Novo líder boliviano desafia a política norte-americana
Mas Morales dá sinais de que poderá ser um líder pragmático e os Estados Unidos deveriam evitar confrontos, dizem analistas. "É importante reconhecer que ele claramente tem um mandato do povo boliviano. As pessoas sabiam em quem estavam votando", afirmou o analista Jess Vogt, do Washington Office on Latin America, em uma entrevista por telefone da Bolívia.
A vitória eleitoral de Morales é a mais recente conquista da esquerda latino-americana, em uma região em que as pessoas se tornam cada vez mais desiludidas com as políticas econômicas de livre mercado, que fizeram pouco para melhorar a vida dos mais pobres.
O sentimento antiamericano está aumentando, como fica evidente nas pichações dos muros de cidades como São Paulo ou nos protestos de rua que recepcionaram o presidente dos EUA, George W. Bush, quando ele foi a uma cúpula na Argentina, no mês passado.
A tendência ajudou líderes como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que segue uma política econômica conservadora e tem uma relação de respeito com Washington, e seu colega venezuelano Hugo Chávez, envolvido em uma disputa com autoridades do governo Bush enquanto tenta conter a influência dos EUA e espalhar a sua própria revolução social.
Quem Morales vai seguir? Seus elogios a Chávez alarmaram o governo Bush, que teme um bloco de esquerda ao redor do presidente venezuelano e do presidente cubano, Fidel Castro.
Morales se opõe a Washington em duas áreas importantes da sua política latino-americana: a criação de uma zona de livre comércio unindo as Américas e a guerra contra as drogas.
Ele prometeu reduzir um programa de erradicação de coca patrocinado pelos EUA. A folha de coca é o principal ingrediente da cocaína, mas também é usado pelos índios na medicina tradicional. A Bolívia é o terceiro maior produtor de cocaína, depois da Colômbia e do Peru.
Morales também prometeu nacionalizar a indústria de gás natural -- a Bolívia tem as segundas maiores reservas do produto na América do Sul -- e usar a riqueza para ajudar os pobres.
Mesmo assim, Larry Birns, do Council on Hemispheric Affairs, em Washington, disse: "Não acho que haverá um confronto de cara, porque Morales é um homem prático."
Na véspera da eleição, Morales disse esperar uma relação apropriada com os Estados Unidos. Na segunda-feira, ele afirmou que os direitos das empresas estrangeiras com relação ao gás boliviano acabariam, mas que a Bolívia ainda queria trabalhar em conjunto com elas.
"Morales não está exigindo desapropriações. Eles não são bobos. Eles estão assumindo uma postura pragmática", observou Vogt.
O modo de os EUA lidarem com a Bolívia pode mostrar como o país vai reagir a uma onda de eleições na região no próximo ano, que pode levar mais líderes de esquerda ao poder.
"Há uma onda de mudança na América Latina e os Estados Unidos precisam deixar de lado o paradigma da Guerra Fria. As políticas que eles vêm adotando há décadas simplesmente não funcionam mais", disse Vogt.
Comentários