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Nacional
Segunda - 28 de Fevereiro de 2005 às 08:20
Por: Spensy Pimentel

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Montevideo - A capital do Uruguai prepara-se para a festa de posse de Tabaré Vázquez, o homem que quebrou a hegemonia de um sistema bipartidário estabelecido logo após a independência do país, nos anos 1820. Em Montevideo vive cerca de metade dos 3,4 milhões de pessoas que habitam os 176 mil quilômetros quadrados do país – uma área menor que o estado do Paraná (199 mil km2).

Alternadamente, os dois partidos tradicionais, blancos e colorados, dominaram a presidência da República uruguaia desde que se iniciaram as eleições para o cargo, em 1918. O país ficou sem eleições presidenciais ntre 1934 e 1938, como conseqüência do golpe de Estado dado pelo presidente Gabriel Terra, e entre 1973 e 1985 durante a ditadura militar. O monopólio político chegava a tal ponto que o escritor uruguaio Eduardo Galeano chegou a afirmar: "Depois de tanto co-governar, blancos e colorados se haviam convertido em um partido único disfarçado em dois".

Vázquez elegeu-se pelo Frente Ampla, coalizão de partidos de esquerda fundada em 1971 e que, pleito após pleito, vinha apresentando resultados crescentes desde os anos 80. Para brecar a ascensão da esquerda, já se havia reformado a Constituição em 1996, instituindo um segundo turno depois que o mesmo Vázquez, então intendente de Montevideo, ficou a apenas dois pontos do vencedor colorado em 1994.

Em 1999, o colorado Jorge Battle precisou de um segundo turno para derrotar Vázquez, que lhe colocara sete pontos de vantagem na primeira rodada. No último 31 de outubro, Vázquez venceu em primeiro turno, com pouco mais de 50% dos votos válidos. O candidato apoiado por Battle (pronuncia-se baxe) teve pouco mais de 10% dos votos. A Frente Ampla também elegeu 16 dos 30 senadores e 52 dos 99 deputados, o que lhe dá maioria absoluta no Legislativo.

Os analistas locais lembram que a ascensão da Frente Ampla era um fenômeno verificado desde o fim da ditadura, mas a derrota de Battle reflete também um período conturbado. O país foi o vizinho mais afetado pela quebradeira argentina, no início da década (muitos argentinos tinham fundos em dólares depositados no país e sacaram esse dinheiro quando seu país entrou em crise). A desvalorização cambial no Brasil em 1999 também tirou mercado para as exportações.

O resultado do período para o Uruguai foi o crescimento vertiginoso da pobreza num país que cultivou no século 20 indicadores sociais em níveis europeus. Ainda hoje, a taxa de analfabetismo por aqui pouco passa dos 2% (no Brasil é de cerca de 15%), a expectativa de vida é de 74,6 anos (no Brasil, são 71,3 anos), a taxa de mortalidade infantil é de 14 por mil (Brasil, 33), e a população cresce a taxas semelhantes às da Suíça – embora pesem nas estatísticas o elevado número de emigrantes, cerca de 100 mil nos últimos anos, saindo do país em busca de oportunidades econômicas, já que a mão-de-obra é altamente qualificada (ao todo, calcula-se em 500 mil o número de uruguaios fora do país).

A preocupação na campanha eleitoral no ano passado era com o fato de que atualmente mais de um entre cinco uruguaios está abaixo da linha da pobreza (algo próximo a níveis brasileiros). Em entrevistas à imprensa, Vázquez chegou a falar em um a cada três uruguaios nessa situação, além de 100 mil em estado de miséria, ou mendicância. A taxa de desemprego ainda ultrapassa dois dígitos, embora já seja menor que os 20% alcançados no auge da crise. A economia uruguaia cresceu 2,5% em 2003, espera-se que tenha crescido 4% em 2004, e o PIB, hoje, é de cerca de US$ 11 bilhões – e a dívida com o Fundo Monetário Internacional tem valor semelhante.

A possibilidade de recuperação econômica pode se amparar em alguns instrumentos que não restaram disponíveis a outros governos latino-americanos. Aqui, o processo de privatização foi freado nos anos 90 por meio de um mecanismo tradicionalmente estabelecido, os plebiscitos populares. Em dois deles, nos últimos dois anos, os uruguaios decidiram-se a favor da propriedade, controle e gestão estatal da água, e contra a associação da empresa estatal de petróleo, a Ancap, com empresas privadas.

O grau de vitória que Vázquez alcançou deu-lhe a possibilidade de formar um ministério completo com integrantes da esquerda uruguaia. Mesmo assim, ele indicou para a pasta da Economia Danilo Astori, líder dos moderados na coalizão, que tem feito discurso semelhante ao adotado pelo ministro Antonio Palocci. "Questões como o controle da inflação, o superávit primário e o cumprimento das obrigações com os organismos financeiros internacionais não são propostas exclusivas da direita", tem afirmado Por outro lado, o ministro da importante pasta de Agricultura, Pecuária e Pesca, será o senador José "Pepe" Mujica, um ex-integrante do movimento armado dos Tupamaros, que serviu como pretexto para o estabelecimento da ditadura militar nos anos 70.

"Desejar o impossível é tão irresponsável e reacionário quanto conformar-se com o que aí está", é uma frase de Vázquez destacada pela imprensa durante a campanha, como um simbólico contraponto ao celebrado mote da esquerda, "sejamos realistas, peçamos o impossível".

Com informações de Banco Mundial, Departamento de Estado norte-americano, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Centro para Apertura y Desarrollo de la America Latina – Cadal





Fonte: Agência Brasil

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