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Politica Brasil
Quinta - 14 de Setembro de 2006 às 09:40
Por: Francisco Viana

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Uma boa reputação é como a empresa falando dela mesmo pelas suas atitudes práticas. No Brasil dos dias atuais, a linguagem dos fatos sugere que os cuidados com a boa reputação estão ficando, a cada dia, mais distante do que seria ideal.

Vejamos alguns números emblemáticos:

· 350 mil processos contra bancos , por parte de clientes que se sentem lesados, de acordo com dados de estudos Ibemec Direito, com base em amostras pesquisadas em São Paulo e Rio de Janeiro.

· 1.105 queixas de consumidores de cartões de crédito registradas no Procon, somente nos seis primeiros meses de 2006, o que representa 37,81% de todas as reclamações feitas contra instituições financeiras.

· 4.532 reclamações formais , também no Procon, contra companhias aéreas.

Os números são muito mais abrangentes quando se contabilizam processos e queixas contra companhias telefônicas, serviços públicos em geral e empresas de bens de consumo. Isto sem levar em conta os desgastes que a reputação das empresas têm sofrido com demissões e reestruturações feitas sem planejamento da comunicação junto à opinião pública, a exemplo do que aconteceu recentemente com a Volkswagen, no ABC paulista. A VW recuou das demissões anunciadas, em número superior a três mil, mas ficou a nódoa do comportamento socialmente não responsável.

Virou lugar comum entre muitas empresas virar as costas para o ambiente político. O fenômeno não é monopólio brasileiro, mas mundial. Agora mesmo, a Hewlett-Packard enfrenta nos Estados Unidos forte pressão por parte da mídia porque cometeu irregularidades – a quebra de sigilo telefônico de diretores da empresa e de jornalistas – na tentativa de apurar um caso de espionagem. Não deu certo. O presidente da HP deverá perder o posto, pelo que noticiam os jornais americanos, entre eles o New York Times.

O que ocorre hoje é um grave conflito no campo do discurso e da prática. Como o lucro está sempre em primeiro lugar, o discurso de responsabilidade corporativa acaba sempre sendo mais intenso do que demonstram os testes da realidade. O resultado é que as empresas perdem sempre. Prometem respeitar a força de trabalho, o meio-ambiente, os direitos humanos, as comunidades e as relações comerciais. Não cumprem. Os escândalos se sucedem. Se os políticos pecam pela corrupção, as empresas têm pecado por não perceber a força do cidadão e a evolução do aparato legal.

O caso brasileiro merece reflexão. Se o judiciário estivesse funcionando com agilidade, muitas empresas estariam com os dias contados ou já teriam quebrado dado ao volume de indenizações a pagar. O drama, porém, não é atenuado pela morosidade do judiciário. Cedo ou tarde a bomba relógio irá explodir e a conta terá que ser paga.

Em meio às empresas, os processos causam danos de toda ordem. Redução do valor das ações, queda dos financiamentos públicos e, claro, a perda de clientes. E há as pressões contra os governantes que precisam agir, sob pena da perda de votos. Como as perdas se acumulam, corroem por dentro e por fora a sustentabilidade dos negócios e dos administradores ineptos ou que fazem do desrespeito á lei um modelo de negócio. Não chegamos ainda ao estágio Europeu e Americano onde a sociedade tem se mobilizado para atacar frontalmente dissintonia entre o discurso e a prática das empresas. Mas vamos chegar lá.

O ativismo está chegando em marcha forçada. Um estudo da consultoria Strativity Group, divulgado pela revista Exame de setembro deste ano, revela que as empresas vêm deixando os clientes em segundo plano, embora apregoem que ele está sempre sem primeiro lugar. Conclui: 90% das empresas não têm a mínima idéia do impacto financeiro das reclamações causam aos seus negócios. Mais: 70% admitem que seus lideres não mantêm contato com freqüente com os consumidores e somente 46% afirmam que seus clientes estão satisfeitos. Os dados são de 2005 e fazem parte de um levantamento global. Seria diferente no Brasil? Não. Certamente, aqui as coisas devem estar bem pior.

Adam Smith, o pai fundador da economia política, nunca fez segredo de que seu livro principal não era a Riqueza das Nações, mas a Teoria dos Sentimentos Morais, publicado em 1759. Argumentava que a ética vinha antes da riqueza e que esta, a ética, era a verdadeira fonte do progresso. Terçou vasta polêmica com um contemporâneo, Bernard Mandeville, autor da Fábula das Abelhas, que pregava exatamente o contrário. Eram os “vícios privados” o verdadeiro motor das “virtudes públicas”. Isto é, sem a cobiça, a prepotência, o orgulho e, sobretudo, a vaidade e a arrogância, as sociedades estariam condenadas à pobreza. Visto à luz dos dias atuais o mundo dos negócios terá que caminhar mais para Smith não para Mandeville. No Brasil, graças à liberdade de expressão, a força das leis está na base de uma revolução ética que pode não ser vista em sua vastidão, mas , que ninguém tenha dúvidas, é inexorável. Pois nenhuma empresa pode viver em conflito permanente com as leis e o cidadão.

Fica uma sugestão: o Judiciário bem que poderia organizar uma campanha para informar às empresa quanto aos impactos das reclamações dos clientes. E as empresas, por sua vez, deveriam mudar os modelos de negócios e conversar com a sociedade para resolver os litígios. Porque a bomba relógio que está sendo montada é muito ruim para todos, em especial agora quando se pensa numa retomada da economia. Inclusive, reflete negativamente na imagem/reputação do Pais no interior, onde temos a fama de sermos muito burocrático e de não nos sairmos muito bem no quesito – importantíssimo – da segurança jurídica.

* Jornalista em São Paulo e autor do livro Hermes, a Divina Arte da Comunicação.





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