STF julga Dirceu e define se mensalão existiu a partir desta 2ª
Após condenar dez réus pelos crimes de corrupção ativa, peculato, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) chegam nesta segunda-feira ao 24º dia do julgamento do mensalão. Nesta etapa, o Supremo analisará se houve de fato pagamento de propina a parlamentares da base aliada em troca de apoio ao governo, no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva - acusação que originou o termo mensalão para identificar o escândalo político. Entre os réus que serão julgados está o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu (PT), o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-tesoureiro do Partido Delúbio Soares.
Até o momento, os ministros do STF já reconheceram que houve desvio de dinheiro público no fundo Visanet e na Câmara dos Deputados, gestão fraudulenta no Banco Rural e lavagem de dinheiro para ocultar a origem e o destino de recursos movimentados pelas empresas do publicitário Marcos Valério. A partir desta segunda-feira, naquela que promete ser a maior "fatia" do julgamento, a Suprema Corte analisará se a verba desviada foi usada para comprar o apoio de parlamentares, ou se os valores recebidos pelos políticos eram referentes apenas à quitação de dívidas de campanha assumidas pelo PT.
A sessão terá início com o voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, a respeito do sexto capítulo da denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Serão tratados os crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro entre integrantes do PT, PP, PL (atual PR), PTB e PMDB - partidos da base aliada do governo Lula entre 2003 e 2004 -, além de membros dos núcleos político, publicitário e financeiro, acusados de corrupção ativa em relação à compra de votos.
Devido à grande extensão da etapa - abrangendo 23 dos 37 réus de todo o processo -, o relator já solicitou, em mais de uma oportunidade, a realização de sessões extras para que o STF consiga superar essa fase em tempo hábil. Reservadamente, Barbosa afirma que deve utilizar no mínimo dois dias para ler seu voto.
Simpático à ideia de ampliar as sessões do julgamento, o presidente do STF, Carlos Ayres Britto, sugeriu colocar a proposta em votação na sessão desta segunda-feira, antes da leitura do voto do relator. Nos bastidores, Ayres Britto tentou buscar consenso para aumentar o julgamento, mas até agora não houve adesões suficientes.
Vários réus que figuram neste capítulo já foram considerados culpados em outras fases do julgamento. É o caso de Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, condenados por corrupção ativa, peculato e lavagem de dinheiro; e de Rogério Tolentino e Simone Vasconcelos, condenados por lavagem de dinheiro.
Acusação
A denúncia do Ministério Público Federal aponta que os petistas José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoino "articularam, ofereceram e, posteriormente, pagaram vultosas quantias a diversos parlamentares federais, principalmente os dirigentes partidários", para conseguir apoio político para votar os projetos de interesse do governo, em especial, as reformas tributária e da Previdência em 2003.
Além deles, serão julgados o ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto (PT), Geiza Dias, Pedro Corrêa, Pedro Henry, João Cláudio Genu, Enivaldo Quadrado, Breno Fischberg , Valdemar Costa Neto, Jacinto Lamas, Antônio Lamas, Bispo Rodrigues, Roberto Jefferson, Emerson Palmieri, Romeu Queiroz e José Rodrigues Borba.
O ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira também era citado como articulador do esquema, mas deixou de integrar a ação penal quando fechou acordo com o MPF. O réu Carlos Alberto Quaglia, sócio da empresa Natimar, figurava nesta etapa do processo, mas seu caso foi encaminhado para a primeira instância devido a falhas processuais. José Janene, político do PP também denunciado nesta fase, morreu em 2010.
Segundo a denúncia, foram distribuídos R$ 4,1 milhões ao PP, R$ 10,8 milhões ao PL (atual PR), R$ 5,5 milhões ao PTB e R$ 200 mil ao PMDB. O MPF informa que o repasse das verbas era feito de diversas formas: por saques dos próprios parlamentares ou seus assessores no Banco Rural, com a ajuda de integrantes do grupo de Marcos Valério, ou por meio de empresas usadas para lavar o dinheiro.
Vários réus confirmam ter recebido dinheiro do esquema de Marcos Valério, porém em menor quantidade que o apontado pela denúncia. A principal linha de defesa é que o dinheiro se destinou a pagar gastos de campanha após acordos políticos fechados com o PT. Os assessores usados nas operações alegam que não sabiam do esquema criminoso.
Ao menos dois dos 23 réus desta etapa possivelmente serão absolvidos. Um deles é Antônio Lamas, político ligado ao PL acusado de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, cuja absolvição já foi pedida pelo MPF por falta de provas. Já Geiza Dias, que responde por corrupção ativa, foi absolvida no capítulo anterior, referente ao crime de lavagem de dinheiro, após a maioria dos ministros aderir à tese de que a ex-gerente financeira da empresa de Marcos Valério não podia ser condenada por não saber que estava cometendo crime ao fazer repasses ao esquema.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
Com informações da Agência Brasil.
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