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Festival de Teatro de Curitiba enfrenta problemas
CURITIBA - Um manifesto assinado por 17 jornalistas de diferentes cidades - Belo Horizonte, São Paulo e Recife, entre elas - foi entregue ao diretor do Festival de Teatro de Curitiba. Durante 11 dias, mais de 200 espetáculos passaram por 45 palcos da cidade, 18 deles na mostra oficial, que nesta 15.ª edição manteve uma média de qualidade bastante alta e terminou anteontem.
O Fringe, a mostra paralela, alvo do manifesto, mostrou os problemas de sempre. O principal deles, espetáculos toscos demais para integrarem um festival, mesmo numa mostra periférica. Não há curadoria no Fringe e não é a primeira vez que a necessidade de seleção é apontada à organização do evento.
Victor Aronis, diretor do FTC, sempre argumenta que uma curadoria pode tirar o caráter ´democrático´ do evento. "Há espetáculos que os críticos não gostam, mas o público, sim." Mas desta vez se mostrou disposto a buscar mecanismos de aprimoramento. "Receber esse manifesto é evidentemente motivo para reflexão", disse ao Estado. "Claro que eu quero melhorar a programação do festival, resta saber de que maneira. Vamos pensar ao longo do ano."
Na verdade, há uma aposta da quantidade: "É o maior festival da América Latina", foi a frase predileta nos discursos de abertura. Só no primeiro dia do evento, nada menos do que 50 peças entraram em cartaz na cidade, média diária durante todo o evento, o que dilui público e acarreta os mais diversos problemas técnicos, de atrasos à queda de qualidade artística: intérpretes desconcentrados, iluminação mal afinada, cenografia mal adaptada.
A sugestão dos jornalistas, que se colocaram à disposição para refletir sobre mecanismos de seleção, é antes de mais nada que o festival deixe de apostar na quantidade, uma vez que isso claramente está sendo feito em detrimento da qualidade. Uma das sugestões é que sejam consultados críticos, jornalistas da área cultural, programadores de teatro ou acadêmicos especializados para obter informações - e não necessariamente indicações - sobre os espetáculos inscritos.
A diversidade geográfica foi outro aspecto abordado na reunião dos jornalistas. A presença de apenas um grupo do Nordeste e um do Norte, certamente se deve aos custos de deslocamento, algo que poderia ser contornado com o apoio das prefeituras locais, o que poderia ser estimulado pela organização do FTC.
Verdade seja dita, algumas tentativas de aperfeiçoamento têm sido feitas. Entre elas, a criação de um Diário, com distribuição gratuita, trazendo informações sobre as peças. Embora ajude, não evita ciladas, uma vez que a maior parte das informações ali publicadas - assim como as que decidem a participação dos grupos no Fringe - é colhida no material de divulgação e belos textos teóricos nem sempre correspondem a boas criações. "Papel aceita tudo", comenta Victor.
Coincidência ou não, houve uma troca de nomes na curadoria da mostra oficial, que nesta 15.ª edição premiou os espectadores com bons espetáculos. Na reta final, destacou-se a interpretação difícil de ser alcançada de Guida Viana no solo A Mulher Desiludida, texto de Simone de Beauvoir, direção de Gilberto Gawronski. Sua personagem fala compulsivamente - e Guida consegue fazer isso sem eliminar nuances - de si mesma, de seus familiares, de ex-maridos e filhos. É noite de passagem de ano, ela está só, enquanto a humanidade festeja.
Aos poucos, por mais que essa ´mulher desiludida´ culpe a todos por sua solidão, o espectador vai percebendo o ser intolerável que ela é, um poço de neurose, uma mulher irascível, cuja neurose chega às raias do absurdo, e do risível. Na vida dela, é motivo de tragédia familiar. No palco, cenografia, iluminação, trilha incidental são elementos aparentemente muito simples, mas na medida certa para valorizar uma partitura vocal e emocional executada por uma atriz tão experiente quanto talentosa. O solo de Guida foi um entre outros bons momentos que o FTC proporcionou ao seu público.
Bem mais difícil foi a estréia de Amores Surdos, novo espetáculo da Cia. Espanca! de Belo Horizonte, que no ano passado havia se destacado no Fringe com o simples e comovente Por Elise. Antes de mais nada, louve-se o grupo por não ter tentado, em nenhum momento, transformar em fórmula o sucesso anterior, não temendo decepcionar expectativas. Talvez por excesso de zelo nesse sentido, acabaram por errar no extremo oposto: esfriaram a cena numa montagem cerebral em excesso, com ênfase no distanciamento criado pela metalinguagem: "Por que eles estão olhando para a gente? Por que só nós falamos e eles não?", pergunta um personagem olhando para a platéia. No palco, vislumbramos - a penumbra domina a cena - uma família na qual o afeto é distribuído de forma desigual e até a extrema crueldade parece inocente e passa despercebida na rotina do lar. Tendo estreado no festival, Amores Surdos certamente será aprimorado antes da temporada em BH. É torcer para que o mesmo aconteça com a 16.ª edição do Festival de Teatro de Curitiba.
O Fringe, a mostra paralela, alvo do manifesto, mostrou os problemas de sempre. O principal deles, espetáculos toscos demais para integrarem um festival, mesmo numa mostra periférica. Não há curadoria no Fringe e não é a primeira vez que a necessidade de seleção é apontada à organização do evento.
Victor Aronis, diretor do FTC, sempre argumenta que uma curadoria pode tirar o caráter ´democrático´ do evento. "Há espetáculos que os críticos não gostam, mas o público, sim." Mas desta vez se mostrou disposto a buscar mecanismos de aprimoramento. "Receber esse manifesto é evidentemente motivo para reflexão", disse ao Estado. "Claro que eu quero melhorar a programação do festival, resta saber de que maneira. Vamos pensar ao longo do ano."
Na verdade, há uma aposta da quantidade: "É o maior festival da América Latina", foi a frase predileta nos discursos de abertura. Só no primeiro dia do evento, nada menos do que 50 peças entraram em cartaz na cidade, média diária durante todo o evento, o que dilui público e acarreta os mais diversos problemas técnicos, de atrasos à queda de qualidade artística: intérpretes desconcentrados, iluminação mal afinada, cenografia mal adaptada.
A sugestão dos jornalistas, que se colocaram à disposição para refletir sobre mecanismos de seleção, é antes de mais nada que o festival deixe de apostar na quantidade, uma vez que isso claramente está sendo feito em detrimento da qualidade. Uma das sugestões é que sejam consultados críticos, jornalistas da área cultural, programadores de teatro ou acadêmicos especializados para obter informações - e não necessariamente indicações - sobre os espetáculos inscritos.
A diversidade geográfica foi outro aspecto abordado na reunião dos jornalistas. A presença de apenas um grupo do Nordeste e um do Norte, certamente se deve aos custos de deslocamento, algo que poderia ser contornado com o apoio das prefeituras locais, o que poderia ser estimulado pela organização do FTC.
Verdade seja dita, algumas tentativas de aperfeiçoamento têm sido feitas. Entre elas, a criação de um Diário, com distribuição gratuita, trazendo informações sobre as peças. Embora ajude, não evita ciladas, uma vez que a maior parte das informações ali publicadas - assim como as que decidem a participação dos grupos no Fringe - é colhida no material de divulgação e belos textos teóricos nem sempre correspondem a boas criações. "Papel aceita tudo", comenta Victor.
Coincidência ou não, houve uma troca de nomes na curadoria da mostra oficial, que nesta 15.ª edição premiou os espectadores com bons espetáculos. Na reta final, destacou-se a interpretação difícil de ser alcançada de Guida Viana no solo A Mulher Desiludida, texto de Simone de Beauvoir, direção de Gilberto Gawronski. Sua personagem fala compulsivamente - e Guida consegue fazer isso sem eliminar nuances - de si mesma, de seus familiares, de ex-maridos e filhos. É noite de passagem de ano, ela está só, enquanto a humanidade festeja.
Aos poucos, por mais que essa ´mulher desiludida´ culpe a todos por sua solidão, o espectador vai percebendo o ser intolerável que ela é, um poço de neurose, uma mulher irascível, cuja neurose chega às raias do absurdo, e do risível. Na vida dela, é motivo de tragédia familiar. No palco, cenografia, iluminação, trilha incidental são elementos aparentemente muito simples, mas na medida certa para valorizar uma partitura vocal e emocional executada por uma atriz tão experiente quanto talentosa. O solo de Guida foi um entre outros bons momentos que o FTC proporcionou ao seu público.
Bem mais difícil foi a estréia de Amores Surdos, novo espetáculo da Cia. Espanca! de Belo Horizonte, que no ano passado havia se destacado no Fringe com o simples e comovente Por Elise. Antes de mais nada, louve-se o grupo por não ter tentado, em nenhum momento, transformar em fórmula o sucesso anterior, não temendo decepcionar expectativas. Talvez por excesso de zelo nesse sentido, acabaram por errar no extremo oposto: esfriaram a cena numa montagem cerebral em excesso, com ênfase no distanciamento criado pela metalinguagem: "Por que eles estão olhando para a gente? Por que só nós falamos e eles não?", pergunta um personagem olhando para a platéia. No palco, vislumbramos - a penumbra domina a cena - uma família na qual o afeto é distribuído de forma desigual e até a extrema crueldade parece inocente e passa despercebida na rotina do lar. Tendo estreado no festival, Amores Surdos certamente será aprimorado antes da temporada em BH. É torcer para que o mesmo aconteça com a 16.ª edição do Festival de Teatro de Curitiba.
Fonte:
Agência Estado
URL Fonte: https://reporternews.com.br/noticia/309387/visualizar/
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