Vale a pena regulamentar a internet? Podemos opinar.
Já está praticamente pronta a minuta de Projeto de Lei do Marco Regulatório Civil da Internet do Brasil, com texto elaborado pela Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, em parceria com a Escola de Direito do Rio de Janeiro. O objetivo é estabelecer regras e responsabilidades de usuários e empresas com acesso à rede. É um projeto que divide opiniões. De um lado estão os que consideram que a internet, com sua característica de reunir várias mídias, deve ser um território livre, não regulamentado. Do outro lado, estão os que julgam ser a internet um instrumento poderoso demais, e como tal precisa de regras que garantam segurança e previsibilidade às iniciativas feitas na rede. Espera-se que a minuta seja encaminhada à Câmara dos Deputados, ainda este ano.
Primeiro, é preciso entender que o Marco Regulatório em questão nada tem a ver com o combate aos chamados "crimes cibernéticos", que motivaram uma Convenção Internacional de Cibercrimes, endossada por poucos países devido à complexidade do tema. O movimento contra esse tipo de crime vem ganhando corpo nos Estados Unidos e em especial na União Européia, onde, desde 2001, vem sendo respaldado pelo Conselho Europeu contra os Cibercrimes.
Em abril passado, o tema também foi objeto de discussões no 12° Congresso da ONU sobre Prevenção ao Crime e Justiça Criminal, realizado no Brasil, em Salvador, onde se tratou, entre outras coisas, da necessidade de cooperação jurídica internacional e de discussões mais avançadas sobre crimes praticados pela internet, como invasão de hackers em agências de segurança e instituições bancárias, crime de ofensa e calúnia, direitos autorais, uso indevido de imagens, pornografia infantil, racismo etc. Já tramita, no nosso Senado, um projeto de lei, em fase inicial, de autoria do senador Eduardo Azeredo, que tipifica esse tipo de crime. No momento, agressões e difamações pela internet continuam a ser julgadas com base na Constituição.
O Marco Regulatório brasileiro segue o exemplo de países ditos mais desenvolvidos, que primeiro adotaram o marco civil, para depois enfocar o aspecto criminal. Em princípio, a proposta, em 33 artigos trata de questões relacionadas ao direito de acesso à internet, provedores e qualidade das conexões, responsabilidade e guarda dos registros de acesso dos usuários, responsabilidade do conteúdo disponibilizado na rede, sigilo das comunicações, não degradação da qualidade contratada junto às operadoras, não divulgação dos acessos a serviços via internet.
Os maiores questionamentos dizem respeito à responsabilidade sobre o conteúdo disponibilizado, e a maior novidade é a adoção de um mecanismo denominado "notificação e retirada", destinado a proteger usuários vitimados por agressões via internet. Nesse caso, havendo conteúdo tido como falso, mentiroso, ofensivo, calunioso ou difamatório, em textos ou imagens, o interessado denuncia o fato ao provedor, que por sua vez será obrigado a agir, podendo tanto identificar e responsabilizar o autor, ou simplesmente suspender o conteúdo, até que o autor se pronuncie, caso em que este poderá excluí-lo ou assumir a responsabilidade jurídica sobre o mesmo, livrando o provedor de responsabilidade.
A Associação Brasileira dos Provedores de Acesso tem demonstrado preocupação com esse tipo de controle, antevendo que os provedores terão de abrir um canal específico só para receber as notificações de retirada de material suspeito.
O mais importante a destacar é que todos os interessados poderão enviar, via internet, sugestões e críticas à minuta, cujo texto está disponibilizado em htp://culturadigital.br/marcocivil, com explicações de como os interessados devem proceder para emitir suas opiniões. Opinando e propondo sugestões, os usuários estarão participando do fórum da cultura digital, através do qual ajudarão a montar a primeira legislação brasileira sobre o uso da internet, importantíssima porque vai definir qual o papel do Estado no desenvolvimento da web como ferramenta social.
*Antonio Carlos Mendes Thame é professor de Economia da ESALQ/USP (licenciado) e Deputado Federal (PSDB/SP).
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