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Opinião
Sexta - 16 de Janeiro de 2015 às 08:41
Por: Sebastião Carlos Gomes de Carvalho

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Sem dúvida, uma grata surpresa a escolha de Leandro Carvalho para dirigir a Secretaria de Cultura. Considero esta uma grande sacada do governador.

Primeiro, contornou a proposta de extinção da secretaria, sugerida por sua equipe de transição. E, agora, convoca ao palco da política uma das figuras mais brilhantes do Estado.

Oxalá, estes sejam os primeiros andamentos bem sucedidos de uma decidida parceria entre o governador e seu secretário, se constituindo assim num allegro vivace de estimulo ao fazer cultural.

Uma coordenada cinética que, nunca é demais repetir, é extremamente necessária diante do desafio que se coloca para o maestro.

Leandro é reconhecido hoje pela crítica especializada como um dos mais promissores maestros da nova geração da música erudita brasileira. "A inegável competência de gestão do futuro secretário, já demonstrada à frente da Orquestra de Câmara do Estado, certamente não bastará se ele não contar com o decidido e inequívoco apoio político e orçamentário do governador."

Com especialização na Inglaterra e pós-graduação em regência na Holanda, e com diversas apresentações no Brasil e na Europa, tem recebido vários prêmios, e em maio de 2014, na França, esteve entre os dezoito finalistas em um dos mais importantes concursos internacionais de regência, o Evgeny Svetlanov Conducting Competition, realizado a cada quatro anos, que contou com mais de 500 inscrições provenientes de 30 países, sendo ele o único sul-americano.

Conheço e acompanho o maestro desde a criação da Orquestra de Câmara de Mato Grosso e sou testemunha de seu dinamismo, criatividade, competência e talento.

Não sei o que mais aplaudir na Orquestra sob a sua batuta, se a extensa programação de concertos que desenvolveu ao longo desses anos popularizando a música erudita a um público normalmente a ela arredio, se o trabalho de “catequização” desenvolvido junto a escolas da rede pública e privada com os seus “Concertos Didáticos” ou se a surpreendente introdução em seus concertos de um naipe de violas de cocho e de instrumentos de percussão da região do Pantanal.

Tal feito resulta numa inusitada e inesperada simbiose que inclui e reúne os majestosos acordes de Stravinsky, Mozart ou Bach com os rasqueados de Tote Garcia e de Mestre Albertino, sem se falar na surpresa de também se ouvir a malemolência do bandoneon de Astor Piazzola e outros de sudamerica.

Essa notável abertura oferecida para a comunhão do erudito e do popular, resulta numa fusão de grande impacto harmônico para a sensibilidade do ouvinte, contribuindo, de per si, com uma enorme carga de possibilidades para a compreensão do elemento cultural, e essencialmente humano, existente em culturas aparentemente tão antípodas.

Extraordinário! Leandro Carvalho, e os seus companheiros de Orquestra, operou uma revolução musical em ares agrestes e tão ínvios. Só por isso, Mato Grosso já lhe deve agradecer: Bravo, Maestro!

Mas a regência agora é de outro porte. A entrevista concedida antes mesmo da posse já anuncia uma de suas diretivas mais elogiosas e plenamente exequível desde pronto.

Promete acabar com “as panelinhas” ali existentes de longa data, que não apenas criam vínculos de favorecimentos antidemocráticos e anticulturais, que desvirtuam até mesmo o conceito elementar de cultura, como alimentam desvios de recursos, já insuficientes, como, de resto, foi amplamente demonstrado na, ironicamente denominada, Operação Alexandria, deflagrada em setembro do ano passado.

Um desafio de maior envergadura certamente será a de democratizar o mais amplamente possível o acesso aos bens culturais num Estado de enorme dimensão geográfica. Neste sentido, o diálogo com os diversos segmentos da sociedade, e não apenas culturais, se impõe como medida preliminar.

De igual modo, deve desde já atuar na frente interna, com um reposicionamento do Conselho de Cultura (que dependerá do Legislativo) e com o imediato reestudo de prioridades para o uso dos recursos do Programa de Apoio à Cultura (Proac).

Terá folego o maestro para tanto? É evidente que tais providências, sobretudo a da democratização do acesso à cultura, particularmente no que diz respeito à imperiosa necessidade de uma política para o livro e de estimulo à leitura, não dependerá apenas do seu idealismo e entusiasmo.

A inegável competência de gestão do futuro secretário, já demonstrada à frente da Orquestra de Câmara do Estado, certamente não bastará se ele não contar com o decidido e inequívoco apoio político e orçamentário do governador. Tal se torna mais patente ainda ante a indisfarçável inapetência cultural da burocracia governamental, desde sempre mais atenta aos interesses da cultura agrarista.

Além da competência já demonstrada na regência, Leandro terá que ter muito poder de convencimento para participar do jogo político e burocrático em que é neófito.

Não será fácil. Não sei também se ele está partindo agora, entusiasmado que é, de um andantino ou de um vivace, só torço para que ele não chegue como alguns, alhures em idêntica situação, ao adágio melancólico. J

João Carlos Martins, reconhecido como um dos grandes pianistas do mundo, certamente um dos maiores interpretes de Bach, afirma, em entrevista nesta semana à revista Veja, que a pior coisa que ele fez na vida foi se envolver com a política.

Dirigir o órgão de cultura será um desafio e tanto a ser enfrentado pelo jovem maestro. No duplo sentido.

SEBASTIÃO CARLOS GOMES DE CARVALHO é professor e ensaísta. Publicou, entre outros, Panorama da Literatura e da Cultura em Mato Grosso (2 volumes.)



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