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Opinião
Segunda - 09 de Janeiro de 2012 às 16:14
Por: Dirceu Cardoso Gonçalves

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O uso de “dor e sofrimento” como meio de persuadir os viciados da cracolândia paulistana a aceitar o tratamento é, pelo menos, discutível. Esse castigo nada mais é do que a tortura, prática infamante, condenada em todas as sociedades e só admitida nos lugares mais atrasados do planeta. Não há a menor dúvida de que as forças estatais devem à sociedade uma solução para a zona convertida em território da droga, pois ela se constituiu sob as barbas dessas mesmas autoridades, que pouco ou nada fizeram para resolver o problema, só agravado ao longo das duas últimas décadas.

Em vez da pura ocupação militar, o mais indicado seria um endurecimento inicial contra o tráfico e a montagem de estruturas suficientes para atendimento aos viciados. As “procissões” de drogados, noticiadas pela imprensa, em nada contribuem para resolver o problema e expõem negativamente a imagem da cidade. Ainda está em tempo de a máquina pública unir-se para a busca efetiva de uma solução. A própria PM seria melhor empregada se, em vez da repressão, fosse direcionada a montar, com outros órgãos de governo, o seu já conhecido sistema de Ação Cívico Social.

Barracas de campanha com médicos, psicólogos, dentistas, farnacûticos, assistentes sociais e até membros do Judiciário, para dar o atendimento integral ao viciado no seu próprio habitat. Oferecer ali mesmo todo o tipo de assistência, inclusive alimentação e higiene pessoal, e só levar para internação na rede de saúde os que tenham quadro clínico mais grave ou apresentem alto grau de periculosidade, dependência à droga e risco à própria vida e à de terceiros. Além dos servidores públicos, também poderiam ser chamadas a colaborar as igrejas e entidades sociais que já executam trabalhos com drogados. Tudo para que o usuário, em vez de reprimido, sinta-se apoiado, promovido e espiritualmente confortado.

Desde os tempos imemoriais, a forma mais adequada de acabar com uma guerra é cortar suas linhas de suprimento. Sem armas, alimentos e meios de locomoção, os litigantes são obrigados a se render. O mesmo tem de ser feito na guerra ao crack. O combate sem trégua ao tráfico diminuirá a disponibilidade da mercadoria junto ao consumidor e um eficiente trabalho social poderá recuperá-lo, assim como devolver à comunidade as áreas hoje sucateadas. Pode parecer utópico, mas essa é a obrigação dos governos, que não a cumpriram no tempo certo e, com isso, deixaram o problema chegar aos níveis catastróficos de hoje.

Apesar de decidida pelo segundo escalão – o governador, o prefeito, o secretário da Segurança Pública e o comandante da PM não sabiam – a operação na cracolândia está deflagrada. Os governantes e autoridades maiores, comodamente, decidiram “deixar barato” a uma suposta insubordinação. Mas agora é preciso agir rápido para garantir a eficiência do trabalho e evitar que tudo se converta num certeiro tiro no pé.

A Polícia Militar não deve ser a dona da operação e muito menos aplaudida pelo seu acerto ou vaiada pelo insucesso. Como polícia, tem de fazer apenas sua parte. O governo sim, é o responsável e tem de mobilizar recursos para a busca da solução. Em tempo: não é só no centro de São Paulo, mas também nos bairros e praticamente em todas as cidades do interior...

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)

aspomilpm@terra.com.br   



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