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Saúde
Quinta - 14 de Fevereiro de 2008 às 07:50
Por: Reinaldo José Lopes

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O temido vírus da dengue pode estar desempenhando, sem querer, um papel positivo nas cidades brasileiras, impedindo que a febre amarela urbana volte a atacar. De acordo com indícios intrigantes, levantados por pesquisadores da USP de Ribeirão Preto, o causador da dengue e o vírus da febre amarela estariam competindo no interior dos mosquitos que transmitem ambas as doenças, com uma vitória clara do primeiro.

Se a hipótese estiver correta, ela explica de forma simples e elegante por que a febre amarela não voltou a invadir as cidades do Brasil desde a erradicação do problema nos anos 1940, quando os mosquitos transmissores do vírus foram quase eliminados. De quebra, a idéia traz um pouco mais de tranqüilidade diante do medo de uma nova epidemia urbana da doença. “Eu gostaria muito que isso fosse verdade, mas ainda é cedo para ter certeza”, diz o professor Benedito Antonio Lopes da Fonseca, chefe do Laboratório de Virologia Molecular da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto.

As pistas sobre a guerra entre os dois tipos de vírus estão sendo seguidas por Fonseca e por sua aluna Emiliana Pereira Abrão da Costa, cujo projeto de tese de doutorado investiga o tema. Os dois vilões microscópicos pertencem ao mesmo grupo, o dos flavivírus. Também usam o mesmo vetor para alcançar os seres humanos: os mosquitos do gênero Aedes. Essas características em comum levaram Fonseca a desenvolver a hipótese da competição entre os vírus dentro dos insetos.

“Como não temos a estrutura para criar e infectar os mosquitos vivos em laboratório, procuramos fazer um teste com uma cultura de células”, conta Fonseca. Os pesquisadores empregaram células especialmente cultivadas do mosquito Aedes albopictus (primo menos famoso do A. aegypti), que servem de meio para a multiplicação dos flavivírus.

“O que nós descobrimos é que, quando as células são infectadas pelo vírus da dengue, é praticamente impossível fazer com que o vírus da febre amarela se estabeleça nelas depois, mesmo que tentemos infectar essas células com milhares de vírus”, explica Fonseca. “Parece haver uma interferência na replicação do vírus da febre amarela, de forma que, em vez de uma produção de centenas de milhares ou milhões de partículas virais, obtemos só algumas centenas.”

Dúvidas no ar

Além de mais testes com mosquitos, um dos jeitos de confirmar a hipótese seria usar dados históricos sobre a prevalência das duas doenças, mas nesse ponto há algumas dificuldades, explica o virologista da USP. “A dengue só se tornou importante internacionalmente depois da Segunda Guerra Mundial. Sabemos que o vírus é originário da Ásia. Pode ser que, de fato, até pela falta de intercâmbio do Brasil com essa região no passado, a dengue tenha chegado aqui depois que a febre amarela foi erradicada nas cidades. Ou ela já estava presente, mas o diagnóstico não era feito ou era feito confundindo a dengue com a febre amarela.”

O significado dos achados para a saúde pública ainda precisa ser ponderado. Por um lado, lembra Fonseca, não se sabe qual a proporção de mosquitos Aedes urbanos infectados pela dengue – ou seja, se a “proteção” oferecida por um vírus contra o outro é total ou apenas parcial.

Há, no entanto, algumas razões para considerar que é um bom negócio ter trocado a febre amarela pela dengue nas cidades. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), quase 10% dos infectados com febre amarela morre da doença. Já a dengue costuma matar menos de uma pessoa a cada mil doentes. Embora ambas sejam um problema sério de saúde pública, a dengue, pelo menos na maioria dos casos, parece ser o mal menor.

“Por outro lado, temos a vacina contra a febre amarela, enquanto não há como se proteger diretamente da dengue por falta de vacina”, compara Fonseca. “Por isso, ainda não podemos baixar a guarda contra nenhuma das duas doenças.”





Fonte: G1

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