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Economia
Sexta - 25 de Fevereiro de 2005 às 19:55
Por: Iara Falcão

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Brasília – Há mais de um ano, a engenheira civil Maria de Fátima Frota, 50 anos, recorre ao cheque especial do Banco do Brasil para pagar suas contas. "É um tipo de ajuda de custo", justifica. Usa o que recebe para pagar a dívida do mês anterior. "O salário cobre e a gente entra de novo". Maria de Fátima calcula que, com os juros cobrados pelo banco – 7,4% ao mês, em média - ela gasta 50 reais do salário só para cobrir a dívida do cheque especial todos os meses.

Pessoas como Maria de Fátima chegam a pagar, por ano, segundo cálculos da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), uma taxa de 160,63% do valor do empréstimo, ou seja, quase duas vezes e meia o que gastou do cheque especial. Mas não é só no cheque especial que as pessoas pagam juros altos. Para o vice-presidente da instituição, Miguel de Oliveira, é preciso considerar, além dos juros altos, a renda do brasileiro, que é baixa. "Na média, um terço da renda do brasileiro é gasta com pagamento de juros", afirma.

Oliveira desenvolveu estudos em 2002 sobre a relação dos juros com a renda, e afirma que a situação continua assim até hoje. "Nas faixas (de renda) menores o problema é maior, as pessoas gastam mais com juros do que com alimentos (22%) ou moradia (24%)". Segundo ele, são três os problemas: "o tamanho das taxas de juros; o fato da renda do brasileiro, que é baixa, e por isso ele entra no crédito, para complementar o salário; e o despreparo e o desconhecimento do consumidor, que não se planeja, compra com prazos longos, não pergunta os juros, olham só o valor da parcela".

Enquanto pagam juros altos, clientes bancários como Maria de Fátima ajudam a aumentar os lucros bancários, que ao fazerem seus próprios empréstimos, pagam taxas bem menores. Essa diferença entre os juros que os bancos cobram e os juros que pagam é conhecida como spread. Segundo Miguel de Oliveira, os juros que os bancos pagam ao captar recursos variam de 0,7% ao mês, no caso de poupança, a 1,25%, no caso de fundos de renda fixa. Nos depósitos a vista (conta corrente) os bancos não pagam nada, apenas têm que destinar 45% do valor para um depósito compulsório no Banco Central (BC) e reservar outros 2% para créditos dirigidos. O que sobra, segundo Oliveira, os bancos poderiam utilizar sem pagar juros.

O spread das operações de crédito no Brasil – em média, 27% ao ano, segundo o Banco Central – está entre os maiores do mundo. Segundo o economista e professor da Fundação Getúlio Vargas em Brasília, Jandir Feitosa, vários fatores levam a um spread tão alto. "Na taxa cobrada na ponta, o banco embute, possivelmente, prestações atrasadas, inadimplência, risco de crédito em função do mercado, da conjuntura econômica, cunha fiscal e a própria expectativa de inflação", explica .

No cálculo também entram as despesas administrativas do banco e os lucros. Segundo o vice-presidente da Anefac, Miguel de Oliveira, o último estudo do Banco Central sobre a composição do spread, realizado em agosto de 2003, divide a composição do spread em impostos diretos (19,10%); indiretos (8,24%); despesas administrativas (16,10%), inadimplência (19,10%) e a margem líquida, ou o lucro, que abocanha a maior fatia dos juros, 37,45%.

Para o professor de Ciências Contábeis e Autuarias da Universidade de Brasília, Roberto Piscitelli é preciso ainda levar em conta "a falta de concorrência do sistema bancário e o baixo volume de crédito", que empurram as taxas finais para cima. Uma pesquisa do Instituto de Estudo para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), por exemplo, revela que a reserva para o crédito no Brasil está em torno de 26% do PIB, enquanto em outros países, principalmente na Europa, essa relação supera os 100%. Segundo Piscitelli, com um crédito tão baixo, e uma alta demanda por empréstimos, a tendência é que os juros aumentem. "É a lei da oferta e da procura", enfatiza. Miguel de Oliveira, da Anefac, acusa os bancos de não se esforçarem muito para aumentar o crédito. "O banco não quer colocar muito dinheiro no crédito para não derrubar a taxa, para não haver competição", afirma.

É complicado falar em falta de concorrência entre os bancos no Brasil, diz o secretário de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, Elcio Tokeshi. "Não é muito fácil de se provar que não existe concorrência entre os bancos. Mesmo havendo concentração, eles existem em número relativamente alto. Comparando com a concentração industrial, vemos que o sistema financeiro no Brasil não é, em princípio, concentrado demais".

Em uma pesquisa da Fundação Procon SP, comparando as taxas de juros de cheque especial, não se encontrou variação significativa. A menor taxa em 2004 foi de 7,3% ao mês (Caixa Econômica Federal) e a mais alta foi de 8,4% (Banco Real). Tokeshi afirma que "paralelismo de preços não é necessariamente prova definitiva de que houve qualquer tipo de conluio. Isso acontece em outros setores também e é um fenômeno natural em diversos mercados".





Fonte: Agência Brasil

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