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Cidades/Geral
Sábado - 07 de Maio de 2005 às 12:50
Por: Edilson Almeida

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Quando muitas famílias estiverem reunidas para o almoço tradicional para comemorar a data deste domingo, Amanda estará com Juliana nos braços. Durante o dia todo, seguirá uma rotina pouco diferente: dar banho na criança, amamentá-la, lavar suas poucas fraudas, enfim. Na prática, Amanda vai estar procurando exercer um papel que até há pouco tempo fazia parte apenas e tão somente de seu imaginário, de uma brincadeira comum entre as crianças do sexo feminino: a de ser mãe. Agora, porém, a boneca de plástico deu lugar a um ser vivo. Habitando em um barraco típico da pobreza latente na periferia de Cuiabá, a mãe de apenas 11 anos é fruto de uma sociedade doente e despreparada do ponto de vista social.

Mãe e filha de carne e osso agora são parte de mais uma estatística funesta do cenário de cores cinzentas do campo social de Mato Grosso: 2,1% de mulheres tiveram filhos pela primeira vez com idade entre 10 e 14 anos. Meninas-crianças que perderam a inocência na sua mais aguda forma, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), extraídos do Censo Demográfico de 2000. De acordo com os números, das pouco mais de 19,6 mil mães cujos primeiros filhos nasceram até um ano anteriores ao Censo, quase 500 estão na faixa em que podem ser chamadas de crianças. São mães precoces na acepção da palavra utilizada pela metodologia de pesquisa e que atingem em cheio a gente pobre dos bairros mais carentes.

Para quem possa imaginar que seja pouco, é bom deixar claro que esse índice não é nada inofensivo. E o que é pior: é crescente. No Censo de 91, o IBGE registrou um dado inferior de casos de mulheres que tiveram filhos pela primeira vez na faixa etária de 10 a 14 anos. Naquele ano, foram apenas 1,8%. Em números absolutos, 319 casos em todo Estado. Ou seja: em pouco menos de uma década, houve um crescimento superior a 30%. Mais: Mato Grosso é entre os estados do Centro-Oeste, incluindo o Distrito Federal, com o índice mais elevado de casos de maternidade na faixa de 10 e 14 anos. E Amanda é, com certeza, fruto desse crescimento estatístico, que pode ser interpretado como extremamente nocivo e negativo do ponto de vista humano.

Em verdade, o índice de meninas-crianças que são mães pela primeira vez salta no estudo sobre o perfil das mães que tiveram o primeiro filho. O trabalho do IBGE mostrou que 41,1% das mães pela primeira vez estão na faixa de idade entre 15 e 19 anos. Isto é: o do conjunto de mulheres com filhos pela primeira vez, o maior contingente é de adolescentes. Esse índice, a rigor, foi mantido comparado aos números de uma década atrás. Conclusão: o quadro de gravidez pela primeira vez segue bastante preocupante. “A idade média das mães por primeira vez posicionou-se em níveis extremamente baixos por causa da precocidade com que as mulheres brasileiras estão iniciando a formação de sua prole” – destaca o IBGE.

Traduzindo: é claro o rejuvenescimento da fecundidade em Mato Grosso, resultado do aumento do número de mães em idades muito jovens e da regulação dos nascimentos por parte das mulheres com idades a partir dos 30 ou 35 anos. De acordo com o levantamento do IBGE, as idades médias mais jovens foram observadas em Tocantins e Maranhão (23,2 anos) e em Rondônia e Mato Grosso (23,3 anos), ao passo que as mais tardias foram evidenciadas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina (25,5 anos).

Os números do IBGE mostram que Mato Grosso está entre os que estão no topo. A análise das curvas da fecundidade oferece alguns subsídios para inferir que os grupos populacionais mais vulneráveis em termos de educação, renda e trabalho tenderão a experimentar a maternidade mais precocemente. No estudo e na história de Amanda e Juliana, fica claro que o problema é, de fato, de políticas sociais, as quais deverão contemplar a inclusão desses segmentos mais vulneráveis no processo de desenvolvimento social, atendendo-os em suas necessidades, particularmente no tocante à informação sobre maternidade / paternidade responsável, à prática sexual segura e a seus direitos reprodutivos.

Do contrário, Amandas e Julianas, personagens fictícios desta história, vão continuar ganhando espaço e mais movimentos no palco da vida real. Até que um dia, a inocência não seja mais um requisito básico para que a humanidade e se transforme numa banalidade, como já é hoje a violência. As duas serviram apenas como ilustração de uma realidade que vai cruzando décadas sem alteração substancial.





Fonte: 24 Horas News

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