A falência do jeitinho
A crise do judiciário mato-grossense está sendo vista pela maioria da opinião pública local como tragédia – o que, de fato, ela é -, mas também pode ser vista como auspício.
O lado trágico é o desfecho doloroso para as instituições Magistratura, Tribunal de Justiça, Maçonaria. Não há como negar que a dimensão que o caso tomou enlameia a todas elas, e retira um naco grande da sua respeitabilidade e honorabilidade. Afinal, quando os homens e mulheres responsáveis pela mediação dos conflitos da sociedade, pela definição do certo e do errado são eles próprios pegos fazendo o errado, a sociedade se lastima e se ressente por não ter a quem recorrer.
Quem leu até aqui e espera um raciocínio simplesmente detrator e deletério pode economizar tempo. Não me proponho a atirar pedras, vez que o processo judicial ainda não está concluso, e todos os magistrados envolvidos no caso ainda têm o direito a defesa, ou buscam possibilidades de recurso.
As punições por eles já sofridas até aqui, todavia, já representam algo deveras contundente. A mais robusta, sem dúvida, é a condenação e exposição públicas a que estão submetidos. Isso já seria motivo suficiente para iniciarem um intenso e profundo processo de reavaliação e reflexão sobre suas práticas como magistrados, homens da lei, cidadãos.
Os afastamentos de função, as aposentadorias, as manchetes de jornal já constituem, sim, uma punição bastante incisiva. Se não no campo jurídico, ao menos no campo ético, moral, ferindo suas reputações. E muito provavelmente de forma definitiva, indelével e irreparável.
Essa é, via de regra, a conseqüência natural de todos aqueles que se envolvem – ou são envolvidos – em crises de imagem: independente da comprovação das suas culpas perante os tribunais, o julgamento das ruas ocorre de maneira muito mais rápida, intensa e definitiva, na maioria dos casos sem nenhum recurso ou direito a apelação.
Mas, toda crise possui seu lado auspicioso, inovador, recriador. O da crise do judiciário mato-grossense é exatamente essa reflexão a que todos somos levados a fazer – não apenas os magistrados envolvidos – sobre a atuação do poder judiciário de uma forma generalizada, a falta de transparência dessa instituição, que sempre está ou é percebida como um poder acima dos demais e seu distanciamento das pessoas simples, do homem comum, da sociedade.
Auspicioso também é a falência do jeitinho brasileiro decretada pelo desfecho da crise. Ao que tudo indica, tentaram dar um jeitinho em algo que deveria ter um tratamento mais sério. Ao buscarem nos membros da magistratura levantar os recursos necessários para tapar o rombo na cooperativa da maçonaria, confundiram público e privado, misturaram duas instituições que não guardam relação legal entre si, embora tenham outros laços de natureza política, comportamental, cultural.
Como um dos poderes do Estado, o Judiciário é Estado. Maçonaria não é Estado. Ao contrário, está submetida a este. Embora não seja magistrado nem maçom, considero as duas instituições sérias e honoráveis. Entretanto, o primeiro – o Estado – é fundamental e imprescindível a “todos” os cidadãos, indistintamente. Já a segunda se circunscreve a esfera privada daqueles que a ela pertencem. Ao misturarem as duas, criaram uma combustão química altamente explosiva, que explodiu. Caíram as vítimas que estavam mais próximas. Os estilhaços, contudo, podem ter produzido inúmeras outras vítimas. Saberemos quando a fumaça se esvair.
(*) KLEBER LIMA é jornalista e consultor de marketing em Mato Grosso. E-mail: kleberlima@terra.com.br.
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