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Cultura
Terça - 29 de Novembro de 2005 às 11:59
Por: ANDRÉIA FONTES

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Mato Grosso se prepara para mais um Festival do Rasqueado e, desta vez, músicos e compositores comemoram mais um passo de extrema importância para valorização do ritmo. A pouco mais de um mês, foi criada pela Assembléia Legislativa a Lei 8.203, que declara o rasqueado como ritmo musical símbolo de Mato Grosso. De autoria do presidente da Assembléia, deputado José Riva (PTB), a lei, segundo ele, foi pensada como um instrumento para conscientização cultural. Riva lembra que em julho deste ano, por meio de um convite seu, esteve em Cuiabá o adido Cultural do Brasil nos Estados Unidos e diretor do Instituto Brasileiro de Cultura em Washington, o professor José Neistein, que definiu a música de raiz cuiabana como “um fenômeno artístico e cultural”.

Neinstein afirmou à época que o rasqueado catalisa todas as classes sociais e é aí que constitui seu ponto forte. Em visita à Rua do Rasqueado, o professor enfatizou que o rasqueado é uma forma de expressão urbana que se alimenta de formas ancestrais, de músicas rurais e que atingiu um ponto de cristalização muito forte e, da maneira como existe, é resultado da conjugação de muitas etnias. Comparando-o ao forro do nordeste.

O professor se encantou com o ritmo que, segundo ele, se apresenta como “expressão legítima mato-grossense”, que tem estimulado o aparecimento de jovens compositores, assim como de conjuntos instrumentais e de cantores. “Expressa paixão, alegria, vitalidade, lirismo. Provavelmente, é a forma musical mais complexa”, definiu.

“Nossa música é belíssima e precisa de muito incentivo, para que continue por outras gerações”, ressalta Riva, lembrando que o rasqueado surgiu em 1870com a viola-de-cocho e o violão paraguaio.

Para o cantor e compositor Milton Pereira Pinho, o Guapo, a nova lei é um dos passos mais importantes para os músicos cuiabanos que lêem partidura. “Recentemente, na inauguração do Palácio da Instrução, tocaram música Americana e do Caribe. Esperamos que esta Lei traga um pouco mais de consciência cultural, valorizando nossa cultura, nossos cantores e compositores”, ressalta.

Guapo é organizador da Rua do Rasqueado. O evento foi realizado toda quinta-feira, na Praça Caetano Albuquerque, do dia sete de abril a 28 de outubro. Com o objetivo de continuar reunindo as famílias e amigos para dançar e cantar junto com diversas bandas e cantores, Guapo já está com projeto de retornar com a Rua do Rasqueado em sete de abril próximo.

Em um balanço das atividades, Guapo lembra que foram 30 eventos em sete meses, gerando 53 empregos diretos e muitos indiretos. “O público ia desde criança, turistas, até artistas e autoridades de vários municípios, oscilando entre 800 a mil pessoas por evento”.

Nestes sete meses, o projeto trabalhou na projeção das velhas composições dos grandes mestres, como mestre Ignácio, Albertino, Luiz Cândido, Luiz Marinho, José Agnelo, Tote Garcia Honotio Simaringo, entre outros. E também na nova geração, como João Eloy, Pescuma, Roberto Lucialdo, Gilmar Fonseca.

A HISTÓRIA DO RASQUEADO

No ano de 1870 acaba a Guerra do Paraguai e, na região de Várzea Grande, onde estavam confinados os refugiados da guerra e os prisioneiros da retomada de Corumbá, começaram a se integrar junto com os ribeirinhos mato-grossenses para o convívio do dia-a-dia. Nessa interação de simbioses práticas, a viola-de-cocho e o violão paraguaio começaram a tocar uma nova música e, assim, nasceu o Rasqueado (mistura de siriri mato-grossense e polca paraguaia). O novo ritmo surgiu para a exaltação da volta à vida e para sepultar as lágrimas do grande conflito que determinou o rumo da história latino-americana.

Por ser uma música de origem humilde, ficou discriminada até a proclamação da República, quando se começou a se perceber o seu jeito contagiante e envolvente, já chamando, na época, de “limpa banco” e começaram a toma-la emprestado para eleição e festas de santos, como, aliás, é feito até hoje. O rasqueado ganhou dianteira, pois envolveu os músicos e a elite governamental ao mesmo tempo. Assim, a música começou a aparecer nos “tchá-co-bolo” dos saraus, ao lado de Beethoven, Mozart, Chopin e outros.

Na década de vinte do século passado, o negro Mestre Ignácio, do Bairro Baú, começa a executar o Rasqueado na sua banda marcial própria, ao lado do Jazz, Blues, Chorinho, Valsa, Maxixe, Fox-trote e outras expressões em voga na época.

Dunga Rodrigues e Zulmira Canavarros começam a desenvolver o Rasqueado no piano solo.

A música começa a receber influência forte da música brasileira da capital do Rio de Janeiro, e os trovadores de verso vão dando lugar ao solista das orquestras típicas. O Rasqueado toma a sua forma de música instrumental e o naipe sax, trombone e trompete, torna-se instrumento padrão de banda de Rasqueado, assim como acontecia com o chorinho, samba, dobrado, etc, que ficaram marcados com tais instrumentos.

Uma outra modalidade de Rasqueado desenvolve também na Baixada Cuiabana, apoiado na sanfona de quatro e oito baixos, conhecido como “pé-de-bode”, e, por ter desenvoltura nos seus teclados (chamado ponto) para outras escalas, o Rasqueado aproxima mais da Polca Paraguaia e do Chamame, criando o estilo chamado “Rasqueado da Fronteira”. Mais tarde o músico paulista Mário Zan (compositor da música “Chalana” e “Siriema”) foi beber nessa fonte, assim como o paulista-cuiabano Nardinho, considerado o maior acordeonista do Rasqueado de Fronteira, criou várias composições nesse estilo.

O conjunto serenata composto por Tote Garcia, Chilo Gigo, Odare Vaz Curvo, Nilson Constantino e Namy Ourives, percebe que o que eles tocavam estava longe do Siriri e da Polca Paraguaia e gravaram o único disco de Rasqueado do grupo, com o nome de Rasqueado Cuiabano.

O rasqueado, ao longo dos seus 130 anos de vida, aglutinou, harmonizou, envolveu, fundiu, revolucionou, uniu – no passado – ex-prisioneiros, ribeirinhos e refugiados e, em seguida a elite e a camada pobre da população, bem como uniu as músicas do Rio de Janeiro e da Europa. Hoje está envolvendo os novos mato-grossenses e os migrantes. Por ser uma música e uma dança contagiantes, frutos da América espanhola e portuguesa, criada para a exaltação da vida, ela traz no seu bojo toda alegria e êxtase de uma população que busca autodeterminação no espaço da música brasileira e ao mesmo tempo como símbolo da união dos povos latino-americanos, devido ao seu caráter platino-brasileiro e também à sua origem peculiar no ponto geodésico da América do Sul.





Fonte: Assessoria de Imprensa

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