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Politica Brasil
Domingo - 25 de Abril de 2004 às 08:40

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O Brasil viveu há 20 anos momentos extremos: nas ruas e praças, milhares de pessoas realizaram os maiores comícios que o país já viu, em um clima de euforia política; no Congresso, os deputados frustraram a vontade popular.

Hoje, mais precisamente na madrugada de segunda-feira, completam-se 20 anos da derrota formal da campanha que buscava restaurar as eleições diretas para a Presidência, a Diretas Já. Faltaram 22 votos para a Câmara aprovar a proposta de emenda constitucional do então deputado pelo PMDB Dante de Oliveira.

"Eu senti uma grande pena (...) senti uma enorme tristeza porque não tínhamos correspondido aos anseios da população", disse o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), na época deputado federal.

Mas se a eleição indireta ganhou sobrevida, o governo perdeu o controle da sucessão do então presidente, general João Figueiredo, e, com isso, a sobrevivência do regime militar.

"Com a Diretas Já veio um processo social, um processo político no qual a população atropelou o projeto dos militares", disse o hoje tucano Dante de Oliveira, ex-governador de Mato Grosso.

"Essa foi uma das poucas vezes em que o povo brasileiro foi agente de um processo (...) o povo atropelou todas as lideranças, superou nossas expectativas."

Dante de Oliveira apresentou a proposta de emenda constitucional restabelecendo as eleições diretas para presidente da República em março de 1983.

A última eleição direta havia ocorrido em 1960. Quando os militares assumiram o poder em 1964, o presidente passou a ser escolhido pelo Congresso, num primeiro momento, e pelo Colégio Eleitoral, alguns anos depois.

Mudando a cara do país

Embora o primeiro evento em apoio à emenda de Oliveira tenha ocorrido em meados de 1983, em Goiânia, um comício organizado pelo PT no estádio do Pacaembu, na capital paulista em novembro daquele ano, pode ser considerado como o marco inicial da campanha popular.

Mas ela só engrenou mesmo a partir do primeiro grande comício, na praça de Sé, também em São Paulo, no dia 25 de janeiro de 1984. E atingiu seu clímax com as megamanifestações no Rio de Janeiro e novamente em São Paulo, já em abril, poucos dias antes da votação da emenda no Congresso.

Para Oliveira, "a campanha mudou a cara do Brasil, inclusive a cara do Colégio Eleitoral".

Pelo resultado das eleições legislativas de 1982, o governo tinha maioria no Colégio Eleitoral - formado pelos deputados federais e senadores e por delegados escolhidos pelas assembléias legislativas dos Estados - que escolheria o sucessor de Figueiredo em janeiro de 1985.

A pressão popular causada pelas manifestações em favor das diretas causou uma reviravolta.

"A campanha foi importante para incentivar o racha do PDS (partido do governo), que levou à criação da Frente Liberal (embrião do atual PFL), ajudando a eleger Tancredo Neves no Colégio Eleitoral", explicou o cientista político David Fleischer, da UnB.

Mas se a democracia foi vencedora no final das contas, sua reimplantação no país teria sido bem diferente se as eleições diretas tivessem sido restauradas já em 1984.

"Se as diretas tivesse sido aprovadas, teríamos um presidente com muito mais força, com muito mais compromisso com as ruas", disse Oliveira. "O presidente que saiu do Colégio Eleitoral tinha que fazer composições."

Fleischer concorda: "Teria sido uma transição (do regime militar para o democrático) muito diferente da transição tutelada que exisitiu durante o governo Sarney."

Já Suplicy resume o que poderia ter sido o Brasil com as diretas vitoriosas em 1984 com um frase: "Se o processo democrático tivesse sido apressado, não teríamos a eleição de Fernando Collor."

Em busca de uma democracia social

Os 20 anos da campanha das diretas coincidiu com a divulgação, nesta semana, de uma pesquisa encomendada pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a democracia na América Latina. Entrevistadas 18.643 pessoas, cerca de 55 por cento disseram que apoiariam um governo autoritário se ele resolvesse os problemas econômicos.

Para Oliveira, embora não exista clima para um regime de força no país, "se a gente não conseguir transformar a democracia em algo palpável, algo que não seja apenas o voto, alguns setores podem ficar suscetíveis a um discurso autoritário que garanta crescimento econômico".

Fleischer explicou essa situação fazendo uma distinção. "A democracia eleitoral vai bem, as eleições são limpas e corretas, já em termos de democracia participativa, democracia social, o Brasil deixa a desejar, com muita gente excluída, alienada, muita gente desempregada."

"O desafio que está posto para a sociedade brasileira hoje é a gente democratizar o econômico e o social no país", concluiu Oliveira.




Fonte: Reuters

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