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Cultura
Quarta - 17 de Janeiro de 2007 às 07:05
Por: Ubiratan Brasil

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A história já se tornou clássica - em uma fazenda localizada na Inglaterra (mas que simbolizava a então União Soviética), um porco premiado chamado Major convence os outros animais de que é preciso declarar guerra aos seres humanos, expulsá-los da comunidade e assumir a administração. Começa uma luta pelo poder. Eis o ponto de partida de A Revolução dos Bichos, um dos grandes momentos da carreira de George Orwell (1903-1950) que a Companhia das Letras lançou recentemente (152 páginas, R$ 22), continuando a publicação da obra do escritor.

Escrita em plena 2ª Guerra Mundial e publicada em 1945 depois de ter sido recusada por várias editoras, a pequena narrativa causou um verdadeiro furor por satirizar ferozmente a ditadura stalinista justamente durante um momento em que os soviéticos ainda eram aliados das forças ocidentais na luta contra os nazi-fascistas. Afinal, na história, os animais se revoltam contra o sr. Jones, que representa o czar Nicolau 2º, e o porco Major não seria Lenin, mas Karl Marx, teórico da revolução que só será deflagrada depois de sua morte por outros dois suínos, o banido Bola-de-Neve e o despótico Napoleão, representando Trotsky e Stalin, respectivamente.

Quando foi publicado no Reino Unido (nos Estados Unidos, o livro chegou em 1946), A Revolução dos Bichos ajudou a abrir os olhos do Ocidente sobre a real natureza do sistema soviético. Curiosamente, a obra foi publicada em agosto de 1945, mesmo período em que os Estados Unidos explodiram as bombas atômicas no Japão, encerrando a guerra e mandando um aviso aos soviéticos, iniciando a chamada guerra fria.

O lançamento da bomba sobre Hiroshima e Nagasaki iniciava o paroxismo da política de poder. O livro de Orwell era a mobilização do gênio criador para denunciar um dos principais elementos dessa política, o Estado totalitário. Se inicialmente serviu como instrumento a serviço das forças capitalistas, A Revolução dos Bichos conseguiu, com o passar do tempo, provar que seu alvo era mais amplo e direcionado contra o totalitarismo.

As qualidades da prosa também se sobressaem - Orwell esforçou-se muito para melhorar sua escrita e, neste livro, ele escreve com desenvoltura sobre assuntos que dominava. Apaixonado pelo campo inglês, onde viveu no fim dos anos 1930, Orwell faz com que isso ecoe logo nas primeiras páginas: transbordam ali detalhes físicos da rotina no campo, observados com amor. Ao mesmo tempo, ele utiliza os discursos dos porcos para ironizar o discurso comunista. Eis, aí, a habilidade das palavras de Orwell, que tanto ordenham uma vaca como beliscam um revisionista.

Com o tempo, algumas frases tornaram-se clássicas, como "Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que os outros", confirmando sua vitalidade. Hoje, depois das diversas e profundas transformações políticas que alteraram o planeta, o livro de Orwell já pode ser lido sem o viés ideológico reducionista e interpretado como uma alegoria sobre as fraquezas humanas que levam à corrosão dos grandes projetos de revolução política.

O livro chegou ao cinema em duas adaptações: uma animação de 1954, de John Halas e Joy Batchelor, e uma versão de 1999, dirigida por John Stephenson. Nenhuma, porém, atingiu seu nível de libelo pela liberdade.




Fonte: A Gazeta

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