Governador Maggi se intitula "diabo da floresta"
"Enquanto apenas as ONGs bombardeavam a gente, claro que se criava um conflito. A partir do momento em que você vê esses estudos com cientistas, o IPCC, não posso botar a cabeça dentro de um buraco. Eu mudei, eles (as ONGs) também mudaram e acho que o mundo mudou. E quem não mudou por favor mude, porque alguma coisa precisa ser feita", disse o governador mato-grossense à Folha.
Maggi "verde" defende floresta nos EUA
Governador de Mato Grosso diz que mudou por causa dos cientistas do IPCC; para ele, não é preciso "abrir" novas áreas
Sojicultor defende que produtores ganhem por manter a Amazônia em pé; ambientalistas querem ver novo discurso virar prática
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
É inusitado, mas até o governador de Mato Grosso, o mega-sojicultor Blairo Borges Maggi (Partido Republicano), diz ter mudado seu ponto de vista sobre a questão ambiental após o último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática).
"Enquanto apenas as ONGs bombardeavam a gente, claro que se criava um conflito. A partir do momento em que você vê esses estudos com cientistas, o IPCC, não posso botar a cabeça dentro de um buraco. Eu mudei, eles [as ONGs] também mudaram e acho que o mundo mudou. E quem não mudou por favor mude, porque alguma coisa precisa ser feita".
O novo discurso do "diabo da floresta", como ele mesmo se chamou em tom irônico em entrevista à Folha, será apresentando amanhã em Nova York, em evento de uma ONG que procura estreitar as relações entre brasileiros e a ONU.
"Vou levar para a reunião o início de uma proposta para que se crie um mecanismo de compensação financeira para proprietários de terra que abrirem mão do seu direito de desmatar", explica Maggi.
A idéia do governador é que os grandes proprietários rurais possam receber dinheiro por deixarem a floresta em pé. "Isso, além do que já é previsto em lei", disse, referindo-se à reserva legal de 80% da área de propriedades rurais na Amazônia.
Em outra mudança no discurso que adotava até pouco tempo atrás, quando o agora governista andava de mãos dadas com os grandes desmatadores do Estado, Maggi afirmou ser contra a alteração do Código Florestal exigida pelo setor, que permitiria derrubar mais do que os 20%.
Em compensação, não deixou de cobrar algumas mudanças na Medida Provisória 2.166, que estabelece o limite, classificada por ele como "draconiana". Para Maggi, muitas propriedades antigas, de mais de 20 ou 30 anos, entraram na ilegalidade de um dia para outro.
A mudança no discurso de Maggi engloba até um freio na necessidade de ampliar terras para agricultura e pecuária. "Hoje, a saída é a verticalização da produção. No caso da pecuária, para que novas terras não sejam abertas, deve ser usado o confinamento, por exemplo, que é algo moderno."
Piscicultura
Na cartilha do governador, o termo desenvolvimento sustentável é muito mais centrado na primeira palavra ainda do que na segunda. "Não tem jeito, as pessoas querem produzir mais. Elas querem crescer com suas atividades. Mas a simples abertura de áreas acho que não é mais necessária."
O mesmo raciocínio foi usado para defender o presidente Lula, que disse que os "bagres" é que estão atrapalhando o desenvolvimento do Brasil.
"O presidente tem razão. O que falta talvez nas pessoas é um pouco de boa vontade e entender que aquilo [a hidrelétrica] é uma necessidade para a nação. E os bagres? O Brasil tem tecnologia para cultivar aquilo em cativeiro. Ninguém está preocupado com o bagre de verdade. Ele é usado apenas para acabar colocando areia no negócio", afirmou.
Apesar de ser bem-vindo, o novo discurso verde de Maggi ainda precisa ser demonstrado na prática, segundo o ambientalista Sérgio Guimarães, do IVC (Instituto Centro de Vida), ONG sediada em Cuiabá.
"O movimento que nós estamos vendo [o de Maggi] é interessante. Mas claro que ainda precisamos ver ações mais concretas em termos de gestão ambiental para realmente acreditarmos no discurso dele", explicou Guimarães.
Na semana passada, Maggi, chamou várias ONGs para conversar e ver em quais projetos já desenvolvidos por elas o Estado poderia ajudar ou vice-versa. Usinas de álcool e soja, por exemplo, serão fiscalizadas pelos ambientalistas, sob a meta de que nada seja colhido em 2008 em APP (área de preservação permanente).
Os ambientalistas admitem que a gestão ambiental em Mato Grosso melhorou. O SLAPR, sistema pioneiro que permitia fiscalizar o desmatamento por satélite e que foi desmontado no primeiro mandato de Maggi, agora está na internet.
Estudo feito pela ONG Imazon também mostrou avanços. O desmatamento de dezembro de 2006 no Estado foi 78% menor do que o registrado no mesmo mês em 2005. A pesquisa, entretanto, escancarou um dos maiores problemas em Mato Grosso hoje, como o próprio governador admite.
"O desmatamento ilegal [90% do registrado entre novembro e dezembro de 2006] é um desafio". E os maiores vilões, segundo o governador, são os assentados. "Eles respondem por quase 70% do desmatamento", calcula Maggi, que que ainda tem mais uma surpresa. "Depois que acabar o meu mandato quero ir para casa. A política é muito sofrida."
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