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Meio Ambiente
Segunda - 13 de Julho de 2020 às 05:52
Por: Fernanda Perrin/Da Folhapress - São Paulo

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Em junho, foram mais de 1.000 km² destruídos, maior área da série histórica, iniciada em 2015
Em junho, foram mais de 1.000 km² destruídos, maior área da série histórica, iniciada em 2015

Um grupo de 36 empresas de grande porte de diferentes setores se articulou para manifestar sua preocupação com a deterioração da imagem do Brasil no exterior em relação à questão ambiental, numa ação de concertação rara do setor privado.

Algumas ações de boicote já ocorreram, há relatos de queda nos investimentos recebidos neste ano e vários casos sobre questionamentos em relação à postura ambiental do país–informações levadas por empresários ao vice-presidente Hamilton Mourão, numa reunião na sexta (10) .

Cobranças ambientais não são uma novidade para empresários brasileiros.

Há décadas, o lobby de fazendeiros europeus se agarra ao tema para restringir a entrada de produtos agropecuários brasileiros no continente, não raro com argumentos que não procedem.

O avanço do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia acirra os ânimos neste momento, mas dentro de um jogo conhecido.

Não é de hoje também que os clientes estão exigentes e cobram um comportamento mais sustentável das empresas e grandes investidores.

Mas um componente novo elevou a pressão e o tom das cobranças sobre as empresas brasileiras, avaliam especialistas: a política ambiental do Governo de Jair Bolsonaro.

Chamaram a atenção no exterior especialmente os dados concretos sobre desmatamento na Amazônia.

Junho foi o 14º mês seguido em que houve alta no indicador, segundo o programa que mede desmatamento praticamente em tempo real, o Deter do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Especiais).

Foram mais de 1.000 km² destruídos, maior área da série histórica, iniciada em 2015.

"As pessoas interessadas nesse desmatamento estão frequentando o Palácio do Planalto. Ministros de Estado se reuniram com madeireiros ilegais, garimpeiros, grileiros. É o pessoal que corria da polícia, mas se acha injustiçado", afirma Marcio Astrini, presidente do Observatório do Clima.

Quem acompanha a questão ambiental de perto diz que a derrubada de árvores ocorreu em paralelo ao desmonte das estruturas de fiscalização.

"O Governo Jair Bolsonaro reduziu o Ibama, o ICMBio, tirou os fiscais, equipamentos e recursos. Não tem como remontar isso da noite para o dia. É algo que vem de cinco, seis anos e que o governo atual aprofundou", afirma Caio Magri, presidente do Instituto Ethos.

Magri também critica a permanência do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, à frente da pasta. "Não há mais chance de Salles recuperar qualquer credibilidade no Brasil ou no mundo. Ou governo se livra dele, ou qualquer medida será permanentemente questionada e vista com desconfiança", diz.

O ministro Salles chegou a alegar que as críticas à política ambiental do governo faziam parte de movimentos ideológicos de ONGs de esquerda. No entanto, a reação sobre as empresas brasileiras está vindo dos representantes do capitalismo.

"Sentimos muitos questionamentos tanto de clientes quanto de investidores. Existe um grupo de stakeholders [acionistas] que, no passado, não se preocupavam muito com isso, mas o nível de interesse no tema [ambiental] se elevou. Muitos investidores estão condicionando a compra de ações e outros papéis das empresas à aderência delas aos melhores padrões", diz Marcelo Bacci, diretor executivo de finanças da Suzano, empresa de papel e celulose.

O setor é apontado como um dos mais bem estruturados no país em termos de rastreabilidade da cadeia e certificações ambientais. Ainda assim, a empresa teme que o cenário atual cause danos a sua reputação ambiental.

"Vendemos para empresas do mundo todo, e esses caras também sentem pressão dos clientes deles. Tem que garantir que toda a cadeia de valor está funcionando corretamente", diz Bacci.

A cobrança começou no ano passado e foi subindo de tom à medida que o governo não reagia. Em setembro, 230 fundos que administravam US$ 16 trilhões (R$ 82 trilhões) lançaram uma carta pública pedindo a defesa da Amazônia. Nada prático ocorreu.

No final de junho, um grupo de 29 gestoras, que administra US$ 4,1 trilhões (R$ 21 trilhões), decidiu fazer uma ação direta. Enviou nova carta, desta vez para embaixadas do Brasil, pedindo uma reunião para discutir o desmatamento. O encontro ocorreu na quinta-feira (9).

"Essa pressão cresceu muito no ano passado e, mesmo com a pandemia, nos últimos cem dias, não arrefeceu", afirma Paulo Pianez, diretor de Sustentabilidade da Marfrig, umas das maiores empresas de carnes do país.

"Acreditamos que o tema vai crescer e, certamente, dificultar a exportação de produtos brasileiros."

A derrubada da floresta gera um efeito em cadeia no mundo dos negócios. As árvores são retiradas por madereiras e podem virar carvão, móveis, instrumentos musicais ou estruturas na construção civil.

Grileiros promovem a especulação da terra. Boa parte vira pasto para criação de gado, colocando a pecuária, as industrias de processamento e até os supermercados na mira dos ambientalistas.

Relatório publicado em junho pela organização internacional Trase estima que 81% das áreas desmatadas na Amazônia brasileira em 2018 foram ocupados por pastos.

As engrenagens da devastação são ilegais, e com a redução da fiscalização no atual governo, a vida das empresas foi se complicando.

"Nós reconhecemos que há um problema, os números deixam isso claro, e sabemos que tem muito a ver com a ilegalidade", afirma Pianez.

Segundo o executivo, a percepção é que há um movimento, principalmente de grandes redes de varejo europeias e investidores, para pressionar o Brasil. Se a política pública em relação ao desmatamento não mudar e as empresas não se posicionarem, o acesso a esses mercados poderá ser perdido.

"Os avisos estão postos. Cabe às empresas, agora, não deixar que virem realidade", diz o executivo da Marfrig.

A preocupação chegou também a empresas distantes do mercado de produtos agropecuários e florestais. Apesar de atuar na construção civil, Marcos Bicudo, presidente da Vedacit, entende que os questionamentos na esfera ambiental prejudicam todos os setores.

Para o empresário, o Brasil tem oportunidades de atração de investimentos bilionários. A aprovação recente do marco regulatório do saneamento básico é um exemplo. Mas esse potencial pode ser prejudicado pelo "ruído" relacionado à Amazônia.

"A mensagem está endereçada pelo investidor estrangeiro e ele espera uma perspectiva positiva", afirma.

Os temores são alimentados por casos concretos de boicote. Um caso recente é o de uma subsidiária da Cargill (a Cargill Aqua Nutrition), excluída da lista de fornecedores pela Grieg Seafood, uma das maiores produtoras de salmão do mundo, por ligações com o desmatamento ilegal no cerrado e na Amazônia brasileiros.

Em dezembro, a Nestlé também parou de comprar soja brasileira da Cargill ao não conseguir rastrear a origem do grão.

O couro brasileiro também sofreu sanções semelhantes no ano passado da varejista H&M e da VF, das marcas de calçados Timberland e a Vans, populares entre jovens engajados.

A necessidade de se explicar para investidores e parceiros comerciais já é um incômodo para as empresas, afirma Marina Grossi, presidente do CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), organização que vem capitaneando a articulação do setor privado contra o desmatamento.

"Não há uma empresa que possa ficar imune ao contágio do que está ao seu redor. Você ter que toda hora se explicar inibe o investimento. Você fica perdendo tempo tendo que se defender em vez de fazer propaganda das coisas boas que você faz", diz Grossi.





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