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Opinião
Quinta - 22 de Abril de 2010 às 11:00
Por: Onofre Ribeiro

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Lembrei aqui minhas vivências com Brasília ao longo desses 50 anos da cidade, mas particularizo os primeiros 16 anos da cidade, quando vivi nela. Os primeiros habitantes de Brasília foram os candangos, uma denominação entre carinhosa e preconceituosa, que significa "ruim", porque eles eram gente vinda de todos os cantos do Brasil, meio sem pátria e sem origem naqueles cantões de um Brasil rural e atrasado.

Mas foram eles quem construíram a cidade. Outros habitantes eram os funcionários públicos que vinham do Rio de Janeiro. Brasília teve duas vertentes humanas principais: nordestinos e cariocas. A linguagem, o comportamento e a cultura deles acabaram nunca se entendendo.

Mas havia na Brasília daqueles primeiros anos uma forte solidariedade nascida da solidão dos candangos, dos cariocas, dos mineiros e dos goianos, que foram os reais fundadores de Brasília. Não sei como anda isso hoje. Lembro-me da esplanada dos ministérios, uma vasta avenida de prédios inacabados e profundamente empoeirada. Aliás, Brasília inteira era um terror de poeira nos meses quentes. Por conta disso ganhou o apelido de "capital da espoeirança".

Lembro-me de ver o ex-presidente Juscelino Kubitschek visitando canteiros de obras na mais tranquila naturalidade, conversando com peões e com engenheiros. Talvez tenha sido essa uma das razões de tanta motivação pela construção de uma capital.

A poeira era a tônica na seca e a lama, a tônica nas chuvas. Os piores ônibus coletivos do mundo circulavam em Brasília. Morava em Taguatinga. Uma viagem ao Plano Piloto durava 2 horas, espremidos naquelas latas de sardinha mal cuidadas e caindo aos pedaços. Saía de Taguatinga às cinco horas da madrugada, tomava dois ônibus até o Plano Piloto, e mais um da rodoviária até a UnB, na Asa Norte. De lá até a esplanada, onde trabalhei, no Ministério da Saúde, só mesmo de carona.

Nunca me esqueço daquela solidão dolorida de Brasília. Muito dolorida. O Cerrado seco e retorcido, a poeira, pessoas completamente desconhecidas, sotaques e costumes diferentes de tudo que conhecia, e uma incerteza cruel. Imagine isso aos 16/17 anos...! A vantagem do tempo é que ele passa e a memória não guarda lembranças ruins.

Aos poucos o asfalto foi tomando conta dos vazios e a cidade tomou forma. Taguatinga era cruel. Feia, barraqueira de madeira, lama e poeira. Faltava tudo. Mas se sobrevivia em cima de uma esperança coletiva.

Brasília sempre foi mesmo sinônimo de esperança naquele seu começo heróico. A história engoliu tudo isso e falar nos 50 anos da cidade não diz nada pra maioria das pessoas. Viver hoje numa excelente qualidade de vida, exceto pelo trânsito infernal, faz de Brasília uma experiência fantástica que se perdeu no tempo daqueles primeiros anos.

Hoje tenho uma enorme gratidão à oportunidade de ter estado ali num momento raríssimo da história brasileira, assim como o de estar em Mato Grosso no período seguinte. Brasília espalhou-se para o Centro-Oeste e chegou a Cuiabá e a Mato Grosso na década de 70. Aí, eu já estava aqui e vivi a segunda fase da epopéia pós-brasiliense.

Amanhã, gostaria de lembrar o papel de Brasília para o interior do Brasil.


ONOFRE RIBEIRO
é jornalista e secretário-adjunto de Comunicação Social do Governo de Mato Grosso.
onofreribeiro@terra.com.br



Autor

Onofre Ribeiro
onofreribeiro@onofreribeiro.com.br www.onofreribeiro.com.br

É jornalista em Cuiabá.

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