Riscos nos negócios em tempos de Pandemia
A pandemia ocasionada pelo Covid-19 está impactando empresas de todos os setores pelo mundo. No Brasil, o aprofundamento da crise econômica e financeira, que já vinha andando em corda bamba, atinge em cheio muitas empresas. A quase total paralisação do mercado de consumo diante da necessidade do isolamento social - uma das medidas que tem se mostrado eficaz no combate à disseminação do vírus -, e que, por essa razão, levou ao fechamento de empresas dos mais diversos setores por tempo indeterminado, vai levar à uma crescente corrida ao instituto da Recuperação Judicial.
A recuperação judicial é vista como uma medida de proteção a fim de evitar a perda ou diminuição do patrimônio ou até mesmo a descontinuidade da atividade. Apesar das medidas publicadas pelo governo federal para socorrer as empresas, trabalhadores e consumidores, no Congresso Federal já há propostas que visam realizar alterações temporárias na Lei de Falências para diminuir os efeitos da pandemia do coronavírus em empresas.
O deputado federal Hugo Leal (PSD-RJ) apresentou no começo de abril o Projeto de Lei 1.397/2020, que flexibiliza os requisitos para os pedidos de recuperação judicial e extrajudicial. O projeto prevê que o empresário tente renegociar suas dívidas em até 60 dias. Nesse período, a empresa fica protegida de atos expropriatórios, como execução de garantias e bloqueio de bens. A proposta também beneficia as empresas que já se encontram em regime de recuperação judicial, uma vez que inibe a decretação de falência por descumprimento das obrigações constantes no plano de recuperação judicial, veda a retirada de bens essenciais das empresas em recuperação judicial, proíbe a execução de coobrigados e autoriza a renegociação de planos já aprovados e em vigor.
Em outra frente, o plenário do Conselho Nacional de Justiça - CNJ - aprovou, em 31 de março, recomendação que orienta juízes a flexibilizar o cumprimento de plano de recuperação judicial por empresas em virtude da pandemia da covid-19. A intenção é recomendar aos juízos a adoção de procedimentos voltados para a celeridade dos processos de recuperação empresarial e de decisões que tenham por objetivo primordial a manutenção da atividade empresarial, com direto impacto na circulação de bens, produtos e serviços essenciais à população, e na preservação dos postos de trabalho e da renda dos trabalhadores.
Neste sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso vem na vanguarda, aparelhando e instrumentalizando suas varas especializadas quanto à possibilidade do teletrabalho, da mesma forma, editando portarias e resoluções específicas para a efetiva prestação jurisdicional às empresas em dificuldades. Da mesma forma, a nossa respeitável Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso, foi extremamente combatente, primando para que os processos judiciais tivessem andamento, especialmente, aqueles voltados às atividades essenciais e as empresas que necessitavam manter seus postos de trabalho e empregos.
O instituto da Recuperação Judicial, com certeza, é um mecanismo da legislação que permite a possibilidade de se reerguer uma empresa sem que os postos de trabalho sejam perdidos e será importante para tentar manter a economia o mais estável possível. Mas, vejo com cautela a flexibilização indiscriminada das garantias, sob o peso de mandar o capital de investimentos para fora do Brasil.
Existem outros instrumentos tão eficazes e seguros como a RJ, porém mais rápidos, como no caso da Recuperação Extrajudicial, que é uma reestruturação de dívidas e uma alternativa legítima para diálogo entre a empresa em crise e seus credores, com vistas a equilibrar o interesse de todos e reerguer a empresa, atingindo os fins legais. A Recuperação Extrajudicial é um acordo firmado entre a empresa devedora e determinadas classes de credores para buscar a satisfação dos créditos, bem como revitalizar ou manter a atividade empresarial.
É claro, que diante de um cenário ainda turvo, a maioria das empresas e o próprio mercado vão utilizar os mecanismos existentes para reerguer as empresas, manter postos de trabalho, garantir, minimamente, o consumo para fazer a economia girar. Flexibilizar regras para permitir a recuperação da economia já se apresenta como uma possibilidade real, mas vale a cautela e a reflexão, uma vez que os mercados também dependem do financiamento dos bancos privados. Desta forma, as instituições financeiras deverão se atentar com os financiamentos se as garantias forem totalmente flexibilizadas, evitando um colapso generalizado.
*Flaviano Taques é administrador judicial, advogado, ex-corregedor geral da OAB-MT, especialista em Direito Empresarial e Agroambiental.
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