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Opinião
Segunda - 26 de Julho de 2010 às 15:21
Por: Rafael Cervone Netto

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A indústria têxtil paulista é pioneira em produção mais limpa. Na década dos 90, quando o tema ainda era incipiente, participou de um programa piloto da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), que mapeou fábricas para dimensionar o consumo de energia e água e verificar a geração e disposição de resíduos. O diagnóstico foi um passo relevante para desencadear um processo de modernização produtiva focada na questão ecológica.

Verifica-se, agora, outro avanço: o Sinditêxtil (Sindicato da Indústria Têxtil do Estado de São Paulo) lançou o Manual de Indicadores de Desempenho Ambiental (água consumida e água reutilizada, energia, carga orgânica, geração total de resíduos e a sua parcela reciclável). O objetivo é contribuir para que número crescente de empresas adote processos produtivos cada vez mais sustentáveis, respondendo ao desafio prioritário da humanidade de reverter as mudanças climáticas e recuperar a salubridade do habitat.

Para se ter ideia do alcance da iniciativa, ela aplica-se a um parque empresarial que se constitui no principal exportador da moda brasileira, emprega 518 mil trabalhadores, fatura cerca de R$ 28 bilhões, recolhe R$ 1 bilhão em impostos anualmente e é responsável por cerca de 40% do faturamento de toda a indústria têxtil e de confecção do Brasil. Portanto, justifica-se de modo pleno o esforço despendido na elaboração do manual técnico, resultante de abrangentes estudos, realizados ao longo de dois anos.

A preocupação com a sustentabilidade é um compromisso inalienável de empresas, entidades de classe e governos. Não fosse a consciência ambiental, intrínseca às sociedades civilizadas, há toda uma questão relativa ao marketing e ao comércio interno e externo. Povos e nações tendem a repudiar bens e produtos processados à revelia da proteção ambiental, de condições humanas de trabalho, de salários dignos e da qualidade dos insumos e matérias-primas. Espera-se, assim, que os investimentos que temos feito em sustentabilidade,  qualidade, pesquisa/tecnologia, inovação e design nos credenciem a ingressar nos mais exigentes e politicamente corretos mercados. Nesta década, a indústria têxtil brasileira já investiu mais de R$ 10 bilhões nessas áreas, sendo São Paulo o carro-chefe na aplicação desses recursos.

Estamos fazendo grande esforço para ampliar o mercado externo, tendo a qualidade e o compromisso com a sustentabilidade como diferenciais competitivos relevantes. Nos primeiros cinco meses de 2010, as exportações da indústria têxtil paulista foram de US$ 191,1 milhões, o que significa aumento de 32,48% na comparação com os US$ 144,2 milhões registrados no exercício anterior. O número seria de fato expressivo caso as bases de comparação não fossem tão baixas. No mesmo período de 2008, antes da crise mundial, o valor exportado era de US$ 212 milhões.

Na verdade, estamos nos recuperando lentamente, mas não chegamos às performances pré-crise. Contudo, é um alento saber que numerosos consumidores, de muitos países, têm acesso aos nossos produtos. As importações de têxteis e vestuário, por outro lado, continuam vultosas. De janeiro a maio, foram de US$ 443,7 milhões (mais 21,72% ante os US$ 364,5 milhões de 2009), resultando em déficit de US$ 252,6 milhões na balança comercial, 14,66% maior em relação a igual período de 2009.

O irônico é que, enquanto investimos em sustentabilidade e qualidade, nosso mercado está exposto a imensa quantidade de produtos fabricados sem grandes preocupações quanto àqueles quesitos da economia civilizada. Isto afronta o conceito de consumo responsável. Mais do que nunca, o ato de comprar não pode ser dissociado de uma atitude cívica perante as consequências sociais e ambientais inerentes à produção. Tal consciência é fundamental, inclusive na formação das novas gerações. Um desconfortável exemplo quanto a produtos alheios a esses valores é o comércio bilateral com a China (saldo negativo de US$ 140,77 milhões na soma de janeiro a maio). Este, aliás, é um dos principais pontos de desequilíbrio da balança.

É óbvio que a indústria têxtil de São Paulo continuará investindo em produção limpa, aprimoramento tecnológico, excelência e design. Afinal, jamais aceitaremos ter como parâmetro de competitividade as práticas de economias não alinhadas às leis de mercado e aos paradigmas da responsabilidade socioambiental. Considerando essa inegociável premissa, seria muito importante que se mitigassem nossas expressivas desvantagens ante concorrentes internacionais quanto aos juros, impostos, acesso ao crédito e taxa de câmbio. O consumidor brasileiro ficaria eternamente grato!


*Rafael Cervone Netto
é o presidente do Sinditêxtil-SP e presidente em exercício do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp).



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