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Opinião
Quinta - 23 de Julho de 2015 às 23:13
Por: Marcello Terto e Silva

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Neste cenário de crise política, financeira e econômica, chamam a atenção os trabalhos legislativos da Câmara dos Deputados.


No parlamento, a proposição legislativa encerra uma expectativa que os legisladores concebem diante de uma diversidade de fatores: seu eleitorado; as necessidades da comunidade; sua formação acadêmica e profissional; e até os seus anseios e relações pessoais, formalizando-os no intento de convertê-los em lei.

Por certo, os parlamentares não são ilhas. Vivem legitimamente imersos numa realidade política, em que as pressões e os interesses são aspectos de conflitos sociológicos, antropológicos, econômicos, religiosos, psicológicos e corporativos. Contudo, a atividade política deve conciliar-se com o respeito à Constituição Federal, seus princípios e anseios, na tentativa de obedecer a uma mínima lógica racional.

Legislar é uma competência intimamente ligada à compreensão de uma leitura do sistema constitucional, em que os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) têm a finalidade de fazer uma transição pacífica de um ordenamento jurídico anterior para o novo. A possibilidade de essas normas serem alteradas não pode desfigurar o fim primordial do constituinte que deteve o poder originário, autônomo, ilimitado, incondicionado e vinculante de todos os poderes por ele constituídos.

As mudanças no ADCT, portanto, não podem incentivar situações de desrespeito à vontade do Constituinte de 1988, como se percebe na Proposta e Emenda à Constituição (PEC) nº 80/2015, apoiada e apresentada em um único dia e admitida em menos de duas semanas, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, para substituir outra proposta ainda pior.

Sob a premissa de um acordo que não existiu e cercada da pressão dos beneficiados, na tentativa de romper o modelo de Advocacia Pública dos Estados e do Distrito Federal claramente definido em 1988, para lhes abrir janelas para uma institucionalidade e paridade não permitidas, essa proposta avançou para a fase do exame de mérito, a despeito do alerta dos governadores do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro para as implicações na autonomia e finanças dos seus estados.

Em síntese, a PEC 80 perpetua situações transitórias, estimula casos de franco desrespeito ao comando do constituinte, permite o exercício de competências consultivas dos procuradores por ocupantes de cargos de gestores, analistas e assistentes jurídicos, impede os procuradores dos Estados e do DF de atuar na Administração Indireta e obriga até mesmo os estados que já cumpriram Constituição a criar procuradorias autárquicas e fundacionais.

A proposta ignora que o Supremo Tribunal Federal decidiu ser impossível o provimento de cargos de advogado público organizados em paralelo aos das Procuradorias Gerais dos Estados e do DF por outros servidores que não se enquadrassem nas exceções previstas no artigo 69 do ADCT (ADI 484/PR). Não é uma questão que envolva o exercício da advocacia em si. Trata da institucionalidade de carreira de Estado cuja norma de organização provém originariamente do art. 132 da Constituição Federal, para assegurar a racionalidade e eficiência dos serviços jurídicos estaduais e a máxima efetividade da regra do concurso público.

É nos momentos de crise que cabe aos parlamentos assumir ainda maior responsabilidade de impedir a aprovação de propostas inconstitucionais e, assim, evitar impactos financeiros desnecessários e a proliferação do controle posterior que o Judiciário exerce e admite inclusive no campo das emendas constitucionais.

Marcello Terto e Silva é presidente da Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape). 



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