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Politica Brasil
Domingo - 05 de Março de 2006 às 09:17
Por: Adriana Vandoni

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Em economia existe uma teoria que a princípio pode parecer meio torta, mas é uma das mais fiéis radiografias do Brasil, “A maldição das riquezas naturais”, muito citada por Bresser Pereira e Rubens Ricúpero. Segundo essa maldição, países que possuem riquezas abundantes ou que são abençoados por Deus, costumam fadar-se à “desindustrialização”. Isso ocorre, por exemplo, com a Venezuela e sua enorme exportação de petróleo, que garante o "sustento" da nação, mas leva a um desleixo em relação à busca de saldo na exportação de outros setores.



Por essa teoria, esses recursos naturais proporcionam superávits na balança comercial, e servem como âncora monetária, tendendo à acomodação e depreciação de outros setores da economia. Ou seja, no Brasil, enquanto a produção agrícola estiver, por exemplo, mesmo que aos trancos e barrancos, proporcionando divisas, o país não vai orientar sua política cambial para outros setores que podem agregar valor à produção primária e que, consequentemente, tragam desenvolvimento econômico que é o aumento da renda por habitante ou o aumento do valor agregado por habitante. O país corre, então, o risco de se tornar uma Venezuela. Bem que Chávez, ou Chapolim Colorado, e o nosso molusco, sonham com isso, mas eles não sabem o que significa.

Por coincidência, estava lendo Bresser Pereira e a sua “Maldição” quando recebi um trabalho que me foi enviado por Paulo Rabelo de Castro, feito para a Federação do Comércio de São Paulo, chamado “Agenda 2007”. Logo no primeiro tópico Paulo diz: “O Brasil tem a desvantagem relativa de se enxergar rico por natureza, o que lhe traz, como sociedade, certa despreocupação no planejamento do seu progresso material e social”.

Por exemplo, pela teoria da “Maldição”, produtos como minério de ferro, onde somos competitivos e grandes exportadores, e a nossa produção agrícola, mesmo causando atualmente um arrocho na renda do produtor, proporcionam um bem estar à economia do país, pois sua produtividade vem aumentando a cada ano e a cada safra em decorrência das nossas bênçãos naturais. Pela teoria da “Maldição” isso induziria a uma política cambial que privilegiasse esse setor primário, porém, hoje não se privilegia nem a produção primária, nem a indústria. A política cambial no Brasil favorece apenas o investimento financeiro. Ouso dizer que o governo Lula adotou a teoria da “Maldição dos Recursos Eleitorais”.

Essa é a situação do Brasil, estamos deitados em berço esplêndido e perdendo o bonde da história. Acomodados nas benções de Deus e dilapidando cada vez mais os recursos naturais, desmontamos a capacidade já instalada, desperdiçando talentos, e tudo isso por falta de planejamento e investimentos alocados nos pontos estratégicos que possibilitariam maiores vantagens. Essa seria uma visão macro da economia, onde não adianta superávits em setores localizados e de grande importância na economia, sem que façamos um planejamento de forma a sairmos dessa situação de acomodação. Por isso, a riqueza de uma nação só ocorre quando se tem ciência e se trabalhe simultaneamente com um pensamento macro e micro da economia.

Enquanto se pensa em uma agricultura sustentável, eu penso que nunca isso será possível, estável e duradouro, sem que se distribuam empregos e renda aos diversos outros setores da sociedade, sem que se trabalhe e atue a favor dos nossos produtos de exportação menos competitivos. Atuando na política cambial para ajudar esses setores menos competitivos, auxiliaremos naturalmente os mais competitivos.

Pensando o micro, vamos pegar o caso da pecuária de Mato Grosso e seu rebanho de 27 milhões de cabeças espalhado em 24 milhões de ha. O secretário de Desenvolvimento Rural do estado de Mato Grosso, Clóves Vettorato, lança nesta segunda-feira (06/03) a "Jornada Técnica da Pecuária", que será realizada em 60 municípios. Conheço o projeto e os objetivos desejados. Louvo e reconheço a importância de trabalhos como esse que pretende dar mais eficiência e competitividade ao setor. É a parte que lhes cabe fazer, e isso deve ser reconhecido pelo setor. Mas sem que o governo federal adote medidas que beneficiem a economia como um todo, estaremos todos, inclusive o setor pecuário, fadados a viver eternamente em crises sazonais, como a que vivemos atualmente, não pela fraqueza do setor, mas pela visão estreita dos gestores da nossa economia. Não basta apenas ter competência aqui se são tão incompetentes em Brasília.

Adriana Vandoni Curvo é economista, especialista em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas / RJ. Articulista do Jornal A Gazeta Cuiabá / MT. E-mail: avandoni@uol.com.br




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