Frase perdeu sentido após ocupação. (Foto: Reinaldo Marques/Terra)
"Proibido filmar ou tirar foto". A frase pichada na parede de uma das inúmeras curvas da estrada da Gávea, a pouco mais de 500 m da entrada da Ápia, a principal via da Rocinha pelo bairro de São Conrado, não está ali por acaso. Apontado pelos moradores como um dos principais pontos de venda de cocaína e maconha até a semana passada, estava vazio nesta segunda-feira, após a retomada do morro pelas forças de segurança do Rio de Janeiro, com o apoio dos fuzileiros navais da Marinha do Brasil.
Por ser um ponto de reunião de traficantes para a venda de entorpecentes, câmeras de celulares e máquinas fotográficas nunca foram bem vistas por ali. Hoje, enquanto policiais subiam e desciam a vielas, durante a operação para encontrar drogas, armas e foragidos da Justiça, o que mais se via no local eram equipamentos de imagem, seja dos jornalistas ou dos próprios moradores, que aproveitando o cenário incomum, registraram o momento.
Nas ruas da Rocinha, se há sentimento de alegria, ele é contido. Quem mora nas comunidades pobres do Rio de Janeiro tem uma relação distante com a polícia. Desde a entrada dos policiais neste domingo, não houve registro de abuso na operação, o que, de maneira geral, até surpreendeu os moradores. Há certa tensão nos olhares, mas o tratamento tem sido respeitoso dos dois lados, como também testemunham os policiais.
Nem e a tomada da Rocinha
O chefe do tráfico da favela da Rocinha, Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, foi preso pelo Batalhão de Choque da Polícia Militar no início da madrugada de 10 de novembro. Um dos líderes mais importantes da facção criminosa Amigos dos Amigos (ADA), ele estava escondido no porta-malas de um carro parado em uma blitz por estar com a suspensão baixa, em uma das saídas da maior favela da América Latina -, que havia sido cercada por policiais na noite do dia 8 de novembro.
Desde o dia anterior, a polícia já investigava denúncias de um possível plano para retirar o traficante da Rocinha. Além de Nem, três homens estavam no carro. Um se identificou como cônsul do Congo, o outro como funcionário do cônsul, e um terceiro como advogado - a embaixada da República do Congo, entretanto, informou não ter consulados no Rio. Os PMs pediram para revistar o carro, mas o trio se negou, alegando imunidade diplomática. Os agentes decidiram, então, escoltar o veículo até a sede da Polícia Federal. No caminho, porém, os ocupantes pediram para parar o carro e ofereceram R$ 1 milhão para serem liberados. Neste momento, os PMs abriram o porta-malas e encontraram Nem, que se escondia com R$ 59,9 mil e 50,5 mil euros em dinheiro.
Nem estava no comando do tráfico da Rocinha e do Vidigal, em São Conrado, junto de João Rafael da Silva, o Joca, desde outubro de 2005, quando substituiu o traficante Bem-te-vi, que foi morto. Com 35 anos, dez de crime e cinco como o chefe das bocas de fumo mais rentáveis da cidade, ele tinha nove mandados de prisão por tráfico de drogas, homicídio e lavagem de dinheiro. Nem possuía um arsenal de pelo menos 150 fuzis, adquiridos por meio da venda de maconha, cocaína e ecstasy, sendo a última a única droga consumida por ele. Com isso, movimentaria cerca de R$ 3 milhões por mês, graças à existência de refinarias de cocaína dentro da favela.
O fim do domínio de Nem na Rocinha foi o último obstáculo à entrada das forças de segurança na favela para a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Na madrugada do dia 13 de novembro, agentes das polícias Civil, Militar e Federal, além de homens das Forças Armadas, iniciaram a ocupação do local escoltados por um forte aparato. No entanto, os traficantes já haviam deixado a comunidade, e a operação foi concluída sem qualquer confronto.
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