O Brasil e a corte trapalhona
São antológicas as histórias (e também as estórias) das cortes palacianas, onde a intriga e os comportamentos subterrâneos acabam interferindo no poder. Reis, rainhas, presidentes, ministros e áulicos viram motivo de piadas ou acabam caindo em desgraça por conta dos mexericos e das relações pessoais mal resolvidas. Brasília, talvez pela sua distância dos centros mais desenvolvidos e pela acumulação do poder, sempre teve a característica de uma corte, com muitos vícios e excentricidades. Seu histórico paralelo do poder é riquíssimo e reúne casos que vão do grave ao tragicômico. Alguns vazaram para o povo, outros ainda circulam em áreas relativamente restritas.
A ação do ex-presidente Lula, acusado de tentar pressionar o STF para beneficiar os envolvidos no mensalão, com certeza, permanecerá inscrita como caso emblemático na crônica paralela do planalto central. Seu excesso de confiança o levou a desencadear uma possível crise institucional que poderá apresentar sérias conseqüências.
Lula não deveria se esquecer de sua condição de “ex” e saber que, mesmo com todo o incenso que lhe é aplicado, não deve avançar o sinal. Se o continuar fazendo, pode acabar assumindo a condição de trapalhão que os adversários há muito lhe tentam impingir. Assim como ele, todos os demais atores do teatro do poder e dos mambembes ao seu redor precisam separar o público do particular e o profissional do pessoal. Suas vidas pessoais ou sociais jamais poderiam interferir na atividade profissional.
Ex-presidentes devem, no dia-a-dia, ser discretos. Governantes devem governar, congressistas legislar, magistrados julgar e assim sucessivamente. As atividades pessoais-sociais de cada um não deve interessar ao circuito do poder. O Brasil espera, até com uma certa ansiedade, que o Governo cumpra suas metas, a CPI do Cachoeira faça as devidas apurações, o Supremo julgue o mensalão, etc. Pouco interessa ao povo qual a cor dos olhos desse ou daquele, se existem relações extra-conjugais ou inimizades entre esses e aqueles. Esses são problemas da corte e não da nação e poderão, no máximo, fazer parte da crônica mundana da capital.
Os operadores do poder precisam ter discernimento para separar dever e lazer, e os “ex” para restringirem-se às suas posições. O Brasil de economia forte e tido como um dos portos de resistência à crise mundial, que derruba governos na Europa e coloca em alerta os outros centros desenvolvidos, não pode desperdiçar o seu tempo com crise institucional, principalmente quando ela é criada em bases tão discutíveis. O momento é grave e não podemos perder tempo com questões menores. É, cada dia mais válida, a famosa frase do almirante Barroso: “o Brasil espera que cada um cumpra com o seu dever”...
Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)
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