Repórter News - reporternews.com.br
Peça Trindade mostra luta entre conforto e confronto
SÃO PAULO - Caio de Andrade tem 46 anos, é autor premiado no Rio, e começou a escrever suas peças no fim da década de 90. Sua dramaturgia revela muitos traços da geração que cresceu num país onde a despolitização era efeito já sedimentado do golpe militar. Mas a inquietação com quadro agudo de desigualdade social leva alguns a tentar compreender os movimentos políticos do passado em busca de transformação.
A leitura da peça Trindade - cuja montagem estréia neste sábado, 9, no Teatro da Aliança Francesa depois de fazer temporada no Rio, onde foi indicada ao Prêmio Shell na categoria autor - deixa claro que Caio de Andrade é um desses artistas dispostos a debruçar-se sobre o passado para compreender o presente. “Para mim, tudo aconteceu já no século 19”, diz em conversa ao Estado no saguão do teatro. Nesse período aconteceram os fatos mais importantes de sua peça, cuja ação em início em 1909, num embate entre anarquistas e conservadores. Sua abordagem é feita pelo viés humano: o conflito gira em torno da relação de um jovem médico (Pedro Neschling)com seu pai adotivo, um general (Luciano Chirolli), detonado pela entrada em cena do jornalista (Guilherme Leme, parceiro de luta de seu pai de sangue, um líder do movimento operário supostamente morto na prisão.
Paulista de Lorena, o autor identifica-se com o personagem Emílio em sua ‘descoberta’. Caio chegou ao Rio aos 19 anos. “Foi um impacto”, lembra. “Havia o Teatro do Quatro com toda uma programação de clássicos, As Lágrimas Amargas de Petra von Kant, com a Fernanda Montenegro, em horário alternativo, o Circo Voador, Cazuza, (o grupo teatral) Banduendes.” No mesmo período, nas universidades lia-se jornais como Movimento e Opinião, e o movimento estudantil era retomado. “Foi um trauma chegar ao Rio tão desavisado. Só então tomei conhecimento da História. Eu me perguntava: em qual país fui criado que não sabia de nada?”.
Anos mais tarde, criou um projeto de arte-educação a partir do qual colocava no palco a História, embrião da futura vertente de dramaturgia na qual se insere Trindade, escrita em sala de ensaio com os atores Herson Capri, Pedro Garcia Neto e Guilherme Leme, parceiro artístico desde as primeiras peças. “Quando começamos a ensaiar, eu tinha uma sinopse de duas páginas e três cenas criadas”, lembra Caio, que também assina a direção. “Eu adoraria que outros dirigissem as minhas peças, mas teria de ser um diretor disposta a mudar o texto até na véspera da estréia e mesmo depois”, diz.
Polarização e turbulência
O experiente Chirolli e o jovem Neschling - filho do maestro - juntaram-se a Guilherme Leme na montagem paulistana. “Depois da temporada no Rio e da viagem, a peça foi suspensa por um tempo. Reli o texto para vir a São Paulo e resolvi mexer muito”, diz Caio. “Até a trilha sonora mudou, pela contribuição do Pedro.” Bem, de qualquer forma, o embate central é o mesmo. Tudo se passa em 1909, quando morre o presidente Afonso Pena, um ano antes de completar o seu mandato. “É um momento em que por um lado o Rio ‘civilizou-se’ pela reformas do prefeito Pereira Passos, por outro a pobreza foi empurrada para longe do centro.”
Há polarização e turbulência. “O acordo de Taubaté privilegia os cafeicultores, o movimento trabalhista se organiza, mas é reprimido. “Nessa época é criada a lei do banimento.” Lei que permite expulsar estrangeiros ‘exaltados’ e está no cerne do conflito dramático de Trindade. “Com a morte do presidente, disputam o poder civilistas, liderados por Ruy Barbosa, e militaristas, representados por Hermes da Fonseca.” Emílio é um dos médicos que cuidam do presidente. O pai foi preso quando ele tinha 5 anos e sua mãe morreu um pouco mais tarde, já trabalhando para o general. Guilherme Leme é Tito, jornalista, ativista da causa operária e conhecido do general de outras eras. Logo na primeira cena há um encontro meio clandestino entre Tito e o jovem Emílio.
Começa aí uma descoberta que, no texto, nada tem de simplista. Emílio não se ‘encanta’ pela luta política do pai, como aconteceria num filme de Hollywood. Está bastante identificado com o general e em breve vai abandonar a medicina para administrar as fábricas da futura noiva, rica herdeira da elite. Mas evidentemente um encontro com alguém que conviveu diretamente com seu pai legítimo será transformador. “Desde o primeiro momento, eu e Guilherme queríamos retratar um conflito humano, intimista. A paternidade, descobrimos depois, é um tema pungente, muitos vieram conversar sobre isso, gente que eu nunca imaginei pudesse ter problemas nessa área.”
A leitura da peça Trindade - cuja montagem estréia neste sábado, 9, no Teatro da Aliança Francesa depois de fazer temporada no Rio, onde foi indicada ao Prêmio Shell na categoria autor - deixa claro que Caio de Andrade é um desses artistas dispostos a debruçar-se sobre o passado para compreender o presente. “Para mim, tudo aconteceu já no século 19”, diz em conversa ao Estado no saguão do teatro. Nesse período aconteceram os fatos mais importantes de sua peça, cuja ação em início em 1909, num embate entre anarquistas e conservadores. Sua abordagem é feita pelo viés humano: o conflito gira em torno da relação de um jovem médico (Pedro Neschling)com seu pai adotivo, um general (Luciano Chirolli), detonado pela entrada em cena do jornalista (Guilherme Leme, parceiro de luta de seu pai de sangue, um líder do movimento operário supostamente morto na prisão.
Paulista de Lorena, o autor identifica-se com o personagem Emílio em sua ‘descoberta’. Caio chegou ao Rio aos 19 anos. “Foi um impacto”, lembra. “Havia o Teatro do Quatro com toda uma programação de clássicos, As Lágrimas Amargas de Petra von Kant, com a Fernanda Montenegro, em horário alternativo, o Circo Voador, Cazuza, (o grupo teatral) Banduendes.” No mesmo período, nas universidades lia-se jornais como Movimento e Opinião, e o movimento estudantil era retomado. “Foi um trauma chegar ao Rio tão desavisado. Só então tomei conhecimento da História. Eu me perguntava: em qual país fui criado que não sabia de nada?”.
Anos mais tarde, criou um projeto de arte-educação a partir do qual colocava no palco a História, embrião da futura vertente de dramaturgia na qual se insere Trindade, escrita em sala de ensaio com os atores Herson Capri, Pedro Garcia Neto e Guilherme Leme, parceiro artístico desde as primeiras peças. “Quando começamos a ensaiar, eu tinha uma sinopse de duas páginas e três cenas criadas”, lembra Caio, que também assina a direção. “Eu adoraria que outros dirigissem as minhas peças, mas teria de ser um diretor disposta a mudar o texto até na véspera da estréia e mesmo depois”, diz.
Polarização e turbulência
O experiente Chirolli e o jovem Neschling - filho do maestro - juntaram-se a Guilherme Leme na montagem paulistana. “Depois da temporada no Rio e da viagem, a peça foi suspensa por um tempo. Reli o texto para vir a São Paulo e resolvi mexer muito”, diz Caio. “Até a trilha sonora mudou, pela contribuição do Pedro.” Bem, de qualquer forma, o embate central é o mesmo. Tudo se passa em 1909, quando morre o presidente Afonso Pena, um ano antes de completar o seu mandato. “É um momento em que por um lado o Rio ‘civilizou-se’ pela reformas do prefeito Pereira Passos, por outro a pobreza foi empurrada para longe do centro.”
Há polarização e turbulência. “O acordo de Taubaté privilegia os cafeicultores, o movimento trabalhista se organiza, mas é reprimido. “Nessa época é criada a lei do banimento.” Lei que permite expulsar estrangeiros ‘exaltados’ e está no cerne do conflito dramático de Trindade. “Com a morte do presidente, disputam o poder civilistas, liderados por Ruy Barbosa, e militaristas, representados por Hermes da Fonseca.” Emílio é um dos médicos que cuidam do presidente. O pai foi preso quando ele tinha 5 anos e sua mãe morreu um pouco mais tarde, já trabalhando para o general. Guilherme Leme é Tito, jornalista, ativista da causa operária e conhecido do general de outras eras. Logo na primeira cena há um encontro meio clandestino entre Tito e o jovem Emílio.
Começa aí uma descoberta que, no texto, nada tem de simplista. Emílio não se ‘encanta’ pela luta política do pai, como aconteceria num filme de Hollywood. Está bastante identificado com o general e em breve vai abandonar a medicina para administrar as fábricas da futura noiva, rica herdeira da elite. Mas evidentemente um encontro com alguém que conviveu diretamente com seu pai legítimo será transformador. “Desde o primeiro momento, eu e Guilherme queríamos retratar um conflito humano, intimista. A paternidade, descobrimos depois, é um tema pungente, muitos vieram conversar sobre isso, gente que eu nunca imaginei pudesse ter problemas nessa área.”
Fonte:
Estadão
URL Fonte: https://reporternews.com.br/noticia/222785/visualizar/
Comentários