GUERRA DO BISTURI
Falta de alvarás deve resultar no fechamento de hospital em Cuiabá na 5ª Atual gestão alega que novos donos ainda não conseguiram documentos para manter funcionamento
Passados quase 30 dias da data de cumprimento da decisão liminar do Tribunal de Justiça, que passa o comando do Hospital Jardim Cuiabá para a Importadora e Exportadora Jardim Cuiabá, não houve ainda apresentação da documentação necessária para o pleno funcionamento do hospital, como autorização da Vigilância Sanitária, licenciamento ambiental, credenciamento junto ao Conselho Regional de Medicina (CRM), bem como qualquer esforço em prol da compra de equipamentos, medicamentos e contratação de funcionários. Sem as certidões a empresa não consegue comprar medicamentos ou firmar convênios de saúde.
A denúncia é dos arrendatários que deixarão a gestão do hospital. Aliás, o médico Arilson Arruda tem abordado o assunto em comerciais nas principais emissoras de televisão da capital do Estado.
Conforme a decisão do TJ, fica rescindido antecipadamente o contrato de arrendamento do imóvel do hospital, e de alguns equipamentos de 2003, que devem ser devolvidos até a próxima quinta-feira (19), data em que se encerram as atividades da atual administração. Por meio de nota, a Importadora e Exportadora Jardim Cuiabá alega plenas condições de assumir o hospital e nega demissão em massa ou prejuízos à população devido a decisão judicial.
Até o momento, porém, o único documento apresentado foi o alvará de funcionamento e localização, autorizado pela Prefeitura de Cuiabá, cujo endereço pertence a uma casa em ruínas no bairro Jardim Cuiabá. Este mesmo endereço consta no cartão de CNPJ emitido pela Receita Federal.
Segundo o advogado da empresa Hospital Jardim Cuiabá Ltda, André Cardozo, a insuficiência de informações pode ter induzido o Judiciário em erro. “A Importadora informa que tem condições de operar um hospital, mas não exibe as autorizações legais. Para exercer a atividade hospitalar são necessárias diversas autorizações do Poder Público, tais como Alvará de Localização e Funcionamento, sendo curioso que a Prefeitura autorize qualquer operação hospitalar numa casa abandonada; CNES – Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde”, explica.
Segundo Cardozo, a documentação também é indispensável para contratação junto às Operadoras de Saúde e compra de medicamentos. “Sem o Alvará da Vigilância Sanitária não se pode comprar medicamento, conforme artigo 21, da Lei 5991/73. A operação sem essa autorizações é simplesmente ilegal. Não se sabe como comprarão medicamentos. Veja que retrocesso para a nossa comunidade: perde um hospital com Certificação ONA e ganha um que opera de forma ilegal”, observa o advogado.
Além da documentação, também não foi apresentado, por parte da Importadora e Exportadora Jardim Cuiabá, planos ou qualquer iniciativa na compra de equipamentos, contratação com os Planos de Saúde e contratação de funcionários. O Hospital Jardim Cuiabá reclama que não tem para quem passar as informações mais básicas dos pacientes internados.
Atualmente o hospital atende mais de seis mil pacientes, conta com 670 funcionários e 48 contratos de prestação de serviço. Com a mudança, o hospital perde ainda todos os seus convênios, incluindo o MT Saúde, o alvará sanitário, a certificação de qualidade e o contrato com todos os seus fornecedores. “Em nossa percepção o Judiciário tem sido induzido em erro, porque há da parte contrária simples promessas de que são capazes de administrar o hospital e promessas de exibição dos documentos necessários. Reiteramos o nosso respeito e confiança no Judiciário, de que possam rever a decisão que tomaram”, pontua Cardozo.
Com a decisão, o hospital passa a operar somente com a estrutura e equipamentos arrendados em 2003, uma vez que a decisão judicial prevê a devolução do imóvel e de equipamentos arrendados no início da vigência da atual administração. Assim, aqueles obtidos ou substituídos posteriormente pertencem, segundo contrato, ao Hospital Jardim Cuiabá Ltda. “O contrato de arrendamento é muito claro: o que foi arrendado foram o imóvel, alguns equipamentos e alguns leitos, em quantidade muito menor do que o que se tem hoje. Os demais poderão ser retirados do imóvel na data de cumprimento decisão, na expectativa de, no menor espaço de tempo possível, o Hospital Jardim Cuiabá retomar suas atividades em local diferente”, enfatiza o advogado.
O CASO
Após uma decisão de 1ª instância, favorável ao rompimento, a atual gestão entrou com recurso que foi julgado pela 1ª Câmara de Direito Privado. A desembargadora Clarice Gaudino, relatora do processo, suspendeu e criticou a decisão judicial da 1ª instância. Porém, no julgamento definitivo do recurso, votou pela cassação da liminar e rescisão do contrato.
O desembargador João Ferreira, que já havia analisado o caso anteriormente, pediu vista e proferiu voto divergente, inclusive tecendo críticas ao voto da relatora e considerou a decisão de primeira instância ilegal.
Para o desembargador, a rescisão do contrato não poderia ocorrer somente porque a Importadora alegou prejuízos financeiros com o arrendamento, “porque trata-se de uma causa complexa, que exige robusta produção de provas da defasagem e dos atos de gestão temerária”.
Além da produção de provas, o principal argumento do desembargador para manutenção do contrato, são os prejuízos que a rescisão irá acarretar para a gestão do hospital e para a área da saúde em Cuiabá e Mato Grosso. “Acarretará lesão não só aos direitos dos agravantes, mas também implica em inafastável risco de prejuízos irreparáveis à coletividade, posto que a interrupção repentina dos serviços médico-hospitalares deixará sem atendimento os pacientes, bem como os usuários do Hospital Jardim Cuiabá, sem contar as demissões que ensejará”, pontuou o Ferreira.
A desembargadora Clarice fundamentou a decisão especialmente no fato de ter havido congelamento de preço do valor locatício em R$ 60 mil, o que acarretaria prejuízos para a Importadora. “A própria parte contrária admite receber o valor de R$ 140 mil por mês, valor inclusive, superior ao que prefeitura paga pelo Hospital das Clínicas, R$ 135 mil”, afirma Cardozo, que lamenta que essa decisão tenha sido tomada antes da fase de produção de provas. “Comprovaríamos que o Hospital Jardim Cuiabá quitou dívidas da Importadora que hoje somariam mais de R$ 60 milhões. Apenas a dívida da Importadora junto ao Banco do Brasil, onde estava hipotecado o imóvel, era, na época do pagamento, de aproximadamente R$ 40 milhões”.
O Hospital Jardim Cuiabá impetrou recurso contra essa decisão, e espera o julgamento. Após isso, será também manejado recursos ao STJ e STF.
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