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Domingo - 24 de Dezembro de 2017 às 08:20
Por: cíntia borges/midianews

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A psicóloga e professora, Jane Cotrin, destaca a importância de discutir sexualidade na escola
A psicóloga e professora, Jane Cotrin, destaca a importância de discutir sexualidade na escola

Diversos acontecimentos, nos últimos meses, trouxeram à luz a discussão sobre a sexualidade infantil. Em setembro, a performance de um artista ,no Museu de Arte Moderna (MAM), em São Paulo, gerou polêmica nas redes sociais.

Um vídeo difundido nas mídias mostra um menino de aproximadamente quatro anos interagindo e tocando o pé do homem pelado. Ativistas criticaram a performance e classificaram a ação como “pedofilia”.

A discussão foi além das acusações, e vieram à tona debates mais aprofundados a respeito da sexualidade na infância: “A criança foi exposta a uma posição não adequada para a idade?”; “O que é pedofilia?”; “Quando deve ser falado sobre sexualidade com as crianças?”.

O psicólogo Lucas Guerra afirma que a polêmica criada em torno do vídeo e da atitude dos pais do menino – de permitir que o filho estivesse na exposição - foi "tempestade em copo d’água".

“O perigo para as crianças não está na nudez, não está em um corpo humano qualquer, natural, especialmente em um contexto artístico. A realidade do Brasil, que verdadeiramente oferece risco para as crianças, é bem outra: uma criança está mais segura com um desconhecido nu do que dentro da própria casa”, afirma.

O psicólogo se refere a pesquisas que mostram que a maior parte da violência praticada contra vulneráveis é cometida por parentes ou conhecidos da família.

Um levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) aponta que, em 2016, 49.497 mil pessoas foram estupradas no Brasil. Desses 70% das vítimas eram crianças e adolescentes.

“De cada dez abusos sexuais contra crianças no Brasil, quatro são cometidos pelo próprio pai e três pelo padrasto, seguidos de tios, vizinhos e primos”, diz o psicólogo.

“Se precisamos falar sobre pedofilia, precisamos falar seriamente sobre pedofilia, e debatê-la com seriedade, e não a partir de subterfúgios moralistas. O subterfúgio apenas mostrou o quanto os adultos desconhecem sobre sexualidade, esses mesmos que se dizem mais competentes que a escola para debatê-la”, completa.

Outro caso veio à tona em novembro, quando um vídeo mostrou um garoto de 13 anos beijando o namorado durante sua festa de aniversário.

Na filmagem, os meninos ainda cantam uma espécie de paródia chula de “parabéns para você”.

O psicólogo afirma que o vídeo chocou por as pessoas acharem que aquilo fosse “uma representação extrema de sexualidade infantil/adolescente desviada”.

“Nós nos chocamos muito sempre com pouco, porque não olhamos a dimensão muito maior que as coisas têm. E tendemos a julgá-la com a moralidade mais presente no nosso sistema psíquico de crenças. Tratamos efeitos como causas, e estacionamos tentando resolvê-las”, diz o especialista.

Ele diz que manifestações de afeto são comuns e natural, e que devemos nos ater a dados mais alarmantes, como o de gravidez precoce.

“Esses exemplos são absolutamente comuns, e não tem orientação sexual ou relação com a moralidade que julga ou não a vulgaridade. Podemos confirmar: aproximadamente 18% das mães no Brasil são crianças e adolescentes”.

"Precisaremos criar estratégias de redução de danos quanto à sexualidade e as tecnologias de informação, porque moralizar este debate, como acontece com qualquer outro, não faz os fenômenos pararem de acontecer".

Introduzindo o assunto

“De onde vêm os bebês?”. A clássica pergunta infantil – que é nome até de livro – é motivo de arrepio para muitos pais. Fato é que, com essa pergunta, as crianças introduzem o assunto “sexo” na família.

Mesmo no século XXI, o assunto ainda é tabu entre muitos pais e até mesmo na escola. Para o psicólogo Lucas Guerra, a fatídica indagação dos pais sobre qual o momento certo de falar sobre sexo tem resposta simples: não há momento ideal – o importante é abordar o assunto em casa.

“Falar sem tabu deveria ser prática, porque tira da naturalização para poder ser refletido, deste modo construindo um sentido, e não apenas gerando medo ou vergonha de recorrer a um adulto de confiança”, destaca o especialista.

Ele diz que a sexualidade infantil tem início muito antes do que os pais imaginam. Fatores sociais como ter vergonha de sair sem blusa, para meninas, “são demarcações de gênero e de sexualidade”.

Lucas Guerra explica que com o acesso facilitado de crianças e jovens à internet e, com isso, a conteúdos pornográficos, estereótipos e conteúdos inadequados à idade podem chegar até o adolescente.

“A internet pode construir estereótipos de corpo que causam sofrimento a quem não se adequar, para além de implantar fantasias adultas muito amadurecidas e extremas como símbolos de sexualidade a serem perseguidos”.

Conforme o especialista, o assunto deve ser abordado também nas escolas, e ter apoio dos pais em casa. “Não falar sobre as coisas não faz com que as coisas deixem de existir, apenas não dão significados respeitosos e legítimos”, conta.

Escola como apoio

Além da educação e orientação dada dentro de casa às crianças e adolescente, é necessário apoio escolar.

A psicóloga e especialista em educação Jane Cotrin explica que a escola não é local apenas do aprendizado cartesiano, é também onde as crianças expressam suas emoções. É nele que devem ser levantadas questões sobre a sexualidade.

“Se não podem discutir, elas vão dando interpretações pessoais ou do grupo de amigos que podem ser muito confusas. Então, esse é um papel importante da escola: auxiliar as crianças a interpretar o que estão vendo. Evitar o assunto ou fingir que não existe além de não ajudar, piora muito os conflitos pelos quais toda criança passa com o crescimento”, pontua.

Para a psicóloga, é primordial que a criança tenha voz no espaço escolar para discutir o que faz parte do seu cotidiano – e a sexualidade é uma delas.

“É como se o que estão sentindo não fosse importante ou até mesmo que não existisse! É muito angustiante não compreender o que está acontecendo com o próprio corpo e com as emoções. Quando a escola não discute, ela nega a própria sexualidade humana! E o que é pior: não auxilia as crianças a interpretar a realidade”, afirma.

“As crianças veem cenas de sexualidade o tempo todo: em casa, na internet, nas músicas, em danças, na televisão, com os amigos falando. Se elas discutem na escola, podem interpretar o que estão vendo de uma maneira mais tranquila, mais séria, aprendendo a cuidar de si mesmas e do próprio corpo, respeitar as outras pessoas, se proteger”.

Mesmo considerado a importância no meio acadêmico, o assunto “sexualidade” ainda é tratado como tabu dentro das instituições de ensino infanto-juvenis. “É necessário que a escola tenha espaços contínuos de discussão sobre este assunto desde a educação infantil”

A psicóloga alerta que a falta de abordagem do assunto em casa, pode gerar consequências graves, como o de abusos sexuais.

“O fato de nos calarmos diante da sexualidade das crianças e jovens tem aumentado a violência a que estão submetidos e a que submetem”, diz especialista.





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