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Politica Brasil
Segunda - 07 de Março de 2005 às 19:31
Por: Clóvis Botelho

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A velocidade das descobertas científicas sobre o genoma humano e a sua utilização com fins terapêuticos está em descompasso com a lenta e gradual mudança dos preceitos éticos, morais e religiosos de nossa sociedade. Enquanto a ciência avança a passos largos, pela facilidade da troca de informações entre os pesquisadores e o estímulo crescente sobre o tema dos últimos anos, a questão ética fica ancorada nos princípios dogmáticos do início do século passado. Possivelmente, este confronto foi o principal responsável pela demora da aprovação, pela Câmara Federal, da utilização das células-tronco embrionárias humanas com a finalidade de pesquisa no Brasil.

Para entendermos melhor este assunto vamos recordar os principais conceitos envolvendo o tema. Sabemos que a clonagem de animais já é uma realidade, ela desvendou grandes mistérios da concepção e abriu novas perspectivas para a genética humana, como a possibilidade do uso terapêutico dessas novas descobertas, para diversos tipos de doenças. As chamadas células-tronco são capazes, quando em ambientes apropriados, em transformar-se (diferenciação celular) em qualquer tecido do corpo humano. É como se fosse uma fantástica "semente" de todas as nossas células que, em tese, poderia regenerar qualquer tecido doente do nosso organismo. Não parece coisa de cinema futurista? Pois é!!!

Nas primeiras experiências científicas foram utilizadas as células-tronco adultas (da medula, do cordão umbilical, etc), fato que culminou com o conhecido transplante de medula óssea do mundo, em 1968. A partir daí esta nova arma terapêutica tornou-se o tratamento de ponta das leucemias, tendo beneficiado milhares de doentes. Acontece que as células-tronco adultas têm pouco poder de diferenciação, tem menor flexibilidade, quando comparadas com as células-tronco embrionárias (descobertas mais recentes - 1998). Assim, os cientistas viram a necessidade de fazer mais pesquisas com as novas descobertas e imaginaram um futuro promissor para diversas doenças que até hoje ceifam a vida de milhares de cidadãos em todo o mundo. Só que não contaram com a visão um pouco míope e enviesada dos homens públicos que detêm o poder do financiamento das pesquisas.

Por que os nossos governantes têm medo da ciência? Justificam pela possibilidade do emprego destas descobertas com fins não aceitos pela nossa sociedade, tais como a clonagem humana. Acho justo esta preocupação, porém temos que olhar para o lado bom dos avanços científicos, valorizando-os; quanto ao uso indevido, devemos ter regras disciplinares e muito bom senso. Imaginem vocês, quantos prejuízos nós teríamos se as descobertas sobre a energia atômica ficassem sem a aprovação das autoridades pelo medo do seu uso em bombas destrutivas. Se os princípios da física e da mecânica não fossem aplicados na aviação... Se os estudos sobre inseminação artificial não progredissem (até o Santo Papa foi contra!!!)... Imaginem o quanto de atraso tecnológico ainda estaríamos vivendo se fôssemos olhar somente pelo lado destrutivo da ciência.

Voltando ao nosso assunto, sei que houve atraso no desenvolvimento da pesquisa genética por pura ignorância, calcada em preceitos arcaicos e sem olhar para o futuro da humanidade. Ressalto que este fato ocorreu em todos os lugares do planeta Terra, em pleno século 21. Não é incrível? Sei que com toda esta polêmica somente poucos países autorizaram e financiam as pesquisas com células-tronco embrionárias humanas, dentre estes podemos citar: Inglaterra, Canadá, Japão, Austrália e Israel. Com a recente aprovação na Câmara Federal o Brasil dá um enorme passo científico, entrando neste seleto grupo da vanguarda da pesquisa que mais avança na área da saúde. Apesar da demora de quase sete anos para esta aprovação, os nossos cientistas da genética humana, que pertencem à elite mundial desta fascinante área da ciência, darão conta do recado. Para nós, simples expectadores dos fatos, torceremos que muitos sejam os frutos destas futuras pesquisas. E que nunca tenhamos um governo como o do presidente Bush, que cortou qualquer financiamento público lá nos Estados Unidos.

Clovis Botelho, médico, é professor da UFMT.




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