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Opinião
Quinta - 30 de Abril de 2020 às 05:55
Por: Julio Cezar Rodrigues

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Inspiramo-nos para escrever esta opinião, aproveitando também como indicação de leituras, as seguintes obras: “Política, Ideologia e Conspirações”, de Gary Allen e Larry Abraham; “A ideologia do século XX”, do brasileiro J. O. de Meira Pena”; “Direita e Esquerda” de Norberto Bobbio; “O Estado Tecnocrático”, de J. P. Galvão de Souza e “Conflito de Visões”, do economista americano Thomas Sowel. Foi durante a Revolução Francesa que os conceitos modernos de “esquerda” e “direita” se originaram. Conta-se que certos legisladores mais afoitos e radicais, os “jacobinos” (algo como os Bolcheviques da Revolução Russa), por chegarem primeiro, sentaram-se à esquerda do hemiciclo da Assembleia Nacional. Em contrapartida, os atrasados “girondinos”, a parcela mais moderada e prudente da Revolução (algo como os Mencheviques da Revolução Russa) ocuparam o lado direito. O tempo foi passando e as transformações políticas acontecendo como narra a História. O fato é que os termos “esquerda” e “direita” terminaram por adquirir conotação filosófica política. As ideologias e visões de mundo que proliferaram a partir do século XVIII, sobretudo com a Revolução Científica e Industrial, foram se “amoldando” sobre uma régua horizontal imaginária formando um continuum espectral de um extremo a outro.

Hodiernamente, essa tal régua ideológica apresenta as tais visões políticas do seguinte modo: na extrema esquerda coloca-se o comunismo, o qual, em que pese as elucubrações marxistas, a realidade histórica e factual nos mostra ser apenas uma ditadura e um estado totalitário. Ao mesmo tempo, nos dizem que devemos temer a extrema-direita, esta representada pelo fascismo e nazismo, ambos, obviamente ditaduras e estados totalitários. Diante destes extremos, o “establishment” e a “intelligentsia” de plantão nos orientam a preferir o “caminho do meio” (ou terceira via), a que chamam de democracia. Contudo, o que o “establishment” denomina democracia é, na verdade, o chamado socialismo-fabiano ou social democracia ou chegada ao socialismo-científico pela forma gradual.

Com algumas alterações, o filósofo político Norberto Bobbio chancela essa distribuição. Para Bobbio o critério da régua deve ser a “diferente apreciação da ideia de igualdade” e a “diferente postura” diante da liberdade. Dessa forma, na extrema-esquerda estão movimentos simultaneamente “igualitários e autoritários” (como exemplo ele não cita o comunismo, mas o “jacobinismo”) e na extrema-direita ficam as doutrinas e movimentos “antiliberais e anti-igualitários”, agora sim, cita como exemplo o nazi-fascismo. Discordamos frontalmente de Bobbio por uma série de motivos, aliado ao fato inconteste de que este filósofo tem tendência esquerdista (“sempre me considerei um homem de esquerda”, afirma Bobbio na obra em epígrafe). Aliás, o próprio Bobbio concorda que a “realidade é bem mais matizada do que este esquema”. Claro que é nobre pensador. O que não é dito é o fato de que este esquema serve aos interesses da esquerda na construção de sua narrativa para opor à verdadeira pretensão ideológica dos socialistas um inimigo cuja essência ideológica é a mesma deles, mas com um sinal contrário. Ou seja, aceitam o fato inconteste de que na sua extrema-esquerda tem um monstro, não obstante, na extrema-direita há outro monstro, forçando você a caminhar pelo meio em que ela domina o discurso e, JAMAIS, diz a você que este “meio do caminho” move-se, aqui no ocidente pelo menos, inexoravelmente, em direção à esquerda há pelo menos oitenta anos. Como lembram Gary Allen e Larry Abraham, a escolha que nos dão é entre o comunismo (socialismo internacional) em uma ponta do espectro, nazi-fascismo (socialismo nacional) na outra e socialismo Fabiano no meio. TODO O ESPECTRO É SOCIALISTA!

Uma pergunta apenas é suficiente para aniquilar esse espectro feito para atender os interesses da esquerda. Onde é colocado os anarco-capitalistas (libertarianistas), por exemplo, ou mesmo os anarco-comunista (Bakunin) nesse espectro? Onde ficam aqueles que acreditam na república constitucional e no sistema de livre-iniciativa? E os conservadores? Ou essas ideologias ou posturas politicas (conservadorismo) não existem? A maioria das pessoas, analistas políticos e formadores de opinião utilizam esse espectro para definir suas posições políticas. Jean Madiran, citado por Meira Pena já afirmara que a “a distinção entre a esquerda e a direita é sempre uma iniciativa da esquerda, feita pela esquerda e em proveito da esquerda”. Na mesma toada Gustavo Corção arremata que “a rigor não há esquerda e direita. Historicamente, como feixe de linhas-de-história, só há esquerda. A direita não existe como corrente histórica”. Ela passa a existir, perceba agora leitor a agudeza do pensamento, “como coisa designada e apontada à execração pela esquerda”. Claro, não precisa muito esforço cognitivo para depreender que as ideologias de esquerda, na busca da sociedade igualitária, entregaram apenas tirania e opressão, assim, criou seu inimigo através das outras ideologias tirânicas de matrizes socialistas, acusando-as de não buscarem o santo graal da igualdade para redimirem-se de seus pecados. Se falhamos, repete o socialista dogmático, ou foi porque o verdadeiro socialismo não foi implantado ou problemas “operacionais” impediram; o importante é que os fins justificam os meios. Romântico não? Menos para as vítimas dos gulags stalinistas ou dos campos de concentração de Hitler e Mao.

Ora, Bobbio quer uma régua cujos critérios são a IGUALDADE entre as pessoas combinada com postura ideológica ante a LIBERDADE. Qual igualdade? A direita não quer igualdade? Ocorre que a esquerda defende a igualdade de resultados e a direita a igualdade nos processos ou oportunidade. Para a esquerda, a causa da desigualdade é rousseauniana, ou seja, é a propriedade privada, portanto, esta deve ser aniquilada. Para a direita, a propriedade privada é um Direito Natural, não podendo ser eliminada pela vontade política, sob pena de perverter a natureza humana. A tentativa de eliminar a propriedade privada para nascer a igualdade material é a “estrela polar” (termo de Bobbio) para a esquerda, e suas tentativas de implantação (revolução bolchevista, maoísta, cubana etc) resultaram nos efeitos mais perversos conhecidos pela história da civilização. Meira Pena nos lembra que, em seu “Programa de Gotha”, publicado em 1.875, Marx considera o igualitarismo uma “falsa posição do socialismo utópico pois, os homens não são iguais na sua capacidade de produção”. Creio ser suficiente esta argumentação para sustentar que um espectro político ideológico cujo critério seja a igualdade não pode ser feito, uma vez que o próprio conceito de igualdade já é concebido de acordo com determinada ideologia.

Assim, precisamos de um critério objetivo, caso se queira insistir nessa história de E x D, pelo qual nenhuma ideologia poderia insurgir-se porquanto estaria cravado na realidade dos fatos. Que critério seria esse? Bobbio também o considerou: a liberdade política. Como um Estado é, por natureza, um fator limitante da liberdade humana, por definição, em um Estado Totalitário com governo absoluto não há liberdade individual. Contrário senso, a ausência de Estado, terá como corolário a liberdade individual em seu grau máximo, limitada apenas pelas condições objetivas da existência. Com essas considerações, um espectro político com base nesse critério teria na extrema-esquerda o estado totalitário com Governo absoluto e na extrema-direita a ausência de Estado sem Governo. Concordando com Gary Allen e Larry Abraham, temos que o comunismo, por definição, é um governo absoluto, não fazendo diferença, portanto, se denominamos este governo absoluto de totalitarismo (ápice do absolutismo onde o Estado absorve a sociedade e anula o homem), comunismo, absolutismo, fascismo, nazismo, maoísmo, stalinismo, leninismo, trotskismo, socialismo, castrismo, chavismo, caudilhismo, despotismo, ditadura, tirania, cesarismo ou faraonismo. Ora, do ponto de vista das pessoas condenadas a viver sob eles e sofrê-lo é tudo a mesma coisa. Como já consideramos, se o governo absoluto (sob qualquer uma de suas definições) fica na extrema-esquerda, consequentemente, pela lógica, a extrema-direita estará representada pela anarquia ou ausência de estado e de governo (inclua-se também ausência de valores). Ao centro, alocaremos as repúblicas e monarquias constitucionais e democráticas com governos limitados e império da lei.

Agora, perceba que se trata de um “continuum”, estando estas forças não estáticas no espectro, mas com capacidade de movimento, sendo que o centro recebe a atração dos extremos. Nesse sentido, uma república ou monarquia constitucional com governo limitado desloca-se continuamente para a extrema-esquerda do espectro a cada nova lei socializante e vice-versa. Gary Allen e Larry Abraham citam como exemplo elucidativo a formação dos Estados Unidos da América. Os pais fundadores daquela nação rebelaram-se contra o governo quase total da monarquia inglesa, mas sabiam que não ter governo algum levaria ao caos. Estabeleceram uma república constitucional com governo bastante limitado e descentralização de poder. Para Thomas Jeferson “governa melhor aquele que governa menos”. Eles sabiam muito bem algo que a maioria hoje esqueceu: todo controle é controle de pessoas. Como conservador, defendo um estado necessário administrado por um governo responsável e limitado, sob os auspícios de uma constituição com princípios orientadores emanados do direito natural. Não possa aceitar que minha postura política esteja fixada em um espectro ideológico ao lado de modelos de estados totalitários com governos absolutos, como são, por exemplo, os estados nazifascistas.

Quando o leitor ouvir (e ouvirá) que o fascismo ou nazismo são “de direita” responda sem titubear: na sua régua ou na de Bobbio pode ser, no espectro honesto jamais. As inconsistências teóricas e a desonestidade intelectual são marcantes na postura esquerdista. Os exemplos abundam. É notório a aproximação de políticos de esquerda com regimes ditatoriais (recentemente Gleisi “amante ou coxa” Hofmann foi à posse do ditador Maduro na Venezuela); o presidiário Lula já manifestou inúmeras vezes ter como ídolo o ditador Getúlio Vargas (historicamente simpatizante do nazi-fascismo); a CLT criada no governo Getúlio foi inspirada na “carta del lavore” do ditador fascista Mussolini, sendo, sagrada para nossa esquerda (ou seja, no Brasil, os socialistas ditos democráticos estão mais interessados em conviver com os totalitários do que em deles se distinguir); a esquerda é contra a pena de morte (também sou) mas à favor do aborto (sou contra o aborto); é contra a livre-iniciativa e o capitalismo, mas à favor da ampla liberdade sexual e relativismo moral; postula a falsa ideia de que o criminoso é uma vítima da sociedade, e você pensa como pensa porque pertence a determinada classe (polilogismo), assim, os exemplos seguem “ad infinitum”.

O que existe, na verdade, é uma “esquerda fascista” que se traveste de democrática e dá o tom do debate político, sendo ela a definidora dos conceitos à direita: a direita é definida pela esquerda, tal é a loucura política. Meira Pena nos lembra que parte desse estado de coisas deve-se unicamente à imensa máquina de propaganda montada pelos soviéticos no mundo inteiro (a intentona comunista em 1935 foi financiada pela URSS através do líder revolucionário Luiz Carlos Prestes) fez questão que a palavra esquerda ficasse na boa moda e direita amaldiçoada. Isso explica porque, durante os últimos quarenta ou cinquenta anos, pouquíssimas pessoas se declarassem como “de direita” no Brasil e no mundo.

Se o leitor se considera como “de esquerda” e ficou confuso com as argumentações acima, para a maioria das pessoas o conteúdo desses conceitos não são entendidos como pertencentes à categorias de pensamento. Poderia parecer que o autor quer apenas inverter os polos e, mediante a mesma estratégia esquerdista, denegrir esta e enaltecer a direita. Mas esta acusação não deve ser imputada ao autor desta missiva. As inúmeras visões de mundo foram dando origens às ideologias que formataram experiências de organização e controle da sociedade. À esquerda ficou o entendimento de que a natureza humana pode ser moldada de acordo com o ideal humano construído pela razão, posto que somos um amontoado de matéria formada ao acaso no caótico universo. Surge a mentalidade revolucionária, cuja essência é a convicção de que a solução para os problemas humanos é destruir o que existe e construir o novo em seu lugar sob as premissas oriundas da razão humana (engenharia social). Ora, foi Marx que reduziu tudo à economia e à matéria. O problema é que prescindir da estrutura anterior que formou a sociedade política atual é, em última instância, absorver, destruir e massificar a sociedade. Isto não é uma conjectura, basta observar o que foi a experiência coletivista nos países eu a implantaram.

Todavia, não foi essa visão de mundo não explica a formação das sociedades. Muito pelo contrário. Assim, é por acreditar que a tradição transmitida de tempos imemoriais, forjaram os valores indispensáveis à coexistência humana que determinados pensadores posicionam-se à direita. Como ensina J. P. Galvão de Souza (O Estado Tecnocrático) não se conhece nenhuma sociedade política (tribo, sociedade patriarcal, Império ou nação) que não seja uma “sociedade de sociedades”, ou seja, somente através dos corpos intermediários os indivíduos chegam a constituir a “polis”, “civitas” ou Estado. Nossa sociedade atual, nesse sentido, partilha valores e princípios anteriores a nós e que sobreviverão a nós. Como já dizia Edmund Burke, a sociedade política é o “contrato” entre os vivos, aqueles que estão mortos e aqueles que estão por nascer. É à luz dessa interpretação que reputo a superioridade moral das visões de mundo à direita, ou centro-direita na régua ideológica graduada sob o critério da liberdade política.

Finalizando, fica a questão: como devo me posicionar? Preciso escolher em que lado ficar? A tal polarização não é ruim? Essa discussão não leva apenas a desavenças? A resposta é: estude. Reflita sobre o mundo em que você vive e seus valores. Leia um mínimo da história da civilização mundial e de filosofia política. Evite informar-se apenas nas mídias e redes sociais. Com isso você irá aumentar o seu “horizonte de consciência”, como dizia Eric Voegelin. Você aprenderá a separar o joio do trigo, compreenderá as nuances do discurso político e as ideias que estão por trás das narrativas que intentam explicar “coisas” políticas. Com leitura e reflexão, você obterá “insigths” que despertará a suspeita de que há sim pensadores políticos que possuíam um entendimento da vida política superior, sofisticado, ou seja, que existe uma ordem política justa e boa e outras que são o inverso.

PS: a palavra “esquerda”, etimologicamente ocorria nos textos primitivos da nossa língua como a palavra “sestro”, evolução do latim vulgar “sinistru”. Sinistro de fato significa “o que é de mau presságio, funesto, de má índole, mau”. Poderia haver definição melhor para a esquerda política?





Julio Cezar Rodrigues é economista e advogado (rodriguesadv193@gmail.com)



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