Eleição de explicação
Após as convenções partidárias, ou melhor, após a Copa do Mundo, começa legalmente a campanha eleitoral. A nossa responsabilidade é enorme, pois iremos escolher um governador, dois senadores, deputados federais e estaduais, além do presidente da República. Na verdade a campanha já iniciou há muito tempo. O atual presidente da República já foi multado duas vezes pelo Superior Tribunal Eleitoral por propaganda eleitoral extemporânea. Na nossa história política nunca, jamais, em tempo algum, aconteceu fato semelhante.
Há muito tempo que a pedição de voto já começou por aqui. Todas as atividades políticas giram exatamente sobre este compromisso - "vote em mim". Os espaços da mídia são todos dedicados às propagandas enganosas, campanhas políticas disfarçadas e extemporâneas. Um fato inusitado começou a frequentar as manchetes dos jornais e televisões, com reprise nacional. A Mirian Leitão escreveu um artigo detalhado sobre a nossa política ambiental, onde confessa que um dia foi iludida. O editorial do Estadão é sobre a liberdade de imprensa aqui implantada. As redes nacionais de televisão disseminam notícias e imagens que sujam o nosso estado e humilham o seu povo. Este é o ambiente que os candidatos encontrarão nos 141 municípios mato-grossenses.
Eleição é festa. Carreatas, passeadas, com direito a almoço ou jantar na casa de algum eleitor, geralmente pago pelo próprio eleitor. Algumas visitinhas rápidas na casa do eleitor também acontecem: cafezinho ou suco de frutas da região, um docinho ou biscoito, que o candidato tem que aceitar para não perder o voto. Finalmente o grande espetáculo - o comício, geralmente na principal praça da cidade ou na carroceria de um caminhão com excelente sistema de som, abraços e beijos nas crianças, as grandes vítimas das eleições pelo número excessivo de abraços e fotos obrigadas a suportar. Esses teatros montados em época de eleições, para um público totalmente descrente, só tinham um enredo: promessas, promessas e promessas. O povo escutava, mas o discurso entrava por um ouvido e saía pelo outro.
Este ano todo esse ritual eleitoreiro, com certeza, estará prejudicado. Pelos últimos escândalos revelados pela mídia, os pedidores de votos terão muita dificuldade em explicar o inexplicável. Como convencer a população que o governo pagou quase cinqüenta mil reais a mais para comprar um simples caminhão? Que o secretário de segurança fala em lavagem de dinheiro, sem explicar de quem? Que o resultado dessa auditoria foi feito pelo estado, e os prejuízos aos cofres públicos são bem maiores que os iniciais encontrados por um simples levantamento? E os critérios de concessões da lei de incentivos fiscais? Que não existe saúde no interior, porque foi decidido substituir os postos de saúde pelas ambulâncias? Que o PAC empacou por aqui. E a explicação para a prisão de funcionários graduados do governo federal, estadual e municipal? O que dizer das estranhas gravações feitas pelo Ministério Público Federal?
Os problemas que verdadeiramente atormentam e fazem sofrer a nossa população, como saúde, educação, segurança, obras de infraestrutura e propostas de desenvolvimento para o nosso estado, nem serão abordados. O tema desta campanha será apenas "explicar". Meu pai sempre me dizia para fugir da possibilidade de passar a minha vida tendo que prestar explicações. Não é um sinal de um passado correto. Dois mil e dez será, em Mato Grosso, a eleição da explicação.
Gabriel Novis Neves é médico em Cuiabá.
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