Repórter News - reporternews.com.br
Politica Brasil
Quarta - 11 de Agosto de 2004 às 10:07
Por: Onofre Ribeiro

    Imprimir


Nesta semana conversei longamente com meu interlocutor freqüente, o professor Sílvio Luiz Monteiro, um pensador de primeira qualidade.Falamos sobre os números inquietantes que comprometem profundamente a segurança pública no estado.

Começo citando os dados de 2000 retirados do “Anuário Estatístico de Mato Grosso – 2001”. A Polícia Federal tinha 2.560 trabalhadores em vigilância registrados no seu cadastro. Mas estima-se que para cada um legal existam 3 ilegais. Sendo assim, seriam 7.680 vigilantes trabalhando em segurança de bancos, de empresas, de edifícios e repartições públicas, em bares, boates e em residências.

Ora, no mesmo anuário registrou-se que havia 127 agentes federais, e 328 policiais rodoviários federais trabalhando em Mato Grosso. E o efetivo da Polícia Civil estadual era de 887 pessoas, e de 3.717 na Polícia Militar. A gravidade da situação é que se somarmos todas as polícias tínhamos 5.059 pessoas. Ou seja, 2.621 vigilantes privados mais do que os corpos policiais do Estado.

A tradução é clara: a segurança pública já estava privatizada em 2000 aqui em Mato Grosso. Porém, em 2003 a situação mudou muito pouco. Os policiais militares subiram para 4.803 e os civis para 1.975 que, somados aos federais chegam a 7.233, ou 447 vigilantes mais do que policiais. Isso, tomando o número dos vigilantes de 2000. Mas sabe-se que devem ter crescido em pelo menos 40 por cento na medida da falência da segurança oferecida pela União e pelo Estado de Mato Grosso.

Trago este assunto por algumas razões, cada uma mais grave do que a outra. A primeira, é que o único ponto unânime em todas as promessas de campanha de todos os candidatos a prefeito nesta eleição, é a criação da guarda municipal, por indicação das pesquisas de opinião pública. É um aceno de desespero do município para manter a integridade dos seus cidadãos. Mas segurança é responsabilidade do Estado brasileiro. O cidadão para esse serviço embutido nos impostos que recolhe para o Estado.

Em nível estadual 75% do ICMS cai no cofre estadual e 25% no cofre municipal. Obrigatoriamente o cidadão pagou pela segurança pessoal e familiar ao comprar qualquer produto. Mas o município vai tirar desses minguados 25% recursos para contratar guardas municipais e para montar um sistema de segurança próprio.Esta pode ser uma solução emergencial, simplista que vai gerar gravíssimos conflitos de competência legal entre as polícias da União, dos estados e dos municípios.

Outro ponto é efetivamente a falência do Estado no seu papel de garantir a segurança dos cidadãos contra a força dos mais fortes. Se esta falência está assim tão clara, então precisamos ter a coragem de admitir que o estado faliu na sua função primordial de proteger os cidadãos. Ou seja, retornamos á barbárie, a razão que gerou a necessidade de criação do Estado.

Um último ponto faz tudo voltar ao começo. As polícias instituídas estão acomodadas numa cultura secular corporativa onde as competências determinam a conduta frouxa, agravada pelos desvios de comportamento e por marcas pesadas de corrupção histórica. O noticiário está farto desse tipo de denúncia. A corrupção policial é um rio de nascente generosa.

Falta preparo às polícias em primeiríssimo lugar. Depois, falta cidadania. Por fim falta compreensão do papel policial na estrutura da cidadania. Tradução inevitável: a sociedade não reconhece segurança pública nos corpos policiais, porque estão dissociados da realidade nacional.

Gostaria de fazer um registro. Em recente reunião da associação de moradores do bairro de classe média onde resido, uma moradora denunciou que um dos guardas privados avulsos que “tomam conta” da rua, tinha “vendido a rua para um colega, pelo valor de R$ 5 mil”. Ela e os demais moradores estavam assustados e impotentes para agirem. É um caso de guarda armada corporativa e marginal a todos os sistemas existentes. Os moradores foram avisados para não incomodarem o novo “dono da segurança da rua”.

Ora, o Estado não pode oferecer segurança e se sabe que em Cuiabá, por exemplo, morreram no ano passado 60 pessoas em cada 100 mil habitantes. A ONU considera que 50 mortes em 100 mil já configura guerra civil. Estamos, portanto, em guerra civil, apesar de termos duas polícias federais, duas estaduais, os vigilantes legais, os ilegais e os “donos de rua”.

É o estado de barbárie, apesar da segurança privatizada.”Estamos no fundo do poço”, concordamos eu e Silvio.

Onofre é jornalista em Cuiabá

www.onofreribeiro.com.br

JANELA “Estamos no estado de barbárie apesar da privatização da segurança”




Comentários

Deixe seu Comentário

URL Fonte: https://reporternews.com.br/noticia/376691/visualizar/