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Sexta - 16 de Novembro de 2007 às 11:44
Por: Carlos Eduardo Lemos

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O perigo estava bem perto – e pode até voltar. Na Serra do Cachimbo, localizada no sul do estado do Pará e ao norte do estado do Mato Grosso, numa zona de transição entre a Amazônia e o cerrado, militares brasileiros desenvolveram secretamente experiências para construção da bomba atômica. No local, testes atômicos – baseados no enriquecimento de urânio – foram realizados de forma ultra-secreta. O assunto discutido e debatido na segunda metade da década de 80 voltou à baila depois que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, admitiu que o Brasil poderá reforçar a capacidade militar, inclusive com o uso de recursos nucleares, por causa da nova jazida de petróleo, descoberta na Bacia de Santos.

A posição do ministro foi defendida na noite de quinta-feira em evento sobre segurança no Rio de Janeiro. O ministro afirmou que o governo deve tentar obter um submarino nuclear para proteger melhor a megajazida. “Esse fato do descobrimento aguça mais a necessidade de termos autonomia de produzir no Brasil a energia nuclear, fechando o ciclo do enriquecimento do urânio para a produção de propulsores" - disse Jobim. "Não é para a área de guerra, de bomba atômica. Essas coisas são bobagem”.

Mesma história contada na quase cômica corrida nuclear brasileira da década de 80. Na época, o presidente José Sarney anunciou que o Brasil já dominava a tecnologia do enriquecimento do urânio. "É este o momento de reiterar, com ênfase e solenidade, as finalidades exclusivamente pacíficas do programa nuclear brasileiro” – disse. O acréscimo, segundo a revista Veja da época, fazia-se necessário, já que o domínio do processo de enriquecimento do urânio, combustível radioativo, tanto poderia levar à fabricação de pilhas atômicas para centrais elétricas como à produção de bombas. Não se sabe exatamente quanto custou o programa, embora se possa ficar com a estimativa que o coloca num patamar superior a 1 bilhão de dólares por ano.

Com mais 4 bilhões de dólares e dentro de cinco anos, o Brasil poderia ter sua bomba atômica, porque a receita já terá sido aprendida, segundo publicou na época a revista. “É mesmo possível que esse avanço não tenha como alvo verdadeiro a fabricação de armas nucleares. Mas desde 1967 os governos brasileiros se recusam a assinar o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, pelo qual mais de 100 países se comprometeram a não fabricar bombas. As indicações que se podem colher no caso brasileiro apontam para a direção explosiva. Todos os países que pesquisam o ciclo do urânio negam sempre intenções bélicas até o momento em que elas se tomam evidentes, como se observou nos casos recentes da nuclearização de nações como Índia, China e Israel” – publicou.

De acordo com a publicação da época, os militares brasileiros queriam distância da bomba, mas providenciaram ficar próximos das ferramentas necessárias para iniciar a confecção de um artefato explosivo. O Brasil manejou bilhões de dólares em contas secretas, fez importações clandestinas, envolveu-se com tráfico de tecnologia, subornou estrangeiros, escondeu atentados e enganou até presidentes da República para fabricar a bomba atômica, mas o delírio do governo brasileiro foi enterrado na década de 90.

Cheio de sombras, o programa nuclear começou a ruir no próprio governo Sarney, quando o presidente se aproximou do seu colega argentino, Raúl Alfonsín, e fez um acordo de paz nuclear para sepultar rivalidades. No governo seguinte, de Fernando Collor, se soube que a Aeronáutica tinha buracos na Serra do Cachimbo, na fronteira de Mato Grosso com o Pará, para fazer testes nucleares. Até esse buraco havia sido ocultado pelos militares.

Collor, ao assumir, recebeu um relatório, com tarja de ultra-secreto, capa vermelha e cinqüenta páginas. Era o mapa da bomba, mas nada falava da Serra do Cachimbo. Quando soube do campo de testes, Collor foi ao local e fechou o buraco simbolicamente com uma pá de cal, em setembro de 1990, sepultando o programa.

Em julho de 1998, pouco mais de uma década depois da publicação da reportagem de VEJA, o presidente Fernando Henrique Cardoso acabou de vez com o dispendioso sonho da bomba brasileira. Diante do secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan, FHC assinou o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, o TNP.

Produzido em 1968, o TNP abre o país à fiscalização internacional de suas instalações nucleares e proíbe o uso da energia nuclear para fins bélicos. Além do TNP, o presidente ratificou outro acordo, endossado por apenas dezesseis países, que proíbe até testes nucleares. Na prática, a assinatura tinha pouco efeito, pois o Brasil já recebia fiscais internacionais.

Mas o gesto teve enorme significado simbólico. Enterrou, definitivamente, a era em que o Brasil quis virar uma potência nuclear bélica. Ao mesmo tempo em que o programa era encerrado, as manobras clandestinas para fazer a bomba continuavam cercadas de mistério. Já houve até uma CPI no Congresso para investigar o assunto, mas nunca se soube em detalhes o que ocorria nos subterrâneos do programa nuclear. Sabe-se, por exemplo, que documentos e arquivos a respeito do programa sumiram - assim, é improvável que o país descubra no futuro tudo o que se passou nos porões do projeto.

Em abril de 2004, a polêmica sobre as ambições nucleares brasileiras voltaram a ganhar destaque depois que uma reportagem do jornal Washington Post revelou os avanços do país no enriquecimento de urânio. O país resistiu às inspeções internacionais, dizendo que elas ameaçariam sua soberania.

Uma reportagem de Veja revelou que, na verdade, o Brasil temia ver descobertos os procedimentos pouco ortodoxos que utilizou para obter seus equipamentos - o projeto não teria, de fato, desdobramento bélico. O governo voltou a garantir que não precisa ter seu programa nuclear inspecionado porque suas intenções são pacíficas - mas a insistência em barrar os técnicos estrangeiros levantou dúvidas entre a comunidade internacional e voltou a levantar suspeitas sobre os planos do país.





Fonte: 24 Horas News

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