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Internacional
Segunda - 06 de Fevereiro de 2006 às 17:55

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Quando a ex-modelo que já foi pôster da Playboy Susie Krabacher segura no colo uma criança portadora de deficiência, no orfanato que fundou no Haiti, a vida de drogas e luxo e a infância infeliz parecem estar muito longe. "Aquilo foi em outra vida. Esta é minha missão."

Cercada pelos sorrisos de dezenas de crianças abandonadas, com deficiências e doentes, num conjunto modesto de prédios brancos numa estrada esburacada ao norte da capital haitiana, Krabacher encaixa-se estranhamente no cenário.

A norte-americana loira de 42 anos chama a atenção num país predominantemente de negros. Chamada de "Mama Blanche", ela fala sem dificuldades sobre o duro trajeto desde os anos em que sofreu abuso sexual, nas mãos de um parente, quando criança, até ser pôster central da Playboy em 2003, e depois nas ruas sujas do país mais pobre do continente.

"Prometi a Deus quando era criança que, se ele me ajudasse a não ser morta, se eu sobrevivesse, ia ajudar as crianças."

Em 1994, ela estava pronta para concretizar seu sonho na Mongólia, mas uma pessoa lhe perguntou por que ia tão longe se o Haiti, tão perto dali, tinha tantos problemas.

"Eu disse: ''Não sabia que o Taiti era pobre''. E ele disse: ''Não, não, o Haiti''. Eu nunca tinha ouvido falar no Haiti."

Rapidamente, ela organizou uma viagem para lá e passou sua primeira noite na Cité Soleil, a grande favela da capital que recentemente foi palco de combates entre soldados de paz da ONU e gangues armadas.

Em 12 anos no país violento e instável, Krabacher diz que já negociou com líderes de gangues, despachou burocratas que queriam propina e recebeu ameaças de morte. Ela espera que as eleições de terça-feira levem pelo menos um pouco de estabilidade ao país.

Krabacher conta que já viu o que há de pior no Haiti. As crianças de quem cuida, metade delas com deficiências graves ou em estado terminal, são recolhidas das ruas ou encontradas em chiqueiros, banheiros e jaulas.

Uma criança de 1 ano foi encontrada num canal de esgoto. Quando o menino foi retirado, descobriu-se que ele tinha blocos de cimentos amarrados às pernas.

Foi uma história de final feliz. O garoto foi adotado e vive no País de Gales. Mas ela já viu centenas de crianças perecerem.

"O pior é ir ao necrotério. Colocamos um pequeno bilhete em cada um dos caixõezinhos, e o bilhete diz ''neste mundo você foi amado''."

Em seu orfanato, cercado por muros, personagens dos quadrinhos enfeitam as paredes, e fileiras organizadas de beliches se espalham pelos prédios, com uma cozinha e uma sala de exames médicos, sob a guarda de um segurança armado.

Krabacher pega Carol no colo. A menina, de 5 anos, pesa apenas 5,5 kg e esteve à beira da morte. O vestido não cobre as pernas retorcidas. O corpo está rígido. "Ela nasceu com fenda palatal e a anestesia deu problemas durante a operação. Ela sofreu lesões cerebrais", disse Krabacher.

"Ela adora as crianças e elas a adoram. Ela é ainda melhor do que o que as pessoas contam", disse Turenne Raquens, que acaba de assumir a diretoria do orfanato.

A fundação iniciada por Krabacher mantém hoje três orfanatos, seis escolas, um hospital e seis programas de alimentação no Haiti. Os orfanatos abrigam 120 crianças, e os programas alimentam 3.300 crianças por dia, com um orçamento anual de 400 mil dólares e mais 700 mil dólares em doações de alimentos, fraldas e outros suprimentos.

Krabacher, que costuma passar metade do ano no Haiti, diz não sentir falta dos restaurantes e do luxo da vida pregressa, e disse que pretende morrer no país. "Mas espero que não com um tiro", afirmou, sorrindo.




Fonte: Reuters

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