Projeto define contribuinte inadimplente como devedor contumaz
Está tramitando na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso projeto de lei de autoria do Deputado Delegado Claudinei, na qual pretende definir critérios para caracterizar o contribuinte inadimplente como devedor contumaz.
Parafraseando o velho guerreiro Chacrinha no sentido de que nada se cria tudo se copia, tal projeto de lei, com as devidas adaptações, é quase uma cópia do projeto de lei nº 1646/19, de autoria do Poder Executivo, que tramita na Câmara dos Deputados, além de já estar sendo tratado nas legislações dos Estados Rio Grande do Sul (Lei 13.711/2011), Paraná (Lei 11.580/1996), São Paulo (LC 1.320/2018), Goiás (Lei 19.665/2017), Espírito Santo (Lei 9.907/2012) Bahia (Lei 13.199/2014), Alagoas (Lei 7.747/2015) e mais recentemente na de Pernambuco (Lei 16.472/2018).
O tema é polêmico, tanto que é objeto da ADI 4.854-RS, proposta junto ao STF pelo Partido Social Liberal em 2015 (no qual, dentre outros Estados, Mato Grosso figura como amicus curiae - "amigo da corte"), assim como de questionamentos em outras ações nas diversas instâncias do poder judiciário.
Em todas essas ações, bem como em manifestações doutrinárias, os argumentos a favor ou contra definir e enquadrar o contribuinte inadimplente como devedor contumaz, sem as devidas cautelas, são semelhantes.
Os que são contra alegam que a expressão “devedor contumaz” (aquele cujo comportamento fiscal se caracteriza pela inadimplência substancial e reiterada de tributos) seria um conceito, aberto, indeterminado, carecendo de melhor precisão e clareza, de modo a diferenciá-lo do devedor comum, circunstancial, eventual, de boa-fé, para que possa dessa forma conferir maior segurança jurídica na aplicação da lei.
Essas pessoas entendem também, que há necessidade de previsão de prova efetiva, a cargo dos órgãos da administração tributária, antes de submetê-lo a verdadeiras sanções políticas ou ao rigor excessivo de um regime diferenciado de controle, fiscalização e pagamento, porquanto em época de crise e de pontual dificuldade financeira, o atraso esporádico no recolhimento de tributos não pode ser visto como o inadimplemento do devedor contumaz, cujo pertence a uma categoria de contribuintes, dos quais muitas vezes se utilizando de “laranjas”, fazem desse comportamento uma fonte de renda, mudando de sócio, desfazendo patrimônio e assim promovendo a concorrência desleal.
Já os que defendem a necessidade de delinear e acoimar o contribuinte como devedor contumaz salientam que é medida necessária para coibir a inadimplência sistemática, intencional, consciente, de agentes que buscam por meio de sonegação fiscal obtida em declarações falsas, subfaturamento, contrabando, descaminho, redução artificial de preços, etc., apenas uma vantagem concorrencial que afeta a economia e perturba o ambiente de negócios e o regular funcionamento do mercado, bem como se utilizando abusivamente de medidas judiciais em ações temerárias sem lastro suficiente para respaldá-las.
Os aludidos projetos de lei estabelecem sanções para o devedor considerado contumaz, que vai desde o pagamento antecipado do tributo, controle da impressão e emissão de documentos fiscais, a instalação de equipamentos de controle de produção, comercialização e estoque, etc., até o cancelamento da inscrição estadual e a vedação à fruição de benefícios fiscais.
Como assinalado, a matéria é polêmica e, a exemplo do projeto que tramita na Câmara dos Deputados, de todo conveniente que o projeto de lei estadual, antes de sua aprovação, seja submetido à apreciação das entidades representativas dos contribuintes, inclusive mediante audiência pública, sobretudo porque, como facilmente se percebe, seu texto precisa ser aperfeiçoado, até porque tramita em paralelo outro projeto de lei, de nº 980/2019, que ao pretender alterar a lei estadual do ICMS de nº 7.098/98, acrescenta nela o artigo 47-L objetivando igualmente definir e enquadrar, mas com critérios diferentes, o devedor tido como contumaz.
Juliana Bueno é advogada e consultora tributária, especializada em Direito Tributário, ex-assessora do Tribunal de Contas e da Procuradoria Geral do Estado de MT. Email: juliana@jbuenoadvogados.com.br
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