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Opinião
Quarta - 29 de Junho de 2016 às 16:46
Por: Sirlei Terezinha Theis de Almeida

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Fui vítima da violência doméstica. Talvez você não saiba, mas assumir esta condição é algo extremamente difícil para mim.

Ao escrever e assim compartilhar algo tão íntimo de minha vida, gravito entre o medo, a vergonha e a tristeza.

Ao longo de quase 9 anos, fui vítima de um psicopata que me agrediu de todas as formas. Sofri violências emocionais, financeiras, físicas e até sexuais.

É triste pensar, mas esta história se repete todos os dias, nos mais variados recantos do Brasil e do mundo.

Tenha certeza que, enquanto você lê este texto, mulheres estão sofrendo os mais terríveis abusos, histórias que, em muitos casos, vão terminar em morte.

Ao escrever e assim compartilhar algo tão íntimo de minha vida, gravito entre o medo, a vergonha e a tristeza. Ao longo de quase 9 anos, fui vítima de um psicopata que me agrediu de todas as formas. Sofri violências emocionais, financeiras, físicas e até sexuais

Sou uma sobrevivente. Com a ajuda de uma amiga muito especial, consegui me libertar do agressor e, aos poucos, meus dias de prisão e sofrimento vão ficando no passado.

Hoje, vivo um novo relacionamento, tenho uma filha e sou feliz, mas sei que as muitas mulheres que ainda sofrem nas mãos de seus agressores precisam de ajuda.

Acredito que um importante avanço neste sentido seja o Projeto de Lei PLC 07/2016, que tem como objetivo acrescentar alguns artigos a Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).

Esse Projeto de Lei prevê a inclusão do art. lO-A, que trata da prevenção da revitimização à mulher durante os atendimentos policiais; traz também o art. 12-A, que dispõe sobre a obrigatoriedade de especialização dos serviços policiais e ainda propõe a inclusão do art. 12-B, o qual tem sido motivo de grande discussão entre os profissionais do Judiciário, Ministério Público e delegados.

O referido artigo, se aprovado, permitirá à delegada, preferencialmente, ou delegado de Polícia que tomar conhecimento do caso conceder, de imediato, medidas protetivas de urgência.

Prevê ainda que, quando a delegada ou delegado conceder as medidas protetivas, terá que encaminhar tudo ao juiz em 24 horas, para realizar o controle judicial, que poderá́ alterar, manter ou revogar as medidas deferidas pela delegada ou delegado.

Isso vai dar celeridade aos processos e, com certeza, trará segurança para que as vítimas procurem ajuda.

Hoje, quando tudo ocorre de acordo, as medidas protetivas são conferidas num prazo de 7 dias, mas é comum a história se arrastar por até sessenta dias ou mais.

Pela minha experiência de vida, posso afirmar que, para quem vive com uma pessoa desequilibrada, possessiva e agressiva, um dia é muito tempo para esperar por proteção. O que dizer então de 5, 7, 60 ou mais dias?

Confesso que, na primeira vez que assisti a uma matéria sobre o projeto 07/2016, considerei muito eficaz e um grande avanço da legislação brasileira relacionada à defesa das vítimas de violência doméstica.

Contudo, logo após vi outra matéria que trazia como título “PLC 07/2017 – Retrocesso”. Isso me chamou tanto a atenção que li a matéria para entender o porquê do retrocesso.

E, a partir desse momento, li tudo que encontrei referente às discussões acerca desse projeto de lei, para ver se algo poderia de fato mudar a opinião inicial acerca do significativo avanço que representaria para a legislação brasileira de proteção a vítimas de violência doméstica, a possibilidade do delegado, ao tomar conhecimento do crime, deferir de imediato medidas protetivas para a vítima.

Me lembro que, apesar de ter sofrido as mais diversas formas de violência doméstica, na época, não tive coragem de denunciar meu agressor.

O fato de saber que, após denúncia, teria que voltar para casa e aguardar uma intimação ou uma audiência, para só então receber alguma medida protetiva, fez com que eu desistisse de buscar ajuda.

A ideia de fazer a denúncia e com isso colocar meu ex-marido em estado de alerta me deixava apavorada, pensava nas consequências e temia por minha vida.

Somente quem sofreu esse tipo de violência tem condições de saber, de fato, o risco que se corre todos os dias ao lado do agressor.

Eles são altamente desconfiados e um passo em falso pode resultar em novas agressões e cada vez mais violentas. Isso fez com que eu aguentasse calada a situação.

Era o medo, medo de morrer.

A vítima fica doente, deixa de acreditar em si mesma, tem medo, muito medo e, quando cria coragem de procurar ajuda, está no limite.

Por isso, precisa de proteção imediata, não pode voltar para casa com um papel na mão para aguardar que o agressor seja intimado em, quem sabe, uma semana, se tudo der certo.

É preciso lembrar que, muitas vezes, essas vítimas não conseguem sair de casa sozinhas, ou quando conseguem precisam informar onde exatamente foram, sabendo que a sua informação será checada.

Desta forma, eu pergunto: como denunciar sem a segurança de uma proteção imediata?

Como sair de casa para ir a uma Delegacia de Polícia e voltar para a mesma casa em que vive com um homem desequilibrado e extremamente violento?

Por esses motivos, faço a defesa para a aprovação desse Projeto de Lei, PLC 007/2016, pois entendo ser de suma importância para melhor eficácia da Lei Maria da Penha, na defesa das vítimas de violência doméstica.

Vejo que, nesse momento, o foco principal deve ser a vítima da violência doméstica, e não interesses corporativos ou de defesa do agressor.



Autor

Sirlei Terezinha Theis de Almeida

É advogada, servidora pública e foi vítima de violência doméstica por quase 9 anos.

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