Doce de leite
Doce de leite tem o gosto de minha infância. Como eu era louco pelas balas de leite Toffees Embaré pegajosas no céu da boca. Sem falar na lata de leite condensado Moça! Fazia-se um, não, dois furos na lata e se deliciava com aquele líquido pastoso que se rezava para não acabar. O sabor sem igual do divino doce de leite açucarado. De queijo e da goiabada. As melhores iguarias que já provei!
A vida prosseguiu, sem tréguas, desde a minha longínqua infância. Aqui estou eu a louvar as delícias de todos os odores e sabores os quais eu apreciava com sofreguidão: doce de leite, goiabada, torresmo, queijo, carne e costela de panela, arroz com feijão e ovos fritos, pirão, revirado, paçoca de pilão, mandioca com carne seca. Tais cheiros e sabores me perseguem impiedosamente até hoje! Outro dia me deparei com uma lata de doce de leite que me fez retornar inopinadamente para a minha infância, de onde não deveria ter saído. Que dor doída!
O sabor era o mesmo e a fome também era a mesma, mas as limitações da impiedosa idade me fizeram refletir. Era imensa a minha fome e o doce de leite era pouco. E hoje, o doce de leite é farto, mas me deparo com as cruéis imposições da saúde que não me permitem, como outrora, me lambuzar e comê-lo até me empanturrar. C´est la vie!
O escritor mexicano Carlos Fuentes afirma que a cozinha mexicana é “mui rica” em qualidade e quantidade.
e a hora da refeição é um ato solene, em que pese ser o México um País pobre. Ao contrário do seu rico vizinho (EUA), onde a comida não é digna de nota e a iguaria mais apreciada é sanduiche com batatas fritas (fries) que se come às pressas. E é esta comida indigesta e calórica que os americanos tentam impor ao mundo inteiro, com suas redes de loja de fast food.
Em que pese todos os tempos e contratempos do nosso País, não se pode negar os dons insuperáveis da nossa majestosa e variada cozinha. E a comida cuiabana é das melhores: farofa de banana da terra, mojica de pintado, pacu frito, pacu assado, arroz com pequi, arroz com pacu seco, Maria Isabel, costela com mandioca, bolo de arroz, furrundum, doce de figo, doce de caju e por aí vão os incontáveis pratos que fazem as delícias desta terra agarradiça.
Encerro este texto com a nostalgia da canção O Rancho da Goiabada de João Bosco/Aldir Blanco:
Os boias frias quando tomam umas biritas
Espantando a tristeza, sonham com bife a cavalo, batatas fritas
E a sobremesa
É goiabada cascão com muito queijo,
Depois café, cigarro e um beijo
De uma mulata chamada
Leonor ou Dagmar.
É este o Brasil brasileiro, com todas as suas delícias e severas contradições, que nos fazem amá-lo cada vez mais. Reafirma-se assim uma verdade inequívoca: o amor não é uma equação cartesiana ou um caminho retilíneo sem percalços.
Renato Gomes Nery. E-mail – rgnery@terra.com.br
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