No trabalho, Mantega faz campanha para Lula
O discurso eleitoral foi mais surpreendente ainda porque ocorreu quase simultaneamente à decisão do governo de estudar a licença de ministros para ajudar na campanha do segundo turno. Faltou ao ministro da Fazenda o cuidado que o governo teve ao separar as equipes de governo e de campanha.
A repercussão foi imediata. Eduardo Alckmin, advogado e primo do candidato Geraldo Alckmin, disse que estuda a possibilidade de questionar na Justiça Eleitoral o comportamento de Mantega, passível de ser qualificado como uso da máquina pública. Em seguida, a Fazenda distribuiu nota em que explica apenas que Mantega não convocara entrevista coletiva para dar as declarações, mas a nota não faz nenhuma consideração sobre o conteúdo das declarações do ministro.
Reformas Entre as críticas a Alckmin, disse Mantega: ´Uma hora eu vejo que ele (Alckmin) vai fazer um ajuste fiscal rígido. Aí, eu me pergunto: ele vai cortar o quê? Os programas sociais?´ Segundo o ministro, o tucano também vem prometendo fazer mais reformas, mas não explicitou quais. ´Até agora, eu não vi o programa econômico do candidato Alckmin´, disse. ´Por enquanto, quem fez as reformas foi o governo Lula, que continua encaminhando novas reformas.´
Entre as ´novas reformas´, ainda no contexto comparativo entre os dois candidatos, Mantega anunciou a aplicação de um redutor nos gastos públicos. Não se trata de um corte, mas de uma fórmula que fará com que as despesas aumentem numa velocidade menor do que a do crescimento da economia, ao contrário do que ocorre hoje. É a mesma proposta que, no ano passado, foi chamada de ´rudimentar´ pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Em entrevista ao Estado, no domingo, Mantega disse que esse programa de ajuste fiscal agora é consenso no governo e o presidente Lula já concordou em implementá-lo. Gastando menos, será possível fazer um programa de cortes na carga tributária e também trabalhar para reduzir o custo em infra-estrutura. Ontem, o ministro acenou com cortes de impostos sobre os bens de capital (máquinas pesadas). Por outro lado, afirmou Mantega, Lula não fará a reforma da Previdência em um eventual segundo mandato.
Números O ministro fez esses comentários numa rápida entrevista na portaria do Ministério da Fazenda, na qual informou que em breve serão divulgados números mostrando que a indústria voltou a crescer em agosto.
Questionado sobre por que, na sua avaliação, o mercado financeiro teria se animado com a realização do segundo turno, Mantega, ainda embalado pelo clima eleitoral, respondeu: ´Talvez o mercado goste mais do Alckmin, mas a população gosta do Lula.´
Ele rechaçou a avaliação de que estaria praticando terrorismo eleitoral ao cobrar o programa de Alckmin. ´Me acusar de terrorismo eleitoral considero uma piada de ressaca eleitoral. Eu estou apenas querendo saber qual é o programa que o outro candidato tem.´
Depois de se reunir por três horas com seus assessores para avaliar o resultado das votações do último domingo, Mantega afirmou que as condições de governabilidade de um eventual segundo mandato de Lula melhoraram. ´Os principais partidos oposicionistas perderam deputados na Câmara. No Senado, a situação não se alterou, nos governos estaduais a situação também melhorou. Então, isso é um sinal de que haverá maior governabilidade no próximo governo´, afirmou.
Os números do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), porém, mostram o contrário. As bancadas de PFL e PSDB na Câmara cresceram dos atuais 123 deputados para 130, enquanto a base do governo na Casa, sem considerar o PMDB, caiu dos atuais 257 parlamentares para 223. No Senado, a situação também piorou, pois o PFL passou a ser a maior bancada da Casa, com 18 senadores, e pode ter a chance de eleger o presidente do Congresso, já que a bancada do PMDB, que nem sempre vota com o governo, caiu de 20 para 15 senadores.
Ação do ministro preocupa mercado Profissionais do mercado financeiro criticaram a atitude do ministro Guido Mantega, que deu entrevista para falar da disputa do segundo turno da eleição presidencial. Os especialistas acreditam que a iniciativa de Mantega foi dirigida e coloca em xeque a credibilidade da pasta mais importante do governo.
Agentes do mercado financeiro, que preferiram não se identificar, entenderam a ação de Mantega como uma amostra do que será a campanha de Lula nesta fase da eleição. Os críticos viram dois pontos negativos na iniciativa de Mantega. Em primeiro lugar, avaliaram que o presidente Lula estaria disposto a ´usar de todos os artifícios para vencer a eleição´. E consideram que o ministro demonstrou fraqueza ao não rejeitar um papel que colocaria a credibilidade da Fazenda e de seu titular em jogo.
´Isso é algo que pediram para ele fazer, e ele fez. Ao que parece, é uma pessoa que não tem condição de dizer não, o que é muito ruim no caso de alguém que ocupa a pasta mais importante da Esplanada dos Ministérios´, afirmou representante de associação que reúne bancos.
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