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Quarta - 24 de Agosto de 2016 às 16:32
Por: Mídia News

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Marcus Mesquita/MidiaNews/Reprodução
A juíza Selma Arruda (esq.) foi afastada da ação envolvendo a ex-primeira-dama Roseli Barbosa (dir.)
A juíza Selma Arruda (esq.) foi afastada da ação envolvendo a ex-primeira-dama Roseli Barbosa (dir.)

A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) afastou a juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, da condução da ação penal derivada da Operação Arqueiro, em razão de "parcialidade".

A decisão foi dada na tarde desta quarta-feira (24), de forma unânime. A Operação Arqueiro, deflagrada em agosto de 2015, resultou na prisão da ex-primeira-dama e ex-secretária de Estado Roseli Barbosa, esposa do ex-governador Silval Barbosa (PMDB) - atualmente preso.

Com a determinação, Selma Arruda fica afastada da condução da ação penal e todos os atos praticados a partir da delação premiada do empresário Paulo Lemes, inclusive a homologação da delação e os decretos de prisão, passam a ser considerados nulos.

Votaram pelo afastamento os desembargadores Pedro Sakamoto (relator), Orlando Perri e Rui Ramos.

A ação investiga desvios de até R$ 2,8 milhões dos cofres do Estado, entre 2011 e 2014, e teve como base o conteúdo da delação premiada feita pelo empresário Paulo Lemes, dono de três institutos que prestavam serviços à Secretaria de Trabalho e Assistência Social (Setas).

Além de Roseli Barbosa, também foram presos na operação o empresário Nilson da Costa e Faria, o ex-assessor de Roseli, Rodrigo de Marchi, e Silvio Cezar Correa Araújo, ex-chefe de gabinete de Silval.

pedro sakamoto 2016

O desembargador Pedro Sakamoto, relator do voto que afastou juíza de ação

A ex-primeira-dama deixou a prisão em 27 de agosto, por força de decisão proferida pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça. Os demais réus também foram soltos em seguida.

O pedido para declarar a magistrada suspeita foi feito pela defesa de Roseli, representada pelo advogado Ulisses Rabaneda.

O advogado afirmou que o acordo entre o delator e o Ministério Público é nulo, pois a juíza, em audiência especial e secreta, fez perguntas ao colaborador sobre todos os fatos em investigação por mais de 1 hora, o que, segundo ele, é vedado pela Lei e Constituição Federal.

“O sistema acusatório impede que o juiz pratique atos de investigação penal, especialmente a colheita de depoimentos de forma sigilosa na fase de investigação. Se fizer isto, o magistrado estará impedido de conduzir a ação penal. A investigação é tarefa da polícia e do Ministério Público”, afirmou.

Segundo Rabaneda, a magistrada poderia ouvir o delator, no entanto, suas indagações deveriam se restringir à aferição de eventual coação ou algo que tiraria a legitimidade da homologação.

“A juíza ao invés de averiguar apenas e simplesmente a legalidade, regularidade e voluntariedade do acordo, avançou para a produção de elementos de prova”, disse.

Já o procurador de Justiça Domingos Sávio, do Ministério Público Estadual (MPE), declarou que não houve qualquer ilegalidade na conduta da juíza Selma Arruda.

“O magistrado deve conferir a voluntariedade da delação. E como se fará essa conferência? Apenas perguntando se foi coagido? Será que não é dada ao juiz a oportunidade de ele reproduzir termos da própria delação para ver se há ciência e concordância do delator? Como se fará essa audiência se não for assim? Essa conferência foi feita pela juíza. Que audiência é essa em que a juíza teria que ficar quase muda? O juiz não pode falar nada então?”, questionou.

Perri: "incriminação antecipada"

Na sessão desta quarta-feira (24), o desembargador Orlando Perri acompanhou o voto do relator do caso e declarou que a juíza, ao ouvir o empresário Paulo Lemes na audiência de homologação da delação, acabou por "substituir a acusação".

Conforme o desembargador, a partir da delação, Selma Arruda passou a ter um pré-juízo sobre os acusados que motivou o decreto de prisão expedido por ela.

"Foi externalizado um compromentimento com a tese da acusação, deixando claro o pré-juizo das condutas dos acusados, dando valor quase absoluto às palavras do delator".

Perri relatou existir uma "alta probabilidade" de que a juíza adotou como verdadeira a acusação do Ministério Público após ouvir as declarações do delator.

O ânimo da julgadora foi irremediavelmente contaminado em razão da oitiva

O mesmo entendimento foi acompanhado pelo desembargador Rui Ramos Ribeiro.

Falta de imparcialidade

Na sessão anterior, o relator do caso, desembargador Pedro Sakamoto, afirmou que a juíza, de fato, perdeu a imparcialidade para julgar o caso.

O magistrado disse que, na audiência em que a delação é homologada, não é permitido aos juízes inquirir o colaborador e transformar o ato em produção antecipada de provas.

“Analisando a oitiva, verifica-se que a excepta [Selma Arruda] foi além e questionou o colaborador em profundidade, em muito extrapolando o que dela se esperava.

A juíza aprofundou-se em minúcias sobre o caso, aprofundando-se sobre as empresas, sócios, identidades dos envolvidos, seus papéis na trama, percentual de repasses. E aprofundou-se ainda mais ao questionar sobre o modo em que foi feito o desvio de recursos ao erário”.

Sakamoto registrou que a própria juíza, ao decretar a prisão de Roseli Barbosa, afirmou que se baseou em elementos trazidos pelo delator Paulo Lemes.

“A juíza confirmou na sua decisão que os dados colhidos em tal ato serviram como respaldo à prisão preventiva [...] O ânimo da julgadora foi irremediavelmente contaminado em razão da oitiva”.

O magistrado registrou que não cabia à juíza, na audiência de homologação das delações, fazer questionamentos sobre os fatos em investigação, uma vez que seria impossível a ela “descartar mentalmente o que colheu no depoimento”.

“Analisando as mídias audiovisuais, que reproduz as oitivas, verifica-se que a excepta [Selma Arruda] efetivamente submeteu a perguntas sobre os fatos. A julgadora agiu de boa-fé. Mas a suspeição no caso não é por má-fé, mas porque, ao analisar prematuramente os fatos, a excepta aparentemente se convenceu da acusação”, disse ele.

O desembargador declarou que os termos utilizados pela juíza nas decisões relativas à ação penal evidenciam que ela já havia se convencido da veracidade das acusações contra os réus.

“Nota-se na decisão um abundante uso de termos marcadamente conclusivos como ‘é’, ‘foi’, ‘recebeu’, ‘exigiu’, diferente do que deveria ser nesta fase, com palavras como ‘teria’, ‘supostamente’, ‘em tese’. Ao que parece, a excipiente e os demais réus já foram declarados culpados pela julgadora”, ressaltou.

A delação

Segundo a delação premiada de Lemes, a ex-primeira-dama teria ficado com pelo menos R$ 478,1 mil em propinas. E que as fraudes em convênios foram cometidas em 2012 e 2013, por meio de contratos com o Instituto Concluir e o Instituto de Desenvolvimento Humano.

Ao que parece, a excipiente e os demais réus já foram declarados culpados pela julgadora

Ele contou ao Gaeco, no dia 29 de junho passado, que as fraudes ocorreram nos convênios dos cursos Copa em Ação Fase II, em Cuiabá e Várzea Grande; e Qualifica Mato Grosso.

Antes de fechar os contratos, Paulo Lemes relatou que era feita uma reunião, na sala de Roseli Barbosa, em que eram apresentadas as planilhas com detalhes sobre os valores que cada membro do esquema iria lucrar.

“Em todas as vezes, o Rodrigo de Marchi [assessor de Roseli, também preso pelo Gaeco] estava junto. Não andava nada lá na Setas, se Roseli Barbosa não desse um visto. Nessas oportunidades, eu apresentava para a Roseli a planilha de cada curso com os valores previstos, os cursos reais e a previsão do valor da sobra, ou seja, do lucro”, revelou o empresário.

Segundo ele, habitualmente o lucro obtido com os desvios era repartido da seguinte maneira: 40% para Roseli Barbosa, 36% para ele e os 24% restantes eram divididos entre o assessor de Roseli, Rodrigo de Marchi, e o empresário Nilson da Costa e Faria.

Das supostas fraudes descritas na delação, as com os maiores valores desviados foram as relativas aos convênios do programa de capacitação profissional “Qualifica Mato Grosso”.

Um dos convênios, fixado em R$ 5,5 milhões, na verdade teria um gasto real de R$ 3,6 milhões, gerando "lucro" de R$ 1,5 milhão aos integrantes do esquema.

Todavia, de acordo com o delator, o lucro real obtido com este convênio foi de R$ 979,9 mil.

“Esse valor foi dividido exatamente naquela proporção combinada com Roseli, ou seja, 40% para ela, correspondente a R$ 391.984,00; R$ 24% para Nilson e Rodrigo, correspondente a R$ 235.190,00 e 36% para o interrogando, correspondente a R$ 352.785,00”, relatou.

O outro convênio do programa tinha valor de R$ 3,4 milhões, sendo que o desvio acordado foi fixado em R$ 754,5 mil.

Como Paulo Lemes havia feito um empréstimo de R$ 418 mil a Silvio Araújo, então chefe de gabinete do ex-governador Silval Barbosa (PMDB), o empresário exigiu uma fatia maior do lucro.

Segundo o delator, Silvio Araújo convenceu Roseli Barbosa a abrir mão dos 40%, que corresponderia a R$ 300 mil, em favor de Paulo Lemes, no intuito de quitar o empréstimo – segundo ele usado para financiar a campanha de Lúdio Cabral à Prefeitura de Cuiabá, em 2012.

Paulo Lemes contou que a então secretária-adjunta da Setas, Vanessa Rosin Figueiredo, também participou da tratativa e, a princípio, exigiu R$ 200 mil. Ele diz que “chorou” para diminuir o valor e acertou o pagamento de R$ 50 mil.

Desta forma, a repartição do lucro final ficou em R$ 50 mil para Vanessa Rosin, R$ 150 mil para Silvio Araújo, R$ 30 mil a ser dividido entre Nilson e Rodrigo e R$ 474,5 mil a Paulo Lemes.

Outros R$ 50 mil seriam destinados a outra pessoa chamada “Dalva”, mas o assessor Rodrigo Marchi pediu que não dessem nada a ela e repartissem o dinheiro entre si. Com isso, foram repassados mais R$ 20 mil a Rodrigo Marchi, R$ 12 mil a Nilson faria e R$ 18 mil ao delator.

Copa em Ação

As fraudes também ocorreram, segundo Paulo Lemes, durante a execução dos convênios do programa “Copa em Ação Fase II”, que, em tese, deveria ter o intuito de capacitar e qualificar cerca de 10 mil pessoas nas áreas de turismo, hotelaria, construção civil, comércio e serviços.

Em um desses convênios realizados na Capital, ficou acertado que o lucro total obtido com as fraudes seria de R$ 50,2 mil.

Desta forma, seguindo o percentual dos acordos, R$ 20,1 mil ficaram com Roseli Barbosa - R$ 12 mil foram divididos entre Nilson Faria e Rodrigo de Marchi, e Paulo Lemes recebeu R$ 18,1 mil.

Porém, uma nova atualização dos lucros foi feita e o valor do lucro subiu para R$ 65,2 mil. Assim, a Roseli ganhou mais R$ 6 mil, Nilson e Rodrigo dividiram outros R$ 3,6 mil e Paulo Lemes abocanhou mais R$ 5,4 mil.

No “Copa em Ação” desenvolvido em Várzea Grande, o lucro foi um pouco maior, de R$ 66, 5 mil. O montante foi fatiado com R$ 26,6 mil para Roseli, R$ 15,9 mil para Nilson e Rodrigo e R$ 23,9 mil para Paulo Lemes.

Outro convênio não especificado na delação, cujo lucro foi de R$ 86 mil, seguiu o mesmo molde: R$ 34,4 mil a Roseli, R$ 20,6 mil para Nilson e Rodrigo e R$ 30,9 mil para Paulo Lemes.





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