Em defesas das prévias no PT
Meus amigos, meus inimigos: a política não é uma linha reta, é feita de contradições. Eu, como petista de tchapa-e-cruz sofro quando vejo na boca de antigos camaradas este discurso de que devemos abrir mão das prévias para a escolha do candidato a senador do PT em Mato Grosso. Ora, não sei se perdi algum capítulo desta novela mas as prévias, em meu modesto entendimento, se constituem em uma das propostas com que o PT renovou a política. Na minha santa e deliciosa ingenuidade gostaria que houvesse prévias sempre. Só que estou ficando velho e acabado – e fico com a impressão de que o PT desaba junto com a minha resistência física.
Em 1978, quando muitos dos que hoje comandam o PT, pelo Brasil afora, sequer haviam nascido, lá estava eu, militando no Movimento Pró-PT, no Rio. Em 82, ao lado de Benedita da Silva, Vladimir Palmeira e tantos outros fui candidato a deputado estadual, na primeira eleição em que o PT ergueu suas bandeiras. E me recordo muito bem: gritávamos que iria ser “um partido sem patrão”. Ou seja, as decisões não seriam cupulistas, como nos demais partidos. Lá, no Rio, quando era um garoto que amava os Beatles e Chico Buarque, o dono do PMDB se chamava Chagas Freitas, um mafioso. Alguém me diz que, por aqui, o PMDB sempre esteve sob o controle de Carlos Bezerra. Sim, este PMDB que, semana passada, foi quase todo pra cadeia, por conta de uma operação anticorrupção.
O tempo passa, o tempo voa, e muita gente do PT parece que jogou no lixo nossas propostas de diferenciação. Imaginem: gritam contra as prévias para o Senado! Acho um absurdo, mas imagino que Serys quando grita é porque teme que o “controle pela base” que o PT tanto propagandeou tenha virado um blefe monumental. Por aqui, o PT, hoje, é controlado por Abicalil, Alexandre, todos esses soldadinhos de Lula em MT. Só que daí a trombetear contra as prévias, para mim, vai distância enorme. Ou você preserva a democracia interna – ou você vai junto com o partido pras cucuias. É bacana imaginar que todo petista seja um quadro partidário e que essas pessoas, reunidas, construirão um partido inovador. Pelo que observo, o PT, como no poema de Drummond, fez de seus princípios apenas um retrato na parede a doer no coração de quem batalha por um mundo e uma política nova.
Para mim, um momento glorioso do PT foi aquele em que Suplicy e Lula se enfrentaram para que as bases decidissem quem seria nosso candidato a presidente. Por falta de convivência democrática, vimos no atual processo eleitoral, Marina debandar do PT, para não contrariar a indicação de Dilma feita por Lula. As distorções em que o PT vive acontecem por conta do Lulismo que engoliu o velho PT, transformando-o, episodicamente, num partido que, para se livrar do “centralismo democrático” da esquerda, ironicamente acaba se entregando ao caciquismo. Bem sei que não consegui dizer aqui tudo que queria. Só queria registrar que estou com as prévias. O problema da professora Serys é que, tendo se juntado a Abicalil na entrega do PT a Maggi e ao PR, tenta agora se diferenciar dele apenas no acessório.
Bacana mesmo seria se, no domingo, os petistas escolhessem nosso candidato a governador. Haverá coisa mais triste do que um partido que perdeu seu tempo e vê suas lideranças se auto-deletarem, abandonando suas bases, na disputa eleitoral, em Mato Grosso, ao comando de lideranças anti-classistas? O exercício político da escolha, pela base, no domingo, pode conter a semente de uma virada à esquerda. (Sim, talvez eu viva de ilusão.)
*ENOCK CAVALCANTI, jornalista, é titular do blogue www.paginadoe.com.br
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