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Policia MT
Segunda - 11 de Março de 2024 às 10:30
Por: Vinicius Mendes/Gazeta Digital

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Relatório da 1ª Pesquisa do Comitê para a Análise dos Feminicídios do Estado de Mato Grosso revelou que 40% das vítimas de feminicídio do primeiro semestre de 2023 tinham menos de um ano de relacionamento com o autor do crime e 70% delas filhos menores de idade. Apenas nos primeiros meses do ano passado foram 15 mulheres assassinadas por companheiros.

Os resultados da pesquisa foram apresentados às autoridades e à toda sociedade nessa quarta-feira (6), no evento organizado pela Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (Cemulher-MT), realizado na sede do Judiciário, em Cuiabá. O relatório analisou os 15 primeiros feminicídios ocorridos em Mato Grosso entre janeiro e maio de 2023.

Foi revelado, por exemplo, que 80% das vítimas não tinham medida protetiva, 60% não tinham boletim de ocorrência registrado, quase 70% deixaram filhos menores de idade, quase 47% tinham entre 26 e 39 anos de idade, 60% foram declaradas da cor parda, 67% dos familiares tinham conhecimento da violência, mas não denunciaram, 73% das vítimas tinham renda suficiente para manter a família, 40% delas tinham menos de um ano de relacionamento com o autor do crime.

Para obter as informações, a assistente social Adriany Sthefany de Carvalho e a psicóloga do Cemulher Renata Carrelo da Costa, e servidoras da Defensoria Pública do Estado (DPE-MT) foram a campo e entrevistaram familiares e amigos de 15 vítimas de feminicídio, nos municípios de Cuiabá, Várzea Grande, Cáceres, Mirassol D’Oeste, Pontes e Lacerda, Paranaíta, Sorriso, Sapezal, Barra do Bugres, Campo Verde e Paranatinga.

De acordo com a juíza Ana Graziela Vaz de Campos Alves Correa, titular da 1ª Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Cuiabá e membro do comitê, o objetivo do levantamento analítico é saber onde estão as falhas no combate à violência doméstica e prevenção ao feminicídio e detectar as áreas que necessitam de mais investimento por parte do Poder Público.

“Apesar de mais de 90% da população conhecer a Lei Maria da Penha, entende muito pouco dos seus direitos, quando a mulher precisa pedir a aplicação da Lei Maria da Penha, quais são os tipos de violência que existem. Por isso precisamos investir em campanhas sobre a Lei Maria da Penha para toda a população e também entendemos a necessidade de novas delegacias 24 horas e de mais estrutura para a Patrulha Maria da Penha. Para tudo isso precisa de orçamento, então precisamos dar acesso à população, desde as comarcas maiores até a população rural, ao sistema de segurança pública e justiça”, analisa a juíza Ana Graziela Vaz, que fez questão de entregar em mãos o relatório da pesquisa às autoridades presentes no evento.

Essa falta de conhecimento sobre a aplicação prática da Lei Maria da Penha por parte dos familiares e amigos das vítimas de feminicídio, que foram entrevistados na pesquisa, também foi destacada pela assistente social do Cemulher, Adriany Sthefany de Carvalho, que reforçou a necessidade de que os profissionais que recebem as denúncias estejam atentos e façam uma escuta aprofundada sobre os casos.

“A gente precisa que nos locais mais longínquos chegue essa informação e que esse serviço realmente funcione, principalmente nas cidades do interior, porque, às vezes, o que é tão óbvio pra gente que trabalha com isso diariamente, naquele interior onde raramente a mulher tem acesso, aquela informação não chegou. Então a gente precisa buscar meios para que todas elas tenham o conhecimento sobre as medidas protetivas, sobre a rede de enfrentamento, sobre os serviços que estão disponíveis e os encaminhamentos que podem ser feitos”, afirmou.

A vice-presidente do TJMT, desembargadora Maria Erotides Kneip, destacou que a pesquisa é importante para que o magistrado e demais operadores da lei saibam a extensão das consequências dos feminicídios.

“Essa pesquisa é tudo o que nós precisamos para poder pautar, principalmente, as nossas ações no Poder Judiciário. Nós, magistrados, fazemos a dosimetria da pena a partir de uma série de circunstancias legais e judiciais, mas as consequências extrapenais do feminicídio vão nos ajudar a fazer apenações muito mais severas e, inclusive, com manutenção de prisões para a prevenção do feminicídio”, afirmou, pontuando ainda que a pesquisa está em sintonia com o protocolo de julgamento sob a perspectiva de gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Este ponto também foi levantado pela delegada de Polícia Civil do Estado do Piauí, Thaís Lages Paz, que proferiu palestra com o tema “Feminicídio e a atuação com Perspectiva de Gênero”.

“É uma determinação do CNJ que os tribunais preparem os magistrados e as magistradas para julgar com perspectiva de gênero, que é ter um olhar diferenciado nos casos que envolvam violência contra a mulher, tanto a violência íntima, familiar e o crime mais bárbaro, que é o feminicídio. Não julgar como um homicídio porque o feminicídio tem peculiaridades e características diferentes”, pontua.

Perspectiva racial da violência contra a mulher

O relatório sobre feminicídios mostrou que 60% das vítimas foram declaradas como pardas, o que, para a assistente social e representante do Fórum de Mulheres Negras de Mato Grosso, Glória Maria Grandez Munhoz, aponta a necessidade também de políticas públicas que estejam atentas à perspectiva racial, além da perspectiva de gênero sobre a violência contra a mulher.

“São mulheres pretas, mulheres da periferia, mulheres que deixam filhos e filhas pequenos órfãos, mulheres com marcador social de vulnerabilidade evidente, que por estarem morando nas periferias e ter todas as condições biológicas, sociais e econômicas, são mulheres marcadas muitas vezes pela violência, não só pelo companheiro, mas da própria sociedade e da família, que não compreende que a violência contra as mulheres, que o patriarcado e que o machismo matam. Há urgência em desenvolver um trabalho de prevenção, de diálogo com as mulheres e com toda a sociedade e de comprometer o Estado com políticas públicas que possam realmente trazer melhoria de condições de vida dessas mulheres”, disse.





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