processos de neutralização de carbono.
O novo estudo diz que, para seqüestrar uma tonelada de carbono da atmosfera num prazo de 20 anos na mata atlântica, são necessárias 9,7 árvores em média --137% mais que o que é comumente usado pelas empresas que já prestam esse serviço no Brasil.
"É fundamental olhar para o tipo de espécie utilizada [nesses plantios]", afirma à Folha o engenheiro florestal Antônio Carlos Galvão de Melo, da Floresta Estadual de Assis, no interior paulista. O projeto de pesquisa faz parte das atividades do Programa de Recuperação de Matas Ciliares da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo e conta com a participação da Universidade Federal do Paraná.
Há três tipos de árvores que podem ser usadas na neutralização: as espécies de crescimento lento (como a peroba, a aroeira ou o pau-marfim), de crescimento médio (como a canafístula) e as de crescimento rápido, ou pioneiras (como o angico ou o peito-de-pombo).
Pelos cálculos de Melo, a diferença de absorção de carbono entre esses três grupos é muito grande. Essa divergência está na base da diversidade de valores vista hoje no mercado de neutralização de carbono: por falta de uma metodologia unificada, ela tende a ser ignorada pelas empresas que prestam esse tipo de serviço.
Dependendo da empresa que faz o projeto, o número de árvores para fixar uma tonelada de carbono varia de 1,6 (Brasil Flora) a 6,2 (conforme a conta da Iniciativa Verde).
Num hipotético plantio para neutralizar 100 toneladas de carbono em 20 anos, feito apenas com espécies rápidas, seriam necessárias 311 árvores pelas contas do IF, ou 3.450 plantas de crescimento médio.
No caso das lentas, o projeto de neutralização precisaria plantar e cuidar durante duas décadas de 9.700 mudas.
Outro problema é saber quanto uma árvore (seja qual for o seu tipo) efetivamente contém de carbono. "Os consultores dos projetos de neutralização costumam trabalhar com um teor de carbono equivalente a 50% da biomassa das árvores", explica Melo. O trabalho do IF agora detectou que essa quantidade, segundo um teor médio, é de 41%.
Para chegar aos números finais de absorção de carbono, foram abatidas 120 árvores, com idades entre 5 e 36 anos e diâmetro do tronco entre 5 e 57 cm. Todos os espécimes foram retirados de áreas de reflorestamento heterogêneas, localizadas no médio vale do Paranapanema, em São Paulo.
Toda a biomassa e o carbono das folhas, dos ramos, dos troncos e também das quase sempre esquecidas raízes das plantas foram contabilizados.
O objetivo do grupo de pesquisa, com essa medição, é montar equações que vão permitir quantificar o carbono fixado em qualquer árvore utilizando apenas três variáveis: o diâmetro do tronco, a altura e também a idade da planta.
A ONG SOS Mata Atlântica, que faz projetos de neutralização de carbono para terceiros, desde o ano passado também está preocupada com a metodologia de suas ações.
Por isso, depois de calcular a necessidade de 1,7 árvore por tonelada (relação usada nos primeiros trabalhos), a ONG hoje usa 3,3 árvores como base.
"Nós estamos nos baseando em estudos feitos pela Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz)", diz Adauto Basílio, diretor de Capacitação de Recursos da ONG.
A pesquisa, de acordo com Basílio, avaliou o comportamento de 50 espécies, metade de ritmo mais lento e metade de crescimento mais rápido. "Acaba sendo uma média, e nós trabalhamos com um intervalo de 20 anos", diz.
De acordo com Melo, do IF, os resultados obtidos no vale do Paranapanema permitem que seja possível estimar o ritmo de fixação de carbono e, a partir disso, qual será o prazo para que determinada meta de neutralização seja obtida.
"É muito estranho que um evento ou empreendimento que emitiu gases-estufa em poucos dias ou meses tenha como objetivo neutralizar as emissões em 20 anos só."
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