Repórter News - reporternews.com.br
Cultura
Quarta - 23 de Novembro de 2005 às 13:23

    Imprimir


O fotógrafo Araquém Alcântara passou 30 anos de sua vida evocando a beleza da criação, da natureza, dos ciclos da vida. Ao lançar "Amazônia", seu 21º livro, amanhã no Museu da Casa Brasileira, com a exposição "Bichos do Brasil", seu olhar para o belo passou a integrar também a insensatez, a ganância e a intolerância do ser humano diante da maior floresta tropical do planeta.

Num momento em que bancos de areia tomam o lugar dos rios amazônicos, apontando para um futuro estéril, em que um ambientalista ateia fogo sobre o próprio corpo e morre em protesto contra a instalação de usinas de álcool em pleno Pantanal, e quando se constata que entre 2003 e 2004 foram derrubados 26.140 km2 de mata na Amazônia, o equivalente a 17 vezes o tamanho do Estado de São Paulo, percebemos a urgência da questão e o motivo que leva um artista a alterar o tom de seu trabalho.

Tido como um dos maiores documentaristas ligado à defesa do ambiente no Brasil, Alcântara, 54, se diz indignado: "Deixei de ser complacente com o ser humano. Sempre me pautei pela máxima proustiana de que "a beleza é a verdade", mas agora não dá mais. Estamos perdendo a guerra e só vemos passividade nas ações governamentais e na sociedade como um todo", diz.

O livro contou com a colaboração de oito especialistas, que escreveram textos sobre os problemas enfrentados pela floresta, como o professor Aziz Ab'Sáber, o médico e colunista da Folha Drauzio Varella, entre outros.

Um uacari-branco, primata encontrado na reserva de Mamirauá, no Amazonas, de pelagem branca e rosto avermelhado, é a imagem da capa de "Amazônia". A incrível cor de seu rosto soa como o reflexo da floresta em chamas, assim como na foto da contracapa, em que um pequena índia zo'é tem o corpo tingido da mesma cor pelo urucum.

As inusitadas formações rochosas da Cidade dos Deuses, em Alenquer, no Pará, convivem com árvores igualmente intrigantes na forma como a arabá e o pau-mulato. Ao percorrer cerca de 100 mil km da Amazônia Legal a barco, de avião, de carro e a pé, encontrou os últimos sete representantes da tribo dos índios akunt'su. Como não podem se reproduzir por causa do parentesco, estão fadados a desaparecerem por completo. Um símbolo assustador.

Após mostrar os amazônidas em várias situações, desde a pesca feita de variadas formas até celebrações como o bumba-meu-boi, uma imagem aérea de troncos de árvores boiando no rio Negro pontua o início das imagens que narram a destruição da floresta. Caminhões que transportam ilegalmente toras de árvores imensas, madeireiras e carvoarias que se multiplicam rapidamente gerando microcidades sem infra-estrutura e o fogo, muito fogo, que faz a mata arder para dar lugar ao pasto e à plantação de soja.

O fogo que cria imagens ambíguas de extrema beleza plástica ao crepitar diante das lentes de Alcântara guarda em si a lógica irracional do homem contemporâneo. A imagem que encerra essa seqüência tem tudo para se tornar um ícone de campanhas ambientalistas no Brasil: um tamanduá-mirim, próximo à rodovia Cuiabá-Santarém, se levanta em sinal de defesa ao perceber a presença de Alcântara. Com os braços abertos feito um guardião e os pêlos chamuscados pelo fogo, parece fazer um último gesto em defesa da floresta. Valentia e impotência. A imagem da agonia.

Amazônia Autor: Araquém Alcântara Editora: Terrabrasil Quanto: R$ 230 (240 págs.)





Fonte: Folha Online

Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://reporternews.com.br/noticia/334081/visualizar/