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Politica Brasil
Quinta - 06 de Abril de 2006 às 09:34
Por: Wilson Lemos

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Naquela manhã de 1o de abril, sem dispor de informações mais precisas sobre o que estava acontecendo, nos reunimos em um local próximo ao Campo do Ourique para discutir os fatos e em seguida nos dirigimos à sede do partido, onde permanecemos em vigília até altas horas da noite, acompanhando pelo rádio o desenrolar dos acontecimentos. O clima então reinante era de tensa expectativa. Àquela altura, as informações que chegavam não nos permitiam ir além de conjecturas quanto ao desfecho do golpe em curso. Sabíamos apenas que era contra o governo e que as tropas legalistas já estavam prontas para interceptar e dar combate aos sublevados de Mourão Filho que avançavam rumo ao Rio de Janeiro.

Apesar da natural apreensão, muitos acreditavam na capacidade do governo para restabelecer a normalidade e garantir a ordem constitucional ameaçada. Que Jango contava com o respaldo da maioria das forças armadas; que o III Exército no Rio Grande do Sul estava a postos e em Pernambuco Miguel Arrais contava com 50 mil camponeses em armas. Falava-se que em Goiás o governador Mauro Borges organizava a resistência, que o nosso Dr. Lima, ex-presidente da Fundação Brasil Central e então na Superintendência da SPVEA, estava arregimentando milhares de trabalhadores daquela fundação para combater os golpistas.

Tais notícias, mesmo sem dados concretos que comprovassem a veracidade dos fatos, serviam para entusiasmar os mais afoitos. Houve quem sugerisse que na manhã seguinte saíssemos às ruas em passeata de apoio ao governo, se mobilizasse o pessoal dos “Grupos de Onze” de Brizola, se promovesse o alistamento de voluntários e iniciássemos aqui a resistência. Ao contrário do que fizeram os participantes daquela tal Assembléia dos Ratos, conforme relatado em um livro escolar de nossa infância, todos nós estávamos dispostos a pendurar o guizo no pescoço do gato. Até mesmo eu e Bezerra tivemos nosso momento de patriotada.

Naquela noite ou na seguinte, não recordo ao certo, fomos até à sede da SPVEA, ali na Pedro Celestino com a Praça Alencastro, e conversamos com Jair Cuiabano, então diretor daquele órgão em Cuiabá, solicitando-lhe que nos pusesse em contato com o superintendente, nosso amigo doutor Lima. Queríamos veículos e combustível, pois pretendíamos nos dirigir à zona rural com o propósito de arregimentar os camponeses contra o golpe. Jair, desnecessário seria salientar, logo nos fez ver a impossibilidade de atender tal pedido. A tentativa de nos tornar guerrilheiros foi um fracasso.

Continuamos indo à sede do diretório do PTB para nos inteirar dos acontecimentos. Já de ânimo arrefecido, aguardávamos com visível apreensão o desfecho da crise. A espera não foi longa. A resistência do governo à quartelada não acontecera. O esquema defensivo do general Assis Brasil não funcionara, nos pampas o III Exército não se mexera e em São Paulo houve o recuo do general Kruel que se juntara a Adhemar de Barros. O anunciado confronto entre as tropas do governo e as forças golpistas não acontecera. Fora apenas mais uma Batalha de Itararé – aquela que não houve. O golpe vencera e a queda de Jango era um fato consumado.

A caça às bruxas, em Cuiabá, começou logo nos primeiros dias provocando medo e sobressaltos.Os “dedos duros” trabalhavam sem descanso e os boatos corriam soltos dando notícia da prisão de algum conhecido. Os alvos preferidos dos “revolucionários” eram os “subversivos” do PTB.Alguns companheiros deixavam a cidade, outros permaneciam em suas casas evitando encontros e sumindo dos locais que habitualmente freqüentavam. O clima era de tensão, pois qualquer um militante político rotulado de comunista ou esquerdista, era logo apontado como subversivo e poderia ser preso a qualquer momento.

Cuiabá, assustada, silenciava sob o tacão da ditadura.

(Wilson Lemos: E-mail: wfelemos@terra.com.br)




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